Diário do Alentejo

Um terço da população do Baixo Alentejo é pensionista

14 de dezembro 2021 - 15:15

Cada reformado do distrito de Beja recebe em média apenas 390 euros, doze vezes por ano, menos 100 euros do que a nível nacional

 

Mais de um terço da população do distrito de Beja é pensionistas. Em Portugal existem 337 beneficiários de uma qualquer pensão por cada mil habitantes. Na nossa região o número sobe para 422 e em Aljustrel o valor atinge os 527. Mas há uma explicação para este último caso…

 

Texto Aníbal Fernandes

           

Há aquela velha história de duas pessoas que comeram duas galinhas, mas, na verdade, apenas uma delas comeu as duas. No entanto, para a estatística, cada um dos indivíduos comeu uma. Aljustrel aparece nos dados do INE como o concelho do distrito de Beja com mais pensionistas por cada mil habitantes e, juntamente com Castro Verde e Almodôvar, é também aquele em que existem razões para isso: “é necessário ter em conta a quantidade de pessoas que se encontram abrangidas pelo regime especial de antecipação da idade de acesso à pensão, nomeadamente, por terem tido profissões consideradas de desgaste rápido, como, por exemplo, os trabalhadores que laboram no interior de minas, lavarias” e outros do mesmo setor produtivo, lembrou ao “Diário do Alentejo” a vereadora da Câmara Municipal de Aljustrel responsável por área do apoio social Paula Lampreia.

 

Por outro lado, os números também não mentem e o Baixo Alentejo é a região do País onde o valor médio das pensões é mais reduzido. Enquanto a média nacional atinge os 5811 euros por pensionista/ano, no distrito de Beja – excluindo Odemira – esse valor não ultrapassa os 4960 euros, qualquer coisa como 390 euros por mês, dividindo o total em apenas 12 meses. Nos concelhos do Litoral Alentejano o valor sobe para 5443 euros, mesmo assim, muito abaixo da média nacional. Quanto ao rácio por mil habitantes, a média nacional é de 337, no litoral alentejano 395, no distrito de Beja 422 e em Aljustrel, como já foi dito, 527.

 

Na semana passada, a ministra do Trabalho e Segurança Social, Ana Mendes Godinho, anunciou a portaria que atualiza as pensões de reforma de acordo com a inflação em novembro: de acordo com a legislação, as pensões de valor mais baixo até 886 euros subirão um por cento a partir de 1 de janeiro de 2022. Já as pensões entre esse valor e os 2659 euros só subirão 0,49 por cento e as mais altas apenas 0,24 por cento. Assim, o aumento efetivo deverá ficar abaixo da inflação média calculada para dezembro e que é de 1,2 por cento. O aumento de dez euros para as pensões mais baixas que chegou a ser negociado no âmbito do Orçamento de Estado para 2022, não avança porque a lei foi chumbada.

 

Segundo o Census de 2021 a sub-região estatística portuguesa NUTS III – que não inclui Odemira - tem uma população estimada em 114 692 habitantes (2021), sendo que os pensionistas, em dados do INE de 2013, seriam 42 398, mais de um terço do total de habitantes. Em Odemira a percentagem não é tão elevada: para os cerca de 30 mil habitantes o INE identificou 8414 pensionistas.

 

TRANSFERÊNCIA DE COMPETÊNCIAS

Com o valor das pensões sociais a reduzirem, os apoios sociais por parte de autarquias e instituições particulares de solidariedade social (IPSS) ganham mais relevância. Acresce que está prevista a transferência para as autarquias locais das competências nesta área que o Decreto-Lei 55/2020, de 12 de agosto, explica que é passível de “financiamento da União Europeia, mas, quando este não exista” será assegurada pelo Estado.

 

O mesmo decreto estipula que “compete à câmara municipal assegurar o serviço de atendimento e de acompanhamento social de pessoas e famílias em situação de vulnerabilidade e exclusão social”, competência esta que será exercida “nos termos a definir por portaria dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças, das autarquias locais e da segurança social”.

 

A vereadora da Câmara Municipal de Aljustrel responsável por esta área, diz que esta “transferência de competências [pode] contribuir para a autonomia local e até para o próprio desenvolvimento do território, proporcionando ainda uma aproximação às populações, mas desde que os recursos financeiros sejam proporcionais às atribuições previstas. Isto é, para que esta transferência possa efetuar-se, será necessário que acoplado a este processo de descentralização proposto pelo Estado seja aplicado o correspondente envelope financeiro sem prejuízo para os municípios”.

 

Paula Lampreia recorda que “os municípios há vários anos que atuam na área da intervenção social” e “estão próximos da realidade e sido agentes ativos na busca das melhores soluções, colaborando, desde sempre, com as demais entidades”.

 

“Para o Município de Aljustrel, para que esta transferência possa acontecer com sucesso, para além dos recursos financeiros proporcionais às novas tarefas, será necessário ainda desenvolver uma boa estrutura logística e administrativa. Os meios ter-se-ão, por isso, de adaptar à nova realidade, possibilitando uma maior adequação dos serviços prestados à população, o que terá obrigatoriamente de se traduzir num melhor atendimento e numa resposta mais eficaz aos cidadãos, principalmente aos que estão mais vulneráveis socialmente”.

 

AUMENTOS “INSUFICIENTES”

No concelho de Cuba, segundo dados disponibilizados pelo INE, 403 pessoas em cada mil habitantes são pensionistas. João Português, presidente da Câmara Municipal de Cuba, recorda que as pensões “não aumentaram durante anos e aquilo que é agora anunciado é claramente insuficiente”.

 

Quanto à transferência de competências para as autarquias na área do apoio social, o autarca classifica o processo e a “verba prevista para transferir para o nosso concelho, uma autêntica aberração”. E concretiza: “Está previsto a transferência de 2200 euros anuais para apoios eventuais a cerca de 300 pessoas já sinalizadas”.

 

Para João Português este cenário só vem confirmar aquilo para que tem alertado e perspetiva uma “situação ruinosa” principalmente para os pequenos municípios. “A transferência de competências não vai beneficiar ninguém, nem as pessoas, nem os municípios e vai apenas aliviar os ministérios”, conclui.

 

REFORMAS COMPROMETIDAS?

O Conselho das Finanças Públicas diz que sim. Este organismo constituído por cinco elementos nomeados pelo Conselho de Ministros sob proposta conjunta do Presidente do Tribunal de Contas e do Governador do Banco de Portugal, considera que “serão necessários esforços adicionais nas finanças públicas para manter os benefícios sociais concedidos atualmente”, uma vez que “a diminuição prevista do valor futuro das pensões de velhice do sistema contributivo coloca pressões adicionais no sistema não contributivo”. Ou seja, com o valor das pensões a aproximarem-se do mínimo definido por lei, haverá cada vez mais pessoas a ter de recorrer a apoios sociais que não dependem de contribuições próprias.

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