Diário do Alentejo

“Maioria silenciosa”

26 de julho 2024 - 12:00
50 anos de Abril

Texto Aníbal Fernandes

 

"Ou a maioria silenciosa deste País acorda e toma a defesa da sua liberdade, ou o 25 de Abril terá perdido perante o mundo, a História e nós mesmos o sentido da gesta heróica de um povo que se encontrou a si próprio”. Estas foram as palavras proferidas pelo então Presidente da República, António de Spínola, durante o discurso da tomada de posse do primeiro-ministro Vasco Gonçalves, no dia 19 de julho de 1974, e foi noticiado na edição do “Diário do Alentejo” do dia a seguir.A expressão “maioria silenciosa” haveria de se tornar notada daí para a frente e estaria na base da demissão e fuga de Spínola para Espanha, como mais adiante – em futuras crónicas – daremos conta.

Na segunda-feira, 22 de julho, na secção “Nota do Dia”, comentava-se as palavras “justas” com que o recém-empossado primeiro-ministro tinha reagido aos jornalistas à porta do Palácio de Belém logo após a posse: “Nós não temos que nos queixar do que se tem passado. Reconhecemos que há exageros, os exageros próprios das pessoas que· descobriram a liberdade. Nós pretendemos que essa descoberta da liberdade, esse processo de liberalização, seja feito em paz, na paz social. Pretendemos que seja exercida uma acção pedagógica sobre o nosso Povo, de maneira a que ele aprenda os benefícios da liberdade. É, portanto, necessária uma sistemática e pedagógica acção sobre a vida e liberdade. Porque viver em liberdade, aprende-se; a maturidade política aprende-se na vida quotidiana”.“Estamos agora a aprender a ser livres e havemos de convir que o processo é difícil e complexo, pois não foi ‘em vão que se diz tantas vezes’ – são ainda palavras do primeiro-ministro – ‘que o nosso Povo esteve durante 48 anos sob o obscurantismo, que procurou embrutecer sistematicamente o Povo português’”.

Por falar em povo: na edição de quarta-feira, Eduardo Olímpio, naqueles tempos cronista habitual do “Diário do Alentejo”, dedicava um texto ao tema, intitulado “Depois de 25”.

“Ai meu povo, meu maravilhoso e belo povo do cravo vermelho, das palmas, dos vivas. Mesmo povo das palmas a Eusébio. Dos vivas a Amália. Ai meu povo de fungágá, de ir de boca aberta a tanta coisa fechada. Ai meu povo de foice em punho, meu povo de Catarina, também povo do Benfica e Nossa Senhora de Fátima. Povo coração. Povo ilusão. Povo que de mãos dadas não sabe das mãos fechadas a travarem o seu caminho. Povo que de boca aberta não vê quem lhe rouba o pão. Quem lhe quer roubar sub-repticiamente a sua revolução. Ai meu povo que nada sabe de bancos, de Cias e de I têtês: De Gulfs Oil e Diamantes. Meu povo diamante (de) lapidado. Meu povo que na hora da partida para a estrada da liberdade não sabe que mais que a atenção à carruagem florida é preciso, é necessário, é urgente ter os olhos postos na locomotiva: ao arrastado, traiçoeiro e envolvente resfolgar da locomotiva que tenta envolver-te em seu smog: cuf!... cuf!... cuf!... cuf!... cuf!...”.

 

Comentários