Texto | Aníbal Fernandes
O dia 6 de outubro de 1974 ficou para a história como o Dia de Trabalho para a Nação. Até o “Diário do Alentejo” – que normalmente não saía para as bancas nesse dia da semana – foi impresso e distribuído pelos correios (que também trabalharam).
Na primeira página, em destaque numa caixa, a redação explicava que esta decisão representava “um conjunto de decididas boas vontades de todos os que fazem parte dos quadros redactorial, gráfico e de expedição do ‘Diário do Alentejo’”.
Mas a questão é: por que razão milhares de portugueses resolveram aderir de forma “pronta, alvoraçada e sincera” à sugestão do então primeiro-ministro Vasco Gonçalves?
Na “Nota do Dia”, o articulista explicava que seria “no trabalho dedicado, consciencioso, digno em todos os sentidos, que a Nação [encontraria] a melhor, se não única, via do progresso e da valorização global que a sua própria sobrevivência exige seja atingida em futuro próximo”.
No dia seguinte, segunda-feira, 7, o tema ainda estava quente e na primeira página explicava-se que “correspondendo ao apelo do primeiro-ministro, brigadeiro Vasco Gonçalves, para que o dia de ontem fosse um dia normal de trabalho (com que se assinalaria a vitória de 28 de Setembro último sobre a reacção), todo o povo português, quer mantendo-se nos seus postos habituais de trabalho, quer colaborando em campanhas de utilidade pública, as mais diversas, construiu aquilo a que apropriadamente se chamou uma verdadeira jornada de trabalho nacional”.
E em Beja foram muitos os exemplos “da vontade popular de colaborar espontaneamente na obra ingente da reconstrução nacional”, enaltecendo-se “a participação efectiva de grupos de jovens e de crianças, em diversas tarefas de reconhecida utilidade colectiva”.
Na edição de terça-feira, num texto mais descritivo, dava-se conta que “em lugar dos fatos domingueiros, foram vestes do trabalho que acordaram as cidades, as vilas, as aldeias, os campos. Trabalhou-se, não por diletantismo, mas a sério, procurando-se todos os pretextos válidos para trabalhar.As oficinas, os escritórios, as instituições, particulares e oficiais, tiveram um rendimento proveitoso aos interesses da Nação.
E, fora desses locais, também o trabalho voluntário surgiu em grande dimensão, com um cunho de, íamos escrever ternura, que constituiu o seu mais nobre ‘cartão de visita’.
Houve ruas que foram limpas; paredes de velhos edifícios públicos que foram caiadas; decrépitas escolas que foram restauradas”.E o enquadramento político desta ação também não faltou: “O povo português estava fatigado da dura vigilância sobre as forças fascistas que exercera no anterior fim de semana [28 de setembro], quando foi necessário colaborar com as Forças Armadas, para destruir uma sinistra e ‘subtil’ tentativa de morte à hora livre que se vive desde 25 de Abril.
Mas o seu cansaço era apena s físico. O moral estava robustecido mais do que nunca.
Foi a essa reserva inesgotável que a massa popular foi buscar a energia suficiente para a intensa jornada de trabalho que ofereceu ao País, desde o despontar até ao fim do dia de anteontem”.
Apesar do êxito, o Dia de Trabalho para a Nação não seria repetido. No ano seguinte, a CGTP ainda tentou que se realizasse no dia 10 de junho – feriado nacional –, mas a adesão foi muito inferior à iniciativa de outubro de 1974.