Diário do Alentejo

Cibersegurança pode marcar a diferença no IPBeja

17 de junho 2022 - 13:15
Instituição tem Plano Estratégico para os próximos quatro anos

O Instituto Politécnico de Beja (IPBeja) tem um novo Plano Estratégico. O documento faz a avaliação da realidade, das vantagens e desvantagens que a instituição enfrenta, e pretende ser um instrumento que contribua para a sua “afirmação ao nível internacional, nacional e regional”. A nova presidente, Maria de Fátima Carvalho, eleita no final do ano de 2021, tem como lema “Afirmar o Presente para Sustentar o Futuro”. Numa conversa com o “Diário do Alentejo”, a presidente da instituição e o seu vice, José Bilau, revelaram alguns dos projetos em que estão a investir para afirmar o IPBeja como uma escola de referência a nível nacional.

 

Texto Aníbal Fernandes

 

O contexto atual é definido como “desafiador” e resulta da pandemia covid-19 e da recente guerra na Ucrânia, mas a confiança no futuro do IPBeja é um facto. Apesar do Plano Estratégico 2025 apresentar várias condicionantes – “fraquezas e ameaças” – não se inibe de referir as “forças e oportunidades” que daí resultam.

 

“Este documento é uma reflexão estratégia para o médio prazo. Vem propor um conjunto de medidas para a nossa realidade. Não efetuarmos um diagnóstico correto dessa realidade seria enganarmo-nos a nós próprios”, disse José Bilau.

 

Na realidade o diagnóstico apresentado não é animador: reduzida procura em alguns cursos; deficiente produção científica dos docentes; limitação de equipamentos (informática, laboratorial e exploração agrícola); escassa internacionalização; inexistência de centros de investigação reconhecidos pela Fundação para a Ciência e Tecnologia; envelhecimento do corpo docente; região em perda demográfica; concorrência das universidades de Évora e Algarve; envelhecimento e desmotivação de alguns docentes devido à não progressão na carreira; dificuldades associadas ao acesso rodoviário e ferroviário. Todos estes aspetos “condicionam as nossas propostas e é tendo em conta essa realidade que são apresentadas uma série de medidas no sentido de ultrapassar essas fragilidades, mas isso não nos atormenta, pelo contrário, são um desafio e tentamos mostrar que existem ferramentas para intervir e melhorar nas várias áreas”, diz o vice-presidente do IP Beja.

 

Mas nem tudo vai mal e existem áreas de referência a nível nacional. O mestrado em Cibersegurança na Escola Superior de Tecnologia e Gestão, com 30 alunos, é disso um exemplo. “Esta é uma área perfeitamente diferenciadora e que pode e deve servir de âncora para atrair mais alunos inclusive para outros cursos. Se eu quero estudar moda vou para a Covilhã, se quero estudar cibersegurança vou para Beja”, exemplifica Maria de Fátima Carvalho.

 

Aliás, neste momento, o IPBeja está a dar formação no Instituto Militar Universitário, em Algés, a efetivos que integrarão num futuro próximo “um corpo militar para o ciberespaço”, revelou o coordenador Rui Silva ao “Diário do Alentejo”. “Essa unidade vai surgir da transformação do centro de ciberdefesa - que vai passar a chamar-se centro de operações de ciberdefesa - mantendo-se na dependência do Estado-Maior General das Forças Armadas (Emgfa). Atualmente têm 38 militares e, até 2027, serão incorporados mais 50 militares por ano”, revela acrescentando que esta escolha resultou de um concurso entre as várias instituições do ensino superior e no qual o IPBeja foi selecionado.

 

Mas esta relação vem de trás: “Em 2020 houve uma aproximação do Emgfa ao IPBeja para avaliar a nossa capacidade e assinámos um protocolo de cooperação, que vai muito para além das aulas que já estamos a dar e passa pela edificação de uma escola de Ciberdefesa”, explica Rui Silva.

 

Para além deste caso, o laboratório de cibersegurança presta serviço a câmaras municipais, Polícia Judiciária e empresas de referência, como, por exemplo, a Fujitsu e Innowave. “Esta área agora tem muita visibilidade e essa visibilidade traduz-se em protocolos com essas entidades”, constata Maria de Fátima Carvalho. “É nossa intenção tirar partido deste trabalho. A Comissão de Coordenação de Desenvolvimento Regional (CCDR) do Alentejo propõe-se a financiar o IPBeja naquilo que necessitar nesta área. Estamos muito atentos e interessados. Ainda não tivemos tempo para dar esse salto, mas já temos muitas ideias”, diz a presidente da instituição.

 

AGRÁRIA

Diferente é o caso na Escola Superior Agrária (ESA). A nova direção encontrou-a num “fosso” e estão a tentar que saia dele. “A ESA também será um produto diferenciador, mas para isso temos barreiras a vencer”. Uma delas é a idade dos docentes. “Para nos tornarmos diferenciadores temos que mudar o corpo docente e investir na agricultura inteligente e essa agricultura não se faz com pessoas de quase 70 anos”, diz Maria de Fátima Carvalho.

