A Comissão Europeia e o Instituto da Vinha e do Vinho preveem que a produção vínica no Alentejo desça até 15 por cento na campanha de 2025/2026, em especial com “quebra nas uvas brancas”. Em causa esteve a “instabilidade meteorológica” do último ano que proporcionou o aparecimento de doenças fúngicas na fruta e o desavinho. Ainda assim, os produtores acreditam que a situação pode ser benéfica para o setor.
Texto | Ana Filipa Sousa de Sousa
O Instituto da Vinha e do Vinho (IVV) estima que a produção vínica em 2025/2026 desça 11 por cento e que registe “um volume 12 por cento inferior ao da média das últimas cinco campanhas”, sobretudo, no Douro (-20 por cento), Lisboa (-15) e Alentejo (-15). No conjunto, estas três regiões vão produzir 6,2 milhões de hectolitros de vinho, menos 679 000 face à campanha anterior.
“Os números estão corretos, ou seja, neste momento a previsão que se espera para o Alentejo é que haja uma quebra não muito acentuada, mas que pode chegar perfeitamente aos 10 por cento, ou até um bocadinho acima, porque houve, pelo menos, dois problemas nesta produção”, começa por explicar, ao “Diário do Alentejo” (“DA”), o presidente da Adega Cooperativa de Granja-Amareleja.
Segundo Manuel Bio, o tempo “mais frio” e chuvoso que se fez sentir “em determinados períodos” neste inverno fez com que as doenças fúngicas, em especial o míldio, “atacassem mais” as explorações e que durante a floração os vingamentos da uva não fossem os desejados e, por isso, que se registasse “algum desavinho”. “E isso tudo somado poderá levar a essa perda de produção na região”, adianta.
Para José Miguel Almeida, presidente da Adega Cooperativa de Cuba, Vidigueira e Alvito, apesar “da questão fitossanitária”, os dados para já antecipados são também um reflexo “do ciclo safra e contra safra”, ou seja, “na sequência de anos mais produtivos é natural que surja um ano menos proveitoso”.
“Nós, concretamente, aqui na adega, prevemos uma quebra nas uvas brancas face àquilo que é a previsão de colheita nas tintas”, exemplifica.
Por sua vez, na Adega Cooperativa de Granja-Amareleja “há uma variabilidade das castas” afetadas, porém, nas castas brancas de Atão Vaz e nas tintas de Alicante Bouschet nota-se, para já, que existe uma menor produção.
Apesar deste indício, que segundo o relatório “Perspetivas a curto prazo para os mercados agrícolas da UE em 2025”, publicado pela Direção- -Geral de Agricultura da Comissão Europeia, dá conta de uma “quebra histórica” com a produção a descer oito por cento em Portugal, os produtores acreditam que a situação “até pode ser interessante”.
“A verificar e a comprovar-se esta quebra de produção, aquilo que nós entendemos é que ela vai contribuir, efetivamente, para uma regularização paulatina dos stocks e vai ser benéfica para aquilo que é o ganho de valor que tem que regressar ao vinho em função daquilo que tem vindo a ser perdido devido aos excessos”, argumenta José Miguel Almeida.
De acordo com Manuel Bio, tendo em conta o stock, não existirá “qualquer impacto” negativo para os consumidores e produtores, uma vez que esta situação “até pode fazer uma correção” do preço da uva.
“Os stocks existentes no Alentejo estão em excesso e têm provocado uma pressão sobre o preço da uva e sobre a rentabilidade da viticultura. Neste momento, o setor está no limiar do prejuízo para muitos agricultores e, portanto, nós temos de conseguir com que a uva e o vinho suba de preço, [porque], caso contrário, vai haver bastante arranque e abandono de vinha no Alentejo”, assegura.
“O Alentejo está a passar uma crise [e] tem que se reinventar como região” Ao “DA” os dois presidentes não fazem um balanço positivo do estado atual do setor, afirmando que a vitivinicultura precisa de “uma mudança” no sentido de valorização e sustentabilidade.
Para Manuel Bio, o Alentejo “está a passar uma crise” e precisa urgentemente de se “reinventar como região” para manter o patamar de excelência dos seus vinhos.
“Continuamos a ser os líderes destacadíssimos das vendas de vinho em Portugal, portanto, somos a região líder, [mas o que] nos falta é ter ambição de também conseguirmos essa proeza no mercado internacional. Nós não podemos trabalhar só para um mercado de 10 milhões de consumidores, temos de trabalhar para o mercado dos bilhões e, se fizermos isso bem, vamos continuar a ter sucesso”, admite.Assim, para José Miguel Almeida, o novo mandato da Comissão Vitivinícola Regional Alentejana, liderado por Luís Sequeira, pode ser o primeiro “passo para um plano estratégico da região que se quer que seja robusto e que vise garantir a sustentabilidade do setor para os próximos anos”.
“Os produtores de vinho e de uvas do Alentejo estão expectantes quanto a esse trabalho de valorização da atividade económica, porque sem essa valorização as pessoas mudam de vida, mudam de atividade e não querem ficar no mundo do vinho e da vinha. Daí, sendo uma fase desafiante, é também uma fase em que estamos a trabalhar intensamente para que o futuro seja sustentável”, reconhece.