Diário do Alentejo

Os desafios da nova PAC para a agricultura no Alentejo

05 de agosto 2021 - 16:50

Texto Aníbal Fernandes e Marta Louro

 

A nova PAC, aprovada nas suas linhas gerais durante a presidência portuguesa da União Europeia, que terminou em junho, é o culminar de um processo de negociação que teve início em 2018. De lá para cá muito mudou na União Europeia (UE), desde logo com o resultado das eleições europeias e a escolha da nova Comissão Europeia, a apresentação do pacto para atingir a neutralidade carbónica em 2050, as estratégias Biodiversidade 2030 e Do Prado ao Prato que condicionaram a proposta inicial.

 

Álvaro Amaro, eurodeputado eleito pelo PSD e que integra a Comissão de Agricultura e Desenvolvimento do Parlamento Europeu, dá como garantido “a elegibilidade dos investimentos em infraestruturas de regadio sustentável, ou o apoio acrescido aos jovens agricultores”, mas considera que ainda há muitas indefinições. Álvaro Amaro garante que a despesa nos compromissos ambientalmente mais sustentáveis andará, “globalmente, entre os 20 e os 30 por cento”, o que “para Portugal é até positivo”. Mas alertava para o facto de os cenários dependerem muito “do que for inscrito nos planos estratégicos nacionais, que são verdadeiros mapas para perceber como a PAC vai, de facto, funcionar” em cada país, nomeadamente, qual a importância dos eco regimes, o modelo adotado na convergência interna dos pagamentos e o fim dos históricos e “como será gerida a questão das pequenas explorações”.

 

Pedro do Carmo, deputado do PS eleito por Beja e presidente da Comissão Parlamentar de Agricultura e Pescas, também diz que “o essencial está feito, mas o mais importante vem agora nos pormenores, ou seja, na definição das linhas estratégicas da PAC, que têm também uma dimensão social e vão englobar as condições de trabalho e a pequena agricultura” e desafia os agricultores a “manter a postura que têm tido até aqui, de colaboração e participação para se conseguir melhorar na nossa agricultura, as condições de trabalho e a produção”.

 

“A agricultura foi fundamental neste tempo de pandemia, e a PAC vai reconhecê-lo. Temos de nos empenhar para delinear planos estratégicos para que não fique ninguém para trás e melhorar significativamente a nossa agricultura”, diz Pedro do Carmo.

 

Mais crítico é o coordenador da Confederação Nacional de Agricultura (CNA), Joaquim Manuel Lopes, que considera que a nova PAC “é mais do mesmo”. Ou seja, “os mesmos de sempre vão continuar a comer no mesmo prato, e os pequenos agricultores vão continuar a ter as mesmas dificuldades”. “Esta PAC vai ser a continuidade das anteriores”, denuncia, defendendo uma estrutura de apoio “para quem produz efetivamente” e o afastamento de uma estratégia ligada à cultura intensiva, apostando na “produção diversificada de proximidade e com consumo de proximidade”.

 

UMA POLÍTICA “MAIS VIRADA PARA A SUSTENTABILIDADE”

 

Rui Garrido, presidente da ACOS – Agricultores do Sul, acredita que esta PAC está “mais virada para a sustentabilidade da agricultura e para a defesa do ambiente”. Em declarações ao “Diário do Alentejo”, manifesta o desejo de que “as medidas que venham a ser implementadas sejam exequíveis e tenham apoios interessantes para os agricultores e de fácil aplicação, porque, se não, isto não resulta”, adverte. “É importante, que algumas das ajudas, da atual PAC, como os apoios aos novos agricultores, ou ao olival tradicional se mantenham”.

 

Já Francisco Palma, presidente da Associação de Agricultores do Baixo Alentejo, alerta para o facto de os investimentos dos agricultores serem feitos a médio e longo prazo e, por isso, as sucessivas alterações na PAC não são bem vistas: “Sete anos é um tempo muito curto para fazer grandes mudanças em termos de política agrícola. Quando foi instituída teve quase 30 anos (entre os anos 60 e 90) sem ser alterada, mas nos últimos 20 anos já foi mudada três vezes com conceitos novos e com novas regras”, critica. “Aquilo que sabemos é que o pacote financeiro vai diminuindo de ano para ano, mas as obrigações dos agricultores vão sempre crescendo”, por isso, espera “menos recursos financeiros e mais exigências burocráticas”.

 

Gonçalo Almeida Simões, diretor executivo da Associação de Olivicultores do Sul (Olivum) congratula-se com a aprovação da nova PAC que espera ver aplicada a partir de 1 de janeiro de 2023. “Estes dois primeiros anos - 2021 e 2022 – serão anos de transição, ou seja, vamos ter a aplicação da antiga PAC, com um novo orçamento comunitário, mas ainda não com as novas regras. Até 1 de janeiro de 2023 os estados membros vão ter de definir os seus planos estratégicos”, explica.

 

Para este representante do setor olivícola, “a forte componente ambiental” da nova PAC “pode acabar por ser um fator positivo”, mas esta componente estava muito ligada ao pilar das medidas agroambientais. Desta vez, vai estar ainda mais presente, através dos eco regimes”, explica Gonçalo Almeida Simões, defendendo a importância do Governo português elaborar “medidas dentro desses eco regimes que vão de encontro às especificidades dos setores”.

 

“Temos uma nova reforma da PAC, mas na verdade, o olival dentro do Empreendimento de Fins Múltiplos de Alqueva  (EFMA), por decisão do então ministro da Agricultura, Luís Capoulas Santos, em 2019, está arredado de concorrer às ajudas do Plano de Desenvolvimento Rural (PDR)”,  protesta.

 

“GRANDE EXPECTATIVA”

 

José Palha, presidente da Associação Nacional de Produtores de Cereais, olha “com grande expectativa” para a nova PAC e para o período de transição porque, recorda, “o setor dos cereais tem vindo a atravessar um período difícil com a perda de área ano após ano, o que coloca o País numa posição praticamente ímpar na União Europeia com um dos menores graus de autoaprovisionamento de cereais, um alimento fundamental para a alimentação dos portugueses”.

 

Este dirigente associativo diz que “o Governo está sensível a esse problema” com a ministra da Agricultura a garantir, “por diversas vezes, que a ajuda ligada aos cereais, à semelhança do que havia antes em 2013, será uma realidade já no período de transição. Esperamos que essa seja, também, uma realidade no período até 2027. É nisso que acreditamos”.

 

José Palha recusa o medo da mudança: “Temos de nos adaptar da melhor maneira que formos capazes, tentando produzir mais com menos e com melhor impacto ambiental possível”.

 

No setor da pecuária, Nuno Faustino, presidente da Associação de Criadores de Porco Alentejano (ACPA) também manifesta “uma grande expectativa” as novas medidas para a agricultura extensiva, que tem sido, segundo diz, “o parente pobre da PAC. Esperamos que, de alguma forma, a justiça seja feita com a convergência do regime de pagamento base, porque existe uma diferença muito grande entre agricultores” que “fazem o mesmo trabalho, mas que no que toca as ajudas, os valores são distintos”.

 

Segundo Nuno Faustino, “outra questão importante prende-se com as medidas agroambientais e os regimes ecológicos que aí vêm que se diz que são para apoiar a agricultura e os sistemas mais ambientais, ou seja os que mais preservam o meio ambiente e que mais contributos dão para o bem-estar animal”. Existe uma grande curiosidade para ver “se as assimetrias vão ser uniformizadas e se a agricultura extensiva - aquela mais amiga do ambiente - vai ser apoiada ao mesmo nível das agriculturas mais intensivas”.

Comentários