Diário do Alentejo

Os primeiros passos do poder local democrático

17 de maio 2024 - 12:00
50 anos de Abril

Texto Aníbal Fernandes

 

Estamos a meio de maio de 1974. O então delegado do Movimento das Forças Armadas (MFA) em Beja, coronel Romão Loureiro, reuniu-se com o Movimento Democrático Português (MDP) distrital para lhe comunicar “que, em resultado de uma sua proposta aprovada na recente reunião de um delegado da Junta de Salvação Nacional com os governadores civis em exercício, foi resolvido que sejam demitidos todos os presidentes, vice-presidentes e vereadores de todas as câmara municipais, passando estes corpos administrativos a ser dirigidos, provisoriamente, por comissões eleitas segundo os princípios democráticos, em comícios promovidos pelas comissões concelhias” daquele movimento.

Não foi preciso dizer duas vezes. O “Diário do Alentejo” de dia 13 de maio relata que, em Almodôvar, “num comício popular, que reuniu cerca de duas mil pessoas, representando todas as freguesias do concelho, no largo fronteiro à sede da Casa do Povo, foi eleita, por aclamação, a comissão administrativa para a Câmara Municipal, que ficou constituída pelos srs. Carlos Dinis Morgadinho Gago, solicitador, como presidente, e dr. Mário Aires Marques da Rocha Pereira, notário, José das Neves Guerreiro, comerciante, e José António Paleta, proprietário e agricultor. Durante a magna reunião, no decorrer da qual foram levantados vibrantes vivas a Portugal, à Liberdade e às Forças Armadas, discursaram os srs. Carlos Dinis Morgadinho Gago, dr. Mário Aires da Rocha Pereira, Manuel Ventura Vargas, o estudante de Medicina João Manuel Brito Camacho, dr. Filipe Fonseca, conservador do Registo Predial, e o médico dr. João Brito Camacho.

Também em Aljustrel, a “eleição da comissão administrativa para a Câmara Municipal fez-se em moldes puramente democráticos, numa forma que poderá ser adoptada por todos os outros concelhos. A população de todas as freguesias foi convocada para uma reunião no campo de futebol do Sport Mineiro Aljustrelense, tendo a comissão concelhia do MDP distribuído listas com 12 nomes propostos mas com a indicação de que estes poderiam ser substituídos, por outros se cada eleitor assim entendesse. Apenas foi permitida a votação a pessoas, de ambos os sexos, com a idade mínima de 21 anos. Pelo resultado do escrutínio, a comissão administrativa eleita foi a seguinte: presidente, professor António Alexandre Raposo [que viria a ser diretor do ‘Diário do Alentejo’]; 613 votos; vogais, D. Fernanda Patrício Rosa, doméstica, 577; João Santos Soares, carpinteiro, 562; Manuel Francisco Baltazar, ajudante de topógrafo, 562; José Alberto Silva, agente comercial, 396; e professor Luís Bartolomeu Afonso Palma, 289”.

No dia seguinte, no Governo Civil de Beja, seria a vez das comissões administrativas dos municípios de Cuba, Ferreira do Alentejo, Moura, Serpa e Vidigueira tomarem posse, num ato presidido pelo já mencionado coronel Romão Loureiro, “delegado da Junta de Salvação Nacional e governador civil em exercício”.Era o poder local democrático a dar os primeiros passos. Aníbal Fernandes

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