A propósito de uma visita da secretária de Estado da Ação Social e da Inclusão, Clara Marques Mendes, à Cáritas Diocesana de Beja, o presidente da instituição, Isaurindo Oliveira, referiu que o funcionamento do Centro de Acolhimento de Emergência Social, “assim como está, não nos resolve problemas, nem a nós, Cáritas, nem à comunidade”.
Texto | Marco Monteiro CândidoFoto | Ricardo Zambujo
Foi já na parte final da visita da secretária de Estado da Ação Social e da Inclusão, Clara Marques Mendes, na passada segunda-feira, 30 de setembro, à Cáritas Diocesana de Beja, que o presidente da instituição, Isaurindo Oliveira, apresentou aquela que será a sua maior preocupação, nomeadamente, em relação ao atual funcionamento do Centro de Acolhimento de Emergência Social (CAES), na Casa do Estudante. Tal como o fez, também, a equipa técnica da resposta social. Foram apontadas questões como o excessivo tempo de permanência das pessoas no CAES – “Porque isto seria uma resposta temporária, transitória. Mas depois, para determinado tipo de problemáticas, quase que é uma comunidade de inserção, porque não há resposta a seguir” – ou a dificuldade de integração – “No caso dos cidadãos estrangeiros com dependências também não há, a seguir, uma resposta que os possa acolher para o tratamento. Porque, para além de alguns, a maior parte, estarem em situação irregular, não têm um número de saúde definitivo para que possam ingressar, como também não vão para as comunidades terapêuticas porque também têm o constrangimento da língua”.
Sendo o CAES uma resposta social para atuar em situações de emergência, com uma “equipa subdimensionada”, o espectro bastante alargado de pessoas, das mais diversas origens, mas também contextos e idades, que acaba por dar ali entrada, cria, por vezes, aquilo que, nas palavras do presidente da Cáritas e dos técnicos, será um “paiol autêntico”.
Muitos dos beneficiários que acabam por chegar às instalações da Casa do Estudante, onde funciona a resposta social (com 36 camas disponíveis e 30 protocoladas com a Segurança Social), trazem com eles uma série de dependências, que, alterando o estado de consciência dos mesmos e em conjugação com muitas “doenças do foro psiquiátrico”, colocam problemas de “obediência aos monitores”, segundo os membros da equipa técnica. Isaurindo Oliveira refere que, nestas circunstâncias, são criados “problemas do arco-da-velha”. “E os culpados disto, depois, em termos de comunidade, é a Cáritas, porque foi a Cáritas que os juntou aqui”.
Isto leva a que muitos dos beneficiários entrem e saiam da resposta social com frequência. Quando, muitas vezes, não podem voltar a integrar o CAES, “isto também vem engrossar o número de [pessoas em situação de] sem-abrigo que está a aumentar significativamente na cidade”, refere a equipa técnica. “Portanto, isto é um cocktail um bocado explosivo. E temos muitos problemas, principalmente, com a segurança das pessoas que aqui estão dentro. E, depois, com estes problemas, não sei qual é a resposta. Também não a vejo, mas é algo que a gente tem de pensar seriamente”, refere o presidente da Cáritas Diocesana de Beja.
Apesar da importância do CAES, em termos de funcionamento, o cenário é de insuficiência. Segundo a equipa técnica, quem ali chega, “chega no fim de linha: a pessoa já não tem casa, já não tem família, já não tem nada, e não são só estrangeiros”.
Com o protocolo com a Segurança Social a terminar em abril de 2025, o momento, até lá, será de avaliação sobre um eventual prolongamento do mesmo, sublinha o presidente da instituição. “Não corre o risco de encerrar. Nós estamos a dizer é que, perante estas condições em que nós trabalhamos, a problemática que aqui está, a equipa que aqui temos, isto é extraordinariamente difícil, porque temos aqui problemas de segurança, temos problemas humanos, temos problemas de recuperação de pessoas [em] que a gente não consegue [atuar]”.
Isaurindo Oliveira, já no final da visita da secretária de Estado da Ação Social e da Inclusão, reforçou essa ideia, a de que, nos atuais moldes, é muito difícil o CAES continuar a funcionar. “No limite, se não conseguirmos chegar a uma solução, eu acho que não vale a pena termos esta resposta a funcionar, porque ela nos cria problemas e a gente não resolve problemas de espécie alguma. Portanto, isto é para dizer que todos temos de trabalhar nisto, porque esta é uma estrutura que é extraordinariamente importante, mas, só assim como está, não nos resolve problemas, nem a nós, Cáritas, nem à comunidade”. Sobre o que poderá ser alterado, o presidente da Cáritas sublinhou o reforço da equipa, nomeadamente, com o apoio de um médico psiquiatra, mas também em termos de segurança.
Clara Marques Mendes, no final da visita, e depois de ouvir as problemáticas, assumiu “que a resposta que existe atualmente foi pensada há algum tempo” e, como tal, “vai ser reavaliada e acho que nessa reavaliação há determinados aspetos que têm de ser pensados, porque as problemáticas aumentaram, diversificaram e as exigências acabam por ser outras”.
Sobre a pressão social que é exercida na comunidade, e cujo tema surgiu durante a visita, devido às questões da imigração e dos muitos casos de pessoas em situação de sem-abrigo, a secretária de Estado da Ação Social e da Inclusão disse que “o Governo olha para este caso conforme olha para todo o País”, referindo que está a ser feita uma revisão da Estratégia Nacional para a Integração das Pessoas em Situação de Sem-Abrigo. “Verificámos que não houve um verdadeiro levantamento, (…) atualizado e caracterizado das pessoas em situação de sem-abrigo, e, portanto, estamos a fazer esse levantamento. Termina agora no final deste mês, para apresentarmos uma estratégia com enfoque, e as respostas têm de ser diferenciadas, porque País e o território é diferente. E nós sabemos que Beja, Lisboa, Porto são zonas onde temos de acudir e dar respostas diferenciadas e não nos parece que isso esteja a acontecer. Essa revisão, que nós decidimos fazer, está a terminar, para percebermos exatamente quem são as pessoas, onde estão e do que precisam, e brevemente também vamos ter essa avaliação com respostas mais concretas e também acudir às zonas onde o problema é mais intenso, nomeadamente, aqui, em Beja”.