A Resialentejo é a empresa responsável pelo tratamento e valorização de resíduos urbanos dos concelhos de Almodôvar, Barrancos, Beja, Castro Verde, Mértola, Moura, Ourique e Serpa.
Entre 2000 e 2020, a taxa de reciclagem nacional subiu 16 por cento, no que diz respeito ao lixo produzido pelos municípios, que é depois reciclado, passando de 10,5 para 26,5 por cento. Atualmente, Portugal ainda está muito abaixo da média da União Europeia, 47,8 por cento, segundo um estudo divulgado recentemente pelo Pordata – Base de Dados Portugal Contemporâneo.
Texto Ana Filipa Sousa De Sousa
O azul imenso do céu, em mais um dia inusitado de inverno, soalheiro e seco, mas que se vai tornando habitual, é salpicado pelos pontos brancos e negros que voam em círculos. Acompanhados no ar pela vasta colónia de cegonhas residentes, o ‘Diário do Alentejo’ percorreu a pé grande parte dos 60 hectares ocupados do Parque Ambiental do Montinho, onde fica localizada a Central de Tratamento Mecânico e Biológico da Resialentejo, empresa responsável pela reciclagem de resíduos urbanos de oito dos 14 concelhos do distrito de Beja.
É aqui que o processo de receção, triagem e separação dos resíduos provenientes das nossas casas seguem para reaproveitamento, maioritariamente, para Leiria, Lisboa ou Espanha. Por sua vez, na empresa apenas a compostagem do lixo orgânico (matéria biodegradável) é reciclada “internamente a 100 por cento”.
“Atualmente, recebemos aqui 46 mil toneladas de resíduos por ano, cerca de 40 a 41 mil ficam nesta zona de compostagem, vindas da recolha seletiva (ecopontos) e dos indiferenciados (lixo comum), mas neste momento só conseguimos processar 30 mil toneladas”, revela-nos o diretor de operações, Pedro Sobral, enquanto se aproxima da Central de Tratamento. Esta unidade funciona apenas a dois turnos. Quando é feita a separação do “embalão”, ou seja, embalagens do ecoponto amarelo em material fino, rodante ou leve, e quando são retirados os resíduos recicláveis dos “lixos indiferenciados” e aproveitada a sua matéria orgânica para a agricultura.
“Aqui há muita coisa a acontecer. Depois do ecoponto há a separação de muitos materiais que chegam aqui e que não deveriam estar, fruto da desinformação, dos que estão informados e que não querem saber, e dos que arranjam mil e uma desculpas para não reciclarem”, continua Pedro Sobral, apontando para umas fitas de rega que não pertencem ao lixo que acabou de chegar. Ainda assim, “cabe-nos a nós sensibilizá-los e em ultima análise tentar criar mecanismos para que mesmo aqueles que não querem fazer reciclagem não sejam obrigados a tal, mas pelo menos que paguem por isso”, como já acontece em Ourique, onde cada pessoa paga uma taxa consoante o lixo que produz.
Seguidos, desta vez em terra, pela enorme praga de lagartas do pinheiro que este ano chegou muito mais cedo do que o previsto e em maior quantidade, Pedro Sobral guia o ‘DA’ até à zona mais antiga da Resialentejo, o pavilhão do papel-cartão, a unidade do vidro, a zona de pneus, eletrodomésticos e trituração de verdes. À semelhança da unidade principal do “embalão”, aqui também existe uma separação dos diferentes materiais e posteriormente o seu envio para os locais de reciclagem, contudo adianta que “o próximo projeto [a nível dos eletrodomésticos] é pegarmos em alguns e reutilizá-los ou em termos artísticos ou até em termos funcionais, porque é triste perdermos algumas relíquias que nos chegam”.
Esta importância do reaproveitamento nos diferentes setores é o motor que faz mover a Resialentejo. Exemplo disso são as percentagens que demonstram que na recolha seletiva apenas 15 a 20 por cento é encaminhado para refugo, o que demonstra que 80 a 85 por cento das matérias que chegam é reciclado com sucesso.
“A RESIALENTEJO É PARTE DAS SOLUÇÕES”
Também os últimos números apresentados pela Resialentejo permitem notar este aumento em relação à percentagem de reciclagem alcançada. Segundo o presidente do Conselho da Administração, Marcelo Guerreiro, “nos últimos cinco anos a recolha seletiva passou de 40 quilos por habitante durante um ano para 60 quilos por habitante no mesmo período”, fruto do reforço desta prática em conjunto com a noção das realidades e dinâmicas locais.
