Diário do Alentejo

Cáritas assegura verba para apoiar pessoas em situação de sem-abrigo

07 de julho 2024 - 08:00
“Estou tão perto que não me vês” arrancou em março de 2022 e continuará até 2026 depois de ver aprovado novo financiamento
Foto | “Estou tão perto que não me vês”/Cáritas Diocesana de BejaFoto | “Estou tão perto que não me vês”/Cáritas Diocesana de Beja

A Cáritas Diocesana de Beja viu, recentemente, a sua candidatura ao programa Alentejo 2030 ser aprovada, o que resulta na confirmação de financiamento que permitirá dar continuidade ao “Estou tão perto que não me vês”, um projeto que pretende apoiar, em diversos níveis, pessoas em situação de sem-abrigo. O aumento do número de técnicos e o alargamento do horário de funcionamento são as “novidades”.

 

Texto Ana Filipa Sousa de Sousa

 

“O problema destas coisas é que quando nós não medimos, quando não analisamos, estes problemas não existem. Aliás, o nome do projeto é ‘Estou tão perto que não me vês’, ou seja, quando não estamos despertos para a situação [de pessoas em situação de sem-abrigo] a maioria destes programas não existe, porque não vemos estas pessoas, elas passam por nós, mas nós não as atendemos, a não ser que batam de frente connosco”. Quem o diz é Isaurindo Oliveira, presidente da Cáritas Diocesana de Beja, sobre a necessidade de existir, em todas as regiões, projetos semelhantes aos que a instituição a que preside tem em funcionamento desde março de 2022.

Reconhecer e sinalizar quem está neste tipo de situações e permitir, através da “confiança”, dar-lhes conforto, “nomeadamente, tomar um banho, lavar a roupa [ou] ter acesso a um pequeno-almoço”, e desenvolver-lhes competências para “tentar fazer a sua recuperação ou, pelo menos, tirá-los da rua e dar-lhes uma outra hipótese, em que possam sentir-se pessoas, em que possam ter alguém que olhe para elas e fale com elas”, contribuindo, assim, “para a sua inserção de novo na sociedade”, é a premissa.

Desde o final do ano passado que o futuro do projeto estava incerto, uma vez que a Cáritas de Beja aguardava uma nova candidatura de financiamento, submetida em janeiro, no âmbito do Alentejo 2030, e que veio recentemente aprovada. Os últimos sete meses, como Isaurindo Oliveira confirmava ao “Diário de Alentejo” (“DA”) em março, foram assegurados pela Câmara Municipal de Beja que “financiou a equipa de modo a garantir que os técnicos pudessem continuar até esta altura” a trabalhar.

“Felizmente, o projeto foi aprovado mesmo no limite e, portanto, isto significa que a câmara pode ser ressarcida desta ajuda que prestou à Caritas”, assegura.

O financiamento, “na ordem dos 540 mil euros”, que agora será atribuído ao projeto “Estou tão perto que não me vês”, destina-se a “um período de três anos”, que começou a contar desde o dia 1 de janeiro de 2024, e permitirá, além de outras “novidades”, aumentar o número de técnicos da equipa de rua e do espaço Estórias, assim como alargar o período de funcionamento dos serviços.

“Vamos ter um coordenador, três técnicos, um monitor e uma pessoa que vai ficar essencialmente virada para os aspetos da comunicação. Estas pessoas vão trabalhar com um horário relativamente desfasado de modo a poder cobrir até às 20:00 ou 21:00 horas e absorver algumas pessoas que estão em situação de sem-abrigo, mas que, por qualquer motivo, regressam mais tarde”, explica. Para já mantém-se ainda a lacuna da inexistência do projeto aos fins de semana.

O responsável considera, no entanto, que este tipo de projetos não pode estar unicamente dependente de candidaturas, uma vez que o trabalho com este público-alvo tem de ser contínuo. Neste caso em específico, refere, se o município de Beja não lhes tivesse dado a mão “a equipa que havia com toda a experiência tinha sido extinta e, portanto, aquilo que nós teríamos de fazer agora era reiniciar uma nova”, o que iria fazer com que se regredisse no processo.

Ao “DA”, Isaurindo Oliveira manifesta também o seu descontentamento com o “corte na ordem dos 40 mil euros”, no financiamento apresentado, respetivo aos vencimentos dos trabalhadores. “É curioso. O aviso reportava que o financiamento dos técnicos e dos monitores era feito com base na tabela das IPSS [instituições particulares de solidariedade social] de 2023, ou seja, isto significa que quando o projeto arrancou [em janeiro de 2024] a tabela já estava desatualizada e agora não permite atualizações durante os três anos. É caricato e surreal, não é?”, questiona.

Ainda assim, o presidente reitera que “estas equipas são extraordinariamente importantes” e necessárias na comunidade, “por um lado, para tentar dar alguma dignificação” a quem está numa situação de sem-abrigo e, “por outro, para aliviar os problemas que possam aparecer”.

 

Sinalizadas 113 pessoas em situação de sem-abrigo desde o início do ano

 

Os últimos dados disponibilizados ao “DA” pela Cáritas Diocesana de Beja, referentes ao período de janeiro a maio deste ano, dão conta de um contacto com 113 pessoas em situação de sem-abrigo, na cidade de Beja, por parte da equipa de rua do projeto “Estou tão perto que não me vês”, sendo que, destas, 50 “já tinham tido contacto nos anos anteriores” (2022 e 2023) e 63 são “novos beneficiários”. Relativamente ao perfil destes indivíduos, a grande maioria são homens (103) e migrantes (84). Para além dos resultados referidos, é de salientar o número de “intervenções nas atividades”, o que demonstra “o impacto que geram na vida das pessoas em situação de sem-abrigo e em risco” – atividades ocupacionais no espaço Estórias (1542), cuidados de higiene/banhos (374), tratamento de roupa (361), doação de roupa (73), pequeno-almoço (399), snacks/café (715), toma da medicação (88), apoio psicossocial (354),acompanhamentos (52) e encaminhamentos (50).

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