A reunião do passado dia 9 do conselho geral do Instituto Politécnico de Beja (IPBeja) ficou marcada pela renúncia de três dos quatro elementos efetivos (mais os quatro suplentes) que representavam a Escola Superior de Tecnologia e Gestão (Estig) naquele órgão. O motivo? A recusa, pelos seus pares, de cooptação da pessoa apresentada pela lista. Elementos que a constituem dizem que a decisão “fragiliza a posição do órgão prejudicando a sua dignidade e a do próprio IPBeja”. O presidente interino do conselho geral refere que “a Estig não deixou de ter representação” e que o órgão “tem condições para funcionar”.
Texto Marco Monteiro Cândido
Depois da tomada de posse de 15 dos 21 novos membros do conselho geral do Instituto Politécnico de Beja (IPBeja) ter acontecido no dia 25 de novembro, este órgão preparava-se para, no passado dia 9, proceder à escolha e cooptação de seis membros da sociedade civil para completar a totalidade dos elementos (21) – sendo que de entre estas seis pessoas seria escolhido o presidente do conselho geral. Não foi isso que acabou por acontecer. Pelo contrário, três dos 15 membros do conselho que haviam tomado posse a 25 de novembro acabaram por renunciar, o que causou uma situação de impasse no funcionamento do órgão. Mas, para perceber os contornos da situação, há que contextualizar a importância e o funcionamento do conselho geral do IPBeja.
O conselho geral do IPBeja é constituído por 21 elementos: quatro membros da Estig, três da Escola Superior Agrária (ESA), dois da Escola Superior de Educação (ESE), dois da Escola Superior de Saúde (ESS), três representantes dos estudantes, um representante do pessoal não docente e seis cooptados, que serão “personalidades externas de reconhecido mérito não pertencentes à instituição, com conhecimentos e experiência relevantes para o instituto”, segundo o “Regimento do Conselho Geral do Instituto Politécnico de Beja”. A proposta de cada um dos seis elementos cooptados é da responsabilidade dos grupos representados no conselho geral (escolas/docentes, estudantes e pessoal não docente) e refletem as visões, estratégias e interesses de cada um desses grupos. Por fim, a escolha destes membros reveste-se de uma especial relevância, pois será daí que, conforme a tradição desta academia, será escolhido o presidente do conselho geral. E seria esta escolha que estava previsto acontecer no passado dia 9.
A importância do referido órgão, e da sua atuação, no que diz respeito ao funcionamento do IPBeja, é determinante, já que, entre outras competências, cabe a este, segundo o regimento que o tutela, “organizar o procedimento de eleição e eleger o presidente do instituto”, “apreciar os atos do presidente e do conselho de gestão”, “propor as iniciativas que considere necessárias ao bom funcionamento da instituição” e “elaborar e aprovar o regulamento aplicável ao processo de eleição do presidente do instituto”. Neste sentido, o papel do concelho geral do IPBeja, e do seu presidente, assume particular relevância, já que em 2025 termina o atual mandato da presidente do instituto, Maria de Fátima Carvalho, abrindo-se, portanto, um novo ciclo eleitoral. Recorde-se que o mandato da atual presidente do IPBeja, que tomou posse em 2021, tem sido marcado por alguma instabilidade, nomeadamente, com a demissão em bloco dos diretores e subdiretores das escolas superiores que integram o IPBeja, com troca de acusações entre estes e a presidente da instituição, um processo que o “Diário do Alentejo” (“DA”) noticiou ao longo de janeiro e fevereiro de 2023.
Segundo o mesmo regimento, competirá também ao conselho geral aprovar “os planos estratégicos de médio prazo e o plano de ação para o quadriénio do mandato do presidente”, “as linhas gerais de orientação da instituição no plano científico, pedagógico, financeiro e patrimonial”, “criar, transformar ou extinguir unidades orgânicas”, aprovar “os planos anuais de atividades e apreciar o relatório anual das atividades da instituição”, “a proposta de orçamento”, “as contas anuais consolidadas, acompanhadas do parecer do fiscal único” e “fixar as propinas devidas pelos estudantes”, entre outras competências.
O que aconteceu
No passado dia 9, em cima da mesa para cooptação estavam seis nomes, um proposto por cada grupo representado no conselho geral: Fernando Romba, primeiro secretário da Comunidade Intermunicipal do Baixo Alentejo, pela Estig; Nuno Canada, presidente do Instituto Nacional de Investigação Agrária e Veterinária, pela ESA; Fernando Gonçalves, docente e antigo presidente do conselho científico da Faculdade de Ciências Humanas e Sociais da Universidade do Algarve, pela ESE; José Álvaro Pereira, enfermeiro gestor do serviço de cirurgia do Hospital José Joaquim Fernandes, em Beja, pela ESS; Rui Marques, fundador da revista “Forum Estudante”, pelo grupo dos estudantes; e Jorge Serafim, contador de histórias bejense, pelo grupo do pessoal não-docente. Estas seriam as propostas a votação na referida reunião. À exceção da proposta da Estig, todas foram aprovadas, tendo aquela sido chumbada com nove votos contra, cinco a favor e uma abstenção.
“A proposta apresentada pela Escola Superior de Tecnologia e Gestão não foi aprovada, [o que aconteceu] sem fundamentação adequada ou motivo aceitável e justificável, o que contraria, a nosso ver, a pluralidade de ideias e de opiniões, um dos princípios presentes nos estatutos do IPBeja, e fragiliza a posição do órgão prejudicando a sua dignidade e a do próprio IPBeja”. É assim que os representantes da Estig encaram o sucedido na reunião, em declarações ao “DA”, referindo que não entendem as razões de tal chumbo. “Não as conseguimos compreender. Não descortinámos qualquer motivo factual ou válido que justifique o não reconhecimento do mérito, conhecimento e experiência relevante para o instituto da personalidade em causa”.