Estes resultados nascem de “uma maior consciência ambiental e de um esforço crescente de sensibilização das populações para o desafio da sustentabilidade”, mas sobretudo do forte investimento que tem sido feito a nível nacional e sobretudo a nível local. Para a Resialentejo, a aquisição de uma maior quantidade de equipamentos de recolha seletiva Porta-a-Porta, compostagem doméstica e PAYT (Pay As You Throw), a já mencionada taxa de pagamento consoante a produção de lixo; a expansão da rede de ecopontos que atualmente contabiliza 680 ilhas ecológicas; a conclusão da Estação de Transferências de Recicláveis de Moura e da Unidade de Tratamento de Bioresiduos; a adaptação tecnológica dos ecocentros existentes; a renovação da frota; o melhoramento do edifício social que permitirá dar outras condições aos trabalhadores, como um gabinete médico, uns balneários femininos e masculinos, uma copa e uma lavandaria. Bem como, a sensibilização direta, em especial, com os mais novos, mas também na comunicação social e junto das populações, a par de novas respostas de separação e recolha dos resíduos são a forte aposta da empresa como “parte da construção de soluções e resultados”.
“O projeto Porta-a-Porta por exemplo, abrange o concelho de Barrancos integralmente, o centro histórico de Beja, Mértola, Serpa, e Moura e Ourique futuramente passarão a ter toda a cidade e vila, respetivamente, incluída”, avança o engenheiro Pedro Sobral.
Marcelo Guerreiro vai mais longe e garante que esta subida deve-se essencialmente às “ gentes do mundo rural que têm uma noção de equilíbrio entre o homem e a natureza que nem sempre são reconhecidas pelos decisores e pelos media. Demasiadas vezes falam, sem conhecer a realidade dos nossos territórios do interior e do mundo rural, mas ninguém como nós sabe que recebemos e colhemos o que semeamos e isso aplica-se também à nossa relação com o ambiente”. Na medida que “as sementes que lançamos, o que cada um faz em sua casa, na escola, no local de trabalho ou no campo é parte do esforço de dar mais futuro á nossa terra”, remata.
Uma menor quantidade de resíduos, uma maior taxa de reciclagem e reutilização de materiais significam consequentemente um menor impacto no meio ambiente, e logo, contribuem para um futuro melhor. Chega a ser curioso o facto de na Resialentejo, o local onde começa a mudança para um recuar ou um retardar das alterações climáticas ser o sítio escolhido por centenas de cegonhas que não querem migrar e por as dezenas de lagartas de pinheiro que chegam cedo de mais sem saberem que aquela empresa, tal como muitas outras de norte a sul de Portugal são pontos de segurança ambiental para a sua espécie animal.
Ao sair pelo grande portão do Parque Ambiental do Montinho, onde a cancela não se cansa de subir e descer para deixar entrar mais um camião carregado de lixo pronto a ser transformado, fica o desejo de que as gentes do Baixo Alentejo possam inverter, num futuro próximo, a situação migratória do bando de cegonhas que acompanhou o ‘DA’. Fica a esperança de que, através da reciclagem, o número de materiais que segue para aterro reduza drasticamente e, por isso, esse seja mais um motivo que faça o bando só voltar a visitar a Resialentejo nas Primaveras. E aí, quando este pequeno resultado tiver sido alcançado, cada pessoa, o Alentejo e Portugal terão dado mais um passo para vencer a batalha das alterações climáticas com a arma da reciclagem. Por agora, as cegonhas ainda por lá continuam.
LIGA INTERMUNICIPAL DA RECICLAGEM
A Liga Intermunicipal da Reciclagem é um projeto anual desenvolvido pela Resialentejo que visa criar uma competição saudável em torno dos resíduos reciclados por município e incentivar as populações a adotarem práticas a favor do meio ambiente.
Em 2021, o pódio foi ocupado pelo município de Ourique em primeiro lugar (67 kg/habitante), Castro Verde em segundo (63,1 kg/habitante) e Beja em terceiro (54 kg/habitante). Os restantes lugares do ranking foram ocupados por Barrancos (52,2kg), Moura (48,6 kg), Serpa (47,7 kg), Almodôvar (45,3 kg) e Mértola (38,4 kg). Este ano a Liga já arrancou, com o município de Beja em primeiro lugar, seguido de Castro Verde e Serpa.
CANIL E GATIL INTERMUNICIPAL “CAGIA” QUASE ESGOTADO
A Resialentejo é ainda detentora do canil e gatil intermunicipal Cagia que abrange cerca de 11 concelhos do Alto e Baixo Alentejo e que acolhe animais errantes através dos veterinários municipais e das autarquias.
Neste momento a lotação encontra-se praticamente esgotada. “No canil só nos cabe mais um ou dois cães para se juntarem aos 50 que temos e em relação aos gatos temos disponibilidade para acolher 60 e temos 53”, conta ao ‘DA’ Carina Barradas, funcionária do Cagia.