Diário do Alentejo

Água de Alqueva aumenta de preço seis vezes menos do que o proposto

20 de maio 2023 - 10:00
Governo recua e deixa cair subida de 140 por cento

O aumento do tarifário do custo da água do Alqueva foi fixado em 24 por cento, anunciou a ministra da Agricultura e da Alimentação no final da reunião extraordinária do Conselho para o Acompanhamento do Regadio (CAR).

 

Texto Aníbal Fernandes

 

O aumento do custo da água para a agricultura na região do Alqueva vai ser de um cêntimo por metro cúbico, cerca de seis vezes menos do que estava em cima da mesa se se aplicasse a fórmula antes prevista.

 

A decisão foi anunciada durante a reunião extraordinária do Conselho para o Acompanhamento do Regadio do Alqueva que contou com a participação da ministra da Agricultura e da Alimentação, Maria do Céu Antunes, e do secretário de Estado da Agricultura, Gonçalo Rodrigues.

 

A governante justificou esta mudança com a aplicação de “um conjunto de fatores de otimização e não da aplicação de um modelo económico que previa um aumento na ordem de 140 por cento”, nomeadamente, com “a implementação de um grande projeto fotovoltaico flutuante na rede primária do Empreendimento de Fins Múltiplos de Alqueva (EFMA), a expansão do empreendimento para novas áreas de regadio, envolvendo uma diluição dos custos fixos do sistema de distribuição de água, e ainda um conjunto de outras pequenas economias resultantes da gestão integrada das redes primária e secundária e das economias de escala geradas”.

 

No entanto, Maria do Céu Antunes, disse que a atualização do tarifário agora decidido é “essencial para a competitividade dos sistemas de agricultura da região de Alqueva e para a manutenção da diversificação cultural do território”, tendo destacado o esforço financeiro que está a ser feito, através do Governo e da Empresa de Desenvolvimento e Infraestruturas do Alqueva (EDIA), para garantir o acesso à água e, consequentemente, a viabilidade das produções.

 

João Cavaco Rodrigues, presidente da Associação de Proprietários e Beneficiários do Alqueva (APBA), em declarações ao “Diário do Alentejo”, considerou que “em boa hora o Governo recuou”, e não insistiu na aplicação de um tarifário que “poria em causa muitas culturas”, uma vez que a água “tem um peso significativo nos custos de produção”.

 

O representante dos beneficiários do Alqueva alerta para o facto de “mais importante do que o preço da água é ter água”, defendendo ser necessário tirar da gaveta projetos que permitam “criar condições para armazenar a água” através da construção de pequenas novas barragens no perímetro de Alqueva o que, subsidiariamente, contribuiria para a manutenção e melhoramento de vários ecossistemas e funcionaria como um travão ao avanço da desertificação.

 

João Cavaco Rodrigues olha com preocupação para o futuro da Empresa de Fins Múltiplos de Alqueva uma vez que “as solicitações são muitas. Ao princípio o EFMA apoiou os precários, mas, agora, está a mudar condições e a dificultar-lhes a vida”, denuncia.

 

MUDAR REGRAS A MEIO DO JOGO

António Parreira, dirigente da Federação das Associações de Agricultores do Baixo Alentejo (Faaba), em declarações ao “Diário do Alentejo”, diz que este aumento “é suportável”, no entanto critica o momento em que ele foi decidido, “com a campanha iniciada” e “mudando as regras a meio do jogo”.

 

“Os agricultores não foram ouvidos neste processo e altura não é a melhor. Neste momento devíamos estar a discutir os tarifários da próxima campanha”, reclama.

 

No entanto, face ao aumento previsto de 140 por cento, que “era uma aberração e ia rebentar com o setor no Baixo Alentejo, ficamos satisfeitos”, diz António Parreira, congratulando-se com o facto da subida do preço ser apenas “enquanto a EDIA não tem operacional o projecto fotovoltaico flutuante.

 

Este dirigente critica ainda a justificação inicial para o aumento, considerando-a “inaceitável e uma aberração”, uma vez que poria os agricultores, “que não participam na gestão da EDIA”, a suportar os custos da mesma.