 

As crises que assolaram o País nos últimos 20 anos levou a que a escola não fizesse contratações durante esse período. No entanto, a direção do IPBeja considera a ESA “imprescindível para a região devido ao peso que o setor tem. Temos as melhores condições que qualquer outra escola de ensino agrário para proporcionar um ensino de qualidade: laboratórios, centros experimentais, diversas infraestruturas onde se podem fazer ensaios”, acreditam.

 

No entanto, a ESA não está parada e integra a Agenda InsectERA, um projecto que visa “colocar Portugal na vanguarda da indústria dos insetos”, um consórcio em que participam 38 entidades e que é apoiado pelo Programa de Recuperação e Resiliência (PRR) da União Europeia.

 

UNIVERSIDADE EUROPEIA

A internacionalização da instituição, nas suas várias vertentes, também está no foco do IPBeja. Após Bolonha, que permitiu uma harmonização dos cursos entre si, surge agora a Universidade Europeia, um patamar que permitirá às escolas de ensino superior juntarem-se “em espaços comuns de partilha”, quer de professores, quer de conhecimento. Beja integra um consórcio que se candidata a este estatuto – o resultado saber-se-á em julho – em conjunto com universidades da Finlândia, Dinamarca, Bélgica, Alemanha, Países Baixos e Chéquia.

 

Por outro lado a captação de alunos estrangeiros continua a ser uma prioridade. Neste momento cerca de 20 por cento dos estudantes do IPBeja são originários de fora de Portugal e, destes, metade são dos Palops. “Estamos a tentar aprender com a nossa experiência e a melhorá-la. A intenção é atrair mais alunos através da qualidade do ensino”, explica Maria de Fátima Carvalho. 

 

Outro dos fatores que pode ajudar à captação de alunos – e não só dos estrangeiros – é a oferta de alojamento em residências de estudantes. “Temos de criar condições para que os alunos venham para cá”, diz José Bilau. Isso também passa pela aposta na oferta de alojamento a preços baixos. “Se queremos internacionalizar o IPBeja temos de oferecer condições” e as residências são um fator crítico e potenciador. “Se a habitação for um problema em outras cidades e não o for em Beja” isso será um fator de atração. Atualmente existem sete residências com capacidade para 400 alunos, mas esse número pode dobrar com o apoio do PRR, até 2025.

 

Paralelamente, e já com contactos avançados, o IPBeja pretende proporcionar cursos com “dupla titulação”, reconhecidos por dois países diferentes. O caso mais adiantado é o Brasil, onde existem instituições com quem já têm relações, e as áreas eleitas serão a informática, a segurança alimentar e a agrária.

 

DEMOGRAFIA

Talvez devêssemos ter começado por aqui: a questão demográfica. O Plano Estratégico do IPBeja 2025 faz uma extensa caracterização do tema. “A demografia é a condicionante principal”, diz a presidente do IPBeja. “Pensamos minorar esse problema com as formações ao longo da vida, estreitando relações com instituições da região de modo a fazermos cursos por medida e indo ao encontro das necessidades da comunidade”.

 

O ensino de proximidade e a microcreditação é uma das formas de o fazer e já estão em campo algumas experiências, nomeadamente, em Mora, com formações de Higiene e Segurança no Trabalho (HST) e Culturas Regadas, e em Almodôvar, também com HST. Odemira pode ser o próximo alvo.

 

A prestação de serviços à comunidade é outra das apostas da escola e com provas dadas a decorrer: a ESA apoia vários players da região, nomeadamente, através do controlo de qualidade e microbiológico da água ou a avaliação da qualidade das sementes; o Instituto da Segurança Social conta com a colaboração do IPBeja na elaboração do Plano de Desenvolvimento Social da região; e o Ministério da Justiça pediu para que fosse criado um curso superior para formar funcionários judiciais.

 

O que também podia ajudar era a melhoria das acessibilidades, quer rodoviárias, quer ferroviárias. O IPBeja tem apoiado as iniciativas surgidas na sociedade civil, nomeadamente, as do movimento Beja Merece +, e reconhece “a importância dessas infraestruturas para o desenvolvimento da região, sendo que o desenvolvimento da região é um dos nossos propósitos”, diz José Bilau.

 

FINANCIAMENTO

Neste momento há um modelo de financiamento em que está previsto um ajuste anual de dois por cento, mas os politécnicos, no seu conjunto, estão a tentar melhorá-lo, no sentido em que seja reconhecido o papel estratégico que as escolas têm nas zonas periféricas e de fraca densidade. “Não se pode financiar da mesma forma aquilo que é desigual. O nosso papel é completamente diferente. Esperamos que o modelo de financiamento que venha a ser aprovado contemple a realidade das instituições que estão sedeadas no interior, diz José Bilau: “O custo da interioridade é muito grande”, conclui Maria de Fátima Carvalho.

 

BEJA CAPITAL DA ÁGUA

Por enquanto não passa de um “sonho” acalentado pela presidente do IPBeja, Maria de Fátima Carvalho, mas que conta já com apoios importantes. A água “pode ser um fator diferenciador para a região”, acredita. “Trata-se de utilizar o nosso saber nesta área para criar um centro nacional de conhecimento da água, incluindo tudo aquilo que tem a ver com a arqueologia da água, para que também seja também um fator de atração turístico”, explica. Para já a Câmara Municipal de Beja e a CCDR simpatizam com a ideia.

 

Comentários