Diário do Alentejo

O boato

05 de julho 2024 - 08:00
50 anos de Abril

Texto Aníbal Fernandes

 

O boato é a arma da reação”. Este é um dos muitos slogans que se ouviam no período que ficou conhecido como PREC – Processo Revolucionário em Curso e que teve o seu epílogo com o 25 de Novembro de 1975.

Na edição de 3 de julho de 1974 o “Diário do Alentejo” dava conta que circulavam “nos últimos dias por todo o País boatos alarmistas, lançados pela reacção fascista, atribuindo aos trabalhadores agrícolas do Alentejo e às organizações democráticas o propósito de incendiarem searas como forma de apoio às justas reivindicações dos trabalhadores”.

Um comunicado subscrito pelas estruturas dirigentes regionais de Beja do Movimento Democrático Português, Partido Comunista Português, Partido Socialista e Sindicato dos Trabalhadores Agrícolas defendia que “o lançamento destes boatos tinha um único objectivo: preparar o terreno para uma monstruosa provocação contra o proletariado agrícola do Alentejo e contra as organizações democráticas [e] abrir caminho a uma intervenção das Forças Armadas contra as massas populares”.

O dedo era apontado aos “grandes agrários do Alentejo” que tinham feito chegar “ao Governo e às instâncias superiores das Forças Armadas” este boato, “atribuindo aos trabalhadores a responsabilidade de incêndios e de outros crimes, e apontando mesmo nomes de conhecidos e destacados democratas e activistas do sindicato”.

O comunicado assinalava o facto de “simultaneamente” se terem registado dois incêndios em searas na zona de Beja e que se veio a provar não terem motivações reivindicativas.

De facto, na última página da mesma edição, escrevia-se que tinham acontecido dois incêndios nas freguesias de São Matias e Brinches. Conforme era explicado, “o fogo de S. Matias, [foi] originado por faúlha de uma ceifeira-debulhadora”, e tinha-se propagado por várias propriedades; o segundo deflagrou “no monte da Orada, Brinches”, e parecia ter sido ateado por um rapaz de 16 anos, solteiro, ajuda de pastor, que, ao ser interrogado pela GNR, “declarou que ateara fogo à seara instigado pelo rendeiro, que se manteve na negativa. O caso foi enviado a tribunal”.

Voltando ao comunicado, as três forças políticas e o sindicato anunciavam a tomada de “medidas de vigilância” e que passavam pela “constituição de piquetes na maioria das terras do distrito” e anunciavam que o agrário responsável pela ordem do fogo posto já tinha sido preso. 

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