Surpreendidos pelo chumbo da proposta da lista que tem mais representatividade no conselho geral do IPBeja, por se tratar da escola com mais alunos e docentes – “Não conseguimos explicar. Entendemos que isto ultrapassa toda e qualquer ética e cordialidade institucional que é devida no funcionamento das instituições” –, três dos quatro elementos efetivos da mesma, bem como os quatro suplentes, decidiram renunciar ao cargo. E apontam as razões: “Por respeito à nossa escola, que é a Estig; porque o que nos levou a criar a lista e a querer integrar o conselho geral foi, em representação de todos os seus professores e investigadores, contribuir para restituir a dignidade ao nosso IPBeja; porque entendemos uma instituição de ensino superior como um espaço privilegiado de exercício de liberdade; porque estamos desapegados do poder; porque não podemos, nunca, pactuar com tentativas indignas de dominação em qualquer espaço de poder”. Questionados, pelo “DA”, sobre se o sucedido no conselho geral poderia estar relacionado com as eleições para a presidência do IPBeja em 2025, respondem: “Essa pode ser uma, entre outras possibilidades”.
Ouvido pelo “DA”, Rogério Ferrinho, professor da ESS e presidente interino do conselho geral do IPBeja de momento, por ser o docente mais antigo no órgão, refere que, apesar da renúncia dos três elementos da Estig, há condições para o normal funcionamento do mesmo. “Há três elementos que renunciaram ao cargo, mas o conselho geral tem condições para funcionar, isto não é impeditivo, têm de ser feitas eleições, na minha opinião, sem informação jurídica, mas do que li nos estatutos, isto não está previsto – ninguém prevê que haja uma renúncia de três pessoas quando discordam –, mas, atenção, nós temos quórum para funcionar. O conselho geral é um órgão que tem um papel preponderante na fiscalização do trabalho desenvolvido pela presidência e pelos órgãos que estão afetos à presidência. E o conselho geral, este conselho geral, tem condições para funcionar. Tem quórum. Quando tiverem todos tomado posse, temos 18 elementos, só ficam faltando estes três”.
Sobre a recusa da proposta da pessoa a cooptar, o docente da ESS sublinha que a mesma “não tinha experiência a nível de ligação, não tinha experiência, nem conhecimentos, nem tinha desenvolvido projetos ligados à área envolvendo o ensino superior e, por isso, entenderam que não”, acrescentando que, tendo havido uma politização do conselho geral do IPBeja no passado, não queriam que o mesmo acontecesse agora. “Havia ali uma componente política muito acentuada e, portanto, por via disso, as pessoas [agora] votaram contra”. E acrescenta: “Aquilo foi um ato que foi, de certa forma, premeditado: ‘se não anuírem à nossa proposta de pessoa cooptada, nós vamos renunciar’. E renunciaram, estão no seu pleno direito”.
Sobre a questão ética apontada pelos elementos demissionários, Rogério Ferrinho sublinha que “isso não tem lógica”. E acrescenta: “Qualquer um pode ser aceite ou não ser aceite. De uma forma ou de outra, as pessoas acharam que os elementos que estavam a propor tinham ligação com o ensino superior. E acharam que esta pessoa [Fernando Romba] não tinha tido uma ligação com o ensino superior e que, essencialmente, o seu percurso profissional destacava-se por assumir cargos políticos”. E continua: “A proposta foi votada, foi votada negativamente, as pessoas [que renunciaram] saíram e voltei novamente a submeter à votação para ver se o voto em si poderia ter mudado. As pessoas mantiveram o sentido de voto. (…) Acho que [o voto negativo] não era impeditivo (…) que as pessoas tivessem apresentado outra personalidade [em alternativa] com experiência e mérito relevantes para o ensino superior. Não o fizeram, abdicaram disso, renunciaram àquilo que era o seu trabalho enquanto pessoas que tinham sido eleitas para o órgão (…). Foi uma posição que assumiram e, portanto, eu respeito”.
O nome alternativo a Fernando Romba, apresentado pelo docente José Pires dos Reis – único elemento da lista da Estig que não renunciou – foi Diogo Nascimento, responsável pela direção de gestão do património da Empresa de Desenvolvimento e Infraestruturas de Alqueva (EDIA). “A Estig não deixou de ter representação, ficou lá o professor José Pires do Reis e ele fez a proposta de um cooptado”.
No momento em que o “DA” falou com Rogério Ferrinho, no dia 18, sobre o processo de cooptação das pessoas de onde sairá o futuro presidente do conselho geral do IPBeja, o mesmo referiu: “Aos seis cooptados, neste momento, falta ser-lhes informado. Vão ser questionados no sentido de saber se eles aceitam, e, portanto, logo que lhes chegue a informação, têm 10 dias úteis para responder, e, logo que tenhamos a resposta, vão tomar posse passados até um máximo 10 dias úteis”.
Este será um processo que não corresponderá à expectativa que a lista demissionária da Estig ainda alimentava quando fez as suas declarações ao “DA”: “Não temos conhecimento de ter acontecido algo similar em mandatos anteriores. (…) Apenas podemos adiantar que, mais uma vez, poderá surgir uma solução demonstrativa de força. Mas também poderá surgir uma outra, alimentada pelo bom senso, que revele o incómodo de não ter a representação completa da escola com mais alunos do IPBeja e, por isso, busque a harmonia. Temos esperança que tal ainda venha a acontecer”.