 

DECISÃO CONTRADITÓRIA

Por seu lado, a Federação Nacional de Regantes de Portugal (Fenareg) considerou “contraditória” a decisão do Governo de aumentar a tarifa da água do Alqueva, já que ela terá “reflexo direto nos preços dos alimentos”, depois dos anúncios de apoios para evitar essa situação. A Fenareg assegura que, apesar do anúncio do aumento ser de 24 por cento, o custo da água pode atingir os 30 por cento.

 

No entanto, mostra satisfação com o facto da subida ser apenas para este ano, voltando em 2024 a ser aplicado o valor de 2022 e revela “alguma esperança para o futuro” com a possibilidade de uma baixa no preço. Para que isso seja possível é “necessário que a tutela reveja e ajuste parâmetros como a energia”.

 

A propósito, José Núncio, presidente da Fenareg, recorda que “aquando da constituição do EFMA, foi financiada pelos fundos agrícolas uma central hidroelétrica para viabilizar o aproveitamento que, mais tarde, o Governo de Sócrates vendeu à EDP para equilíbrio do défice nacional”, defendendo ser “urgente uma renegociação do preço da energia ou a reversão dos direitos de concessão da central hidroelétrica, com o Estado, a continuar entretanto, a garantir a viabilidade da EDIA”, sugeriu.

ENERGIA FLUTUANTE

Entre as medidas que a ministra referiu e que irão contribuir para o “equilíbrio da gestão” do EFMA e da “competitividade agrícola” destaca-se pela “sua importância estratégica” a “implementação imediata da produção fotovoltaica para autoconsumo” um dos maiores custos na atividade da empresa.

 

O investimento de 45 milhões de euros no Parque Fotovoltaico de Alqueva vai permitir reduzir a metade a compra de electricidade à rede, contribuindo, ainda, “para o aumento da eficiência hídrica, pela redução da evaporação e do desenvolvimento de algas”, disse Maria do Céu Antunes.

 

“Estamos a investir no presente para assegurar sustentabilidade no uso da água e da energia no futuro. Este é um investimento fundamental para a sustentabilidade da atividade agrícola e a questão energética é crucial. Não tenhamos dúvidas: o uso de energias renováveis é o caminho certo para a transição energética e para a redução da pegada de carbono”, acrescentou a ministra.

 

APOIO DE 180 MILHÕES

O Ministério da Agricultura e da Alimentação anunciou, na passada segunda-feira, que os agricultores já podiam recorrer “à medida excecional e temporária de compensação pelo acréscimo de custos de produção da atividade agrícola e pecuária, sem que seja necessária qualquer candidatura”.

 

Trata-se de um apoio no valor global de 180 milhões de euros e, para isso, os beneficiários têm que aceder à sua área reservada no portal do Instituto de Financiamento da Agricultura e Pescas (IFAP) e confirmar, até 26 de maio, que pretendem receber esta ajuda.

 

O comunicado, informa também que está disponível um apoio para o gasóleo colorido e marcado e eletricidade verde, “que será pago nos próximos dias”, não sendo precisa qualquer confirmação, tendo em conta que se trata de uma medida já aplicada em 2021 e 2022.

 

ALMODÔVAR POUPA ÁGUA

A Câmara Municipal de Almodôvar decidiu tomar medidas que visam a “contenção do uso da água” e a mitigação dos efeitos da seca. António Bota, presidente do município e da Comunidade Intermuncipal do Baixo Alentejo (Cimbal) avançou, ainda, que a autarquia irá “disponibilizar o uso da água dos poços e dos furos públicos a todos os agricultores e produtor”.

 

O concelho de Almodôvar é abastecido de água pela barragem do Monte da Rocha, no concelho vizinho de Ourique, que atualmente se encontra com apenas 10 por cento da sua capacidade.

 

A situação só ficará resolvida com a ligação à barragem do Roxo o que irá permitir o abastecimento a partir do Alqueva.

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