Diário do Alentejo

Ulsba: Mais de 4 mil utentes sem médico de família

02 de junho 2021 - 17:10

Entre março de 2020 e o mesmo mês de 2021 mais 1151 utentes do Agrupamento de Centros de Saúde (ACES) do Baixo Alentejo ficaram sem acesso a um médico de família. A evolução negativa desta sub-região está em contracorrente ao verificado na totalidade do Alentejo em que mais 8399 passaram a ter acompanhamento médico personalizado.

 

Texto Aníbal Fernandes

 

Segundo os números divulgados no Portal da Transparência do Serviço Nacional de Saúde (SNS), entre março de 2020 e março deste ano assistiu-se a um aumento de 38 por cento do número de utentes que ficaram sem médico de família no Baixo Alentejo.

 

O valor até tinha sofrido uma evolução positiva entre março de 2019 (3437) e março de 2020 (3052), mas este ano voltou a subir para 4209 utentes. Um cenário contrário ao que se verifica em toda a região do Alentejo, em que se assistiu a um aumento da oferta e a uma redução do número de pessoas sem médico de família, de 36 413, em 2020, para 28 014, quase tudo conseguido à custa da “recuperação” no Alentejo Litoral que passou dos 17 649 para 8 494, no mesmo período.

 

No entanto, Dinis Silva, da Comissão de Utentes do Litoral Alentejano, disse ao “Diário do Alentejo” que, “apesar de não ter dados atualizados devido à pandemia”, não é essa a “perceção” de quem anda no terreno.

 

Já para João Dias, deputado do PCP eleito por Beja, os números do Baixo Alentejo não o surpreendem. O deputado comunista diz que na região “temos tido uma diminuição de médicos de família e já se teve que recorrer a clínicos reformados” para suprir as lacunas. Aponta os casos de Serpa, Aljustrel, Ourique, Beja, Ferreira e Mértola como exemplo da falta destes profissionais, sendo que, no caso deste último concelho, teve como resultado “o fecho da totalidade das extensões de saúde”.

 

O deputado do PCP lembra que a ministra da Saúde “assumiu que a situação é grave” e lembra que, por proposta do seu partido em sede de Orçamento do Estado, foram aprovadas medidas de “estímulo à fixação de médicos na periferia”, que incluem benefícios à carreira e suplementos remuneratórios para os profissionais que aceitem trabalhar no interior.

 

O PCP propôs ainda que os médicos indiferenciados, “que em 2019 eram cerca de 500”, pudessem ter um acesso facilitado a esta especialidade, de forma a corrigir esta carência, mas a proposta foi recusada, quer no Parlamento, quer pela Ordem dos Médicos.

 

Telma Guerreiro, deputada do PS eleita por Beja, disse ao “Diário do Alentejo” que a ministra da Saúde, Marta Temido, revelou durante uma audição na comissão parlamentar que o défice de médicos de família “tem uma relação direta com as aposentações” que, no último ano, atingiram a centena. Mas, para a deputada socialista, pode haver mais explicações. Desde logo, “um aumento de utentes que não usavam o serviço e que, após verem a resposta do SNS durante a pandemia aumentaram a sua confiança e se inscreveram por causa do processo de vacinação”. E, no que diz respeito a concelhos como Beja, Ferreira e Serpa, não descarta a hipótese da população imigrante também poder estar a “desequilibrar” os rácios.

 

Quanto à realidade diferenciada do Alentejo Litoral, Telma Guerreiro refere que a proximidade a Lisboa e Setúbal pode ser um fator que leva os especialistas de medicina familiar a optarem por este destino. “Há que resolver o problema das acessibilidades rodoviárias e ferroviárias, para que o Baixo Alentejo possa ter mais atratividade” para os médicos, concluiu.

 

Também Pedro Vasconcelos, presidente do conselho distrital de Beja da Ordem dos Médicos (OM), considera que a solução para o problema da falta crónica de médicos no Baixo Alentejo “passa por muito mais” do que estímulos financeiros. “É fundamental criar condições ao nível das acessibilidades, da cultura, do lazer, da educação, para que alguém decida mudar de armas e bagagens para a região”.

 

O representante da OM no Baixo Alentejo considera que o poder político “olha para a interioridade de forma leviana” e uma mudança de paradigma “é essencial para fixar as pessoas” neste tipo de território.

 

O “DA” tentou obter esclarecimentos da Ulsba sobre o aumento do número de utentes sem médico de família no Baixo Alentejo, o que não foi possível até ao fecho desta edição.

 

200 VAGAS COM INCENTIVOS

 

O Ministério da Saúde anunciou há uma semana um concurso para 200 vagas com incentivos para contratar médicos recém-especialistas para zonas consideradas carenciadas. Do total das vagas, 152 são para reforçar os hospitais com mais necessidade de médicos nos centros hospitalares do Oeste, da Cova da Beira, do Algarve, o Hospital de Évora e as Unidades Locais de Saúde do Baixo Alentejo, Litoral Alentejano, Norte Alentejano, Guarda e Nordeste, cada uma com dez vagas atribuídas, mas ainda não se sabe quais as especialidades atingidas. Na área da saúde pública, são seis os lugares a concurso, cabendo uma à Unidade Local de Saúde do Baixo Alentejo. Para os cuidados de saúde primários foram atribuídos 42 lugares, 15 dos quais para reforçar os centros de saúde de Lisboa e Vale do Tejo, a região com mais utentes sem médico de família atribuído, cerca de 600 mil, o que compara com o total nacional que, neste momento, deve rondar um milhão de pessoas.

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