Diário do Alentejo

Beja com menor número de sempre em nascimento de bebés

25 de janeiro 2022 - 15:25

Pela primeira vez desde que há dados disponíveis, entre janeiro e novembro de 2021, no distrito de Beja, nasceram menos de 1000 crianças. Este número resulta do Programa Nacional de Rastreio Neonatal que aponta para uma redução de cerca de seis mil nascimentos a nível nacional, no mesmo período e quando comparado com o ano de 2020.

 

Texto Aníbal Fernandes

 

Nunca nasceram tão poucas crianças no Baixo Alentejo, por exemplo em novembro do ano passado apenas tinham nascido 974 crianças. O problema é transversal a todo o País, mas com mais intensidade nas regiões do interior. Segundo dados do Censos 2021, Portugal tinha menos 217 376 habitantes do que há uma década, um decréscimo de 2,1 por cento. No entanto no Alentejo (NUT – inclui alguns concelhos do Ribatejo) a diferença negativa atingiu os 6,95 por cento. E a tendência, segundo os especialistas, irá manter-se nos próximos anos, com o registo de muitos mais óbitos do que nascimentos.

 

O envelhecimento da população verificado na última década, ocorreu de forma generalizada em todo o País, mas, particularmente, na região do Alentejo, onde o índice passou de 163 para 178 idosos por cada 100 jovens. Em Portugal este indicador passou de 102, em 2001 para 128 em 2011. O Alentejo apresentava, em 2011, uma densidade populacional de 24,0 habitantes por km2 , muito inferior à densidade média nacional, 114,5 por km2. Mas no Baixo Alentejo a densidade é muito menor atingindo em Mértola o valor de apenas 5,6 habitantes por quilómetro quadrado.

 

Segundo dados revelados pelo Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge, até novembro de 2021, quando comparado com igual período de 2020, nasceram menos 99 bebés no distrito de Beja, um decréscimo de 9,4 por cento.

 

Sandra Lopes, socióloga e docente no Instituto Politécnico de Beja, mestre em Demografia Histórica e Social e com doutoramento pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, não estranha a “tendência de descida dos níveis de natalidade e de fecundidade” que, aliás, é “observada na generalidade nas populações dos vários territórios, com ligeiras diferenças entre territórios urbanos e territórios predominantemente rurais”.

 

As razões para esta realidade têm a ver “com fatores demográficos estruturais que condicionam a dinâmica populacional que no caso do distrito de Beja contribuem para níveis de duplo envelhecimento – diminuição dos jovens e aumento dos idosos - muito elevados e acima da média nacional, o que explica a tendência, anos a fio, da falta de sustentabilidade demográfica”, assim como outros fatores genéricos associados a dimensões sociais e culturais: investimento no projeto formativo e profissional futuro por parte quer das mulheres quer dos homens em idade fértil, elevado investimento na formação dos filhos e do valor da criança na atualidade, aumento da idade média ao primeiro filho que compromete o projeto familiar de ter mais filhos além do primeiro.

 

No entanto, segundo o Inquérito à Fecundidade de 2019 realizado pelo INE (2020), “a fecundidade final esperada e a fecundidade desejada”, mostra “o desencontro entre o que a população feminina em período fértil deseja por oposição ao que na realidade se constata na realidade através do índice sintético de fecundidade ” e que se situa abaixo do limiar médio de 1,4 filhos por mulher em idade fértil (NUTS II Alentejo). Ainda, segundo o mesmo estudo, no caso do Alentejo, a fecundidade esperada é de 1,7; a desejada 2,08; e o ideal de filhos numa família 2,35.

 

“Ou seja, não é nada que se resolva de hoje para amanhã”, diz Sandra Lopes. Para minimizar o problema é necessário “pensar de modo sistémico e multidimensional que facilitem o alcance da tal ‘fecundidade desejada’- políticas de apoio à infância, políticas de emprego e estabilidade financeira para os jovens a nível nacional, pensar a natureza dos papéis no seio familiar, entre vários assuntos possíveis de analisar” e um “investimento sério nas condições que contribuam para a retenção dos jovens ativos a nível local, sobretudo nos municípios do Baixo Alentejo que apresentam níveis de duplo envelhecimento dos mais elevados a nível nacional”.

 

No caso do Alentejo, “outra dimensão a analisar e que pode contribuir para uma maior sustentabilidade demográfica é a importância da população migrante (dado que o saldo natural é desde há longo tempo negativo na região) sendo a possibilidade de receber, acolher com qualidade, a população migrante algo pode ajudar a reduzir os efeitos dessa situação de envelhecimento demográfico na base”, concluiu Sandra Lopes.

 

“OLHAR A IMIGRAÇÃO COMO UMA OPORTUNIDADE” 

O diagnóstico há muito que está feito e cabe aos agentes políticos da região avançarem com propostas que possam, de alguma forma, inverter a tendência demográfica. Deputado eleito por Beja, Pedro do Carmo começa por lembrar que este “é um problema europeu e nacional com um impacto mais grave nos territórios do interior como é o nosso”. Curiosamente, a população mundial continua a aumentar, muito pelo crescimento populacional em países menos desenvolvidos o que leva a fenómenos como “a imigração ilegal” com todas as suas consequências. No entanto o deputado socialista diz que se deve “olhar para a imigração não como uma ameaça, mas como uma oportunidade”, até porque a falta de mão-de-obra na região é uma realidade.

 

Quanto às medidas para incentivar os casais jovens a ter mais filhos, Pedro do Carmo lembra os apoios disponibilizados pelas autarquias que “sendo pequenos, sempre ajudam” e algumas medidas governamentais em que destaca o pagamento dos livros escolares e as creches gratuitas.

 

Já o deputado comunista João Dias, igualmente eleito pelo círculo de Beja, defende medidas a vários níveis: “uma economia diversificada que possa responder às expectativas dos mais jovens” e que não funcione na base “de baixos salários”. O deputado do PCP diz que “sem confiança no futuro e estabilidade no emprego” dificilmente os casais terão “mais do que um filho” quando é sabido que para manter o nível de população seria preciso que a média de nascimentos fosse de 2,1 por mulher.

 

João Dias recorda que o distrito de Beja é aquele que tem os salários mais baixos do País e que “sem formação na região que permita aos jovens manterem-se por cá e sem uma oferta de emprego diversificada” o êxodo irá continuar. Com a oferta existente, quer de empregos quer de condições laborais, a região apenas pode ambicionar a atrair imigrantes “que na primeira oportunidade, tal como fizeram os nossos emigrantes em França, Luxemburgo ou Suíça, trocarão a agricultura pela distribuição, restauração ou construção”.

Comentários