Martinho Marques
75 anos, natural de Albernoa, Beja
Frequentou o Liceu de Beja e o Instituto Superior de Ciências Económicas e Financeiras, em Lisboa. Foi técnico de operações de meteorologia na Força Aérea Portuguesa. Licenciado em Ensino da Matemática, pela Universidade Aberta, foi professor da disciplina durante cerca de 30 anos. Publicou mais de duas dezenas de livros, abrangendo vários géneros, em que a poesia terá predominado, até nos que são “em prosa”.
Martinho Marques apresentou, recentemente, o seu mais recente livro, de seu título Em Beja Nunca Me Perco.
Como nos apresenta esta sua obra de 42 poesias?
É mais um livro que imprevistamente apareceu ao “passageiro de acasos” que tenho sido na vida. Além dessas poesias, muitas das quais sobre ruas e outros lugares de Beja com que me relacionei, inclui 13 fotografias de António Cunha, se contarmos a da capa.
Em Beja Nunca Me Perco – há alguma história por detrás deste título que, permita-me especular, poderia ser uma resposta?
Sim, o título é exatamente o que respondi a quem, no extremo da cidade oposto àquele onde moro, me encontrou e perguntou: “Por aqui? Anda perdido?”. Apesar de ter achado singular essa resposta, só voltei a recordá-la quando, depois de várias insistências, o André Tomé (um não bejense que muito já deu à cultura em Beja) me convenceu a fazer um “Passeio Luminoso” (que eu pouco devo ter iluminado), a que chamei “Em Beja nunca me perco” e a que levei, para defesa minha, o texto com esse título, sem então imaginar que nasceriam mais 41 e, no final, o volume que os contém a todos eles.
É este livro uma declaração de afeto pela cidade de Beja?
Nem por isso. Ou, se é de afeto, é também de desafeto, porque nele as ironias, mesmo sem as ter contado, aparecem com grande densidade. É como se fosse um livro sobre a casa que habitamos e onde estamos à vontade, mas onde, por melhor a conhecermos, melhor podemos ver o que é anómalo e propor benfeitorias. Se é verdade que Beja me descansa, ela também me desgosta. Desgosta-me, por exemplo, estar a ver em Beja as livrarias, e mais em geral as lojas, a serem como as pessoas que, quando fecham, fecham para sempre.
Existirão, porventura, cidades que incitarão a um pensamento mais poético que outras? Beja tem essa capacidade?
Admito que, pela história, pela arte, pelos sítios em que se enquadram, por alguns que as habitaram, haja cidades que incitem mais do que outras a ter “pensamentos poéticos”. Porém, esse incitamento não é função apenas das cidades, também depende de como as trazemos na cabeça. Florença já me era muito antes de eu lá ter estado. Mas não recordo cidades a que eu tenha amor total. Em cidades que me atraem, as multidões afugentam-me. Beja incita-me a escrever. Talvez pelo seu tempo com vagar, pelos seus horizontes dilatados, pela sua vizinhança com o campo que é “logo ali”.
O que gostaria que este livro levasse a quem o acolher?
O que quis encontrar nele quando o levou para casa.
Um poema, desta sua obra…
Só as duas últimas quadras do que dá o nome ao livro: De onde estou nunca me farto/ e quando vou para fora/ quase sempre, quando parto,/ é já pra me vir embora.E eu queria que, quando for/ um dia para o Além,/ me deixassem por favor/ eu vir embora também.
José Serrano