Diário do Alentejo

Painel assinala 500 anos de azulejaria em Beja

20 de maio 2021 - 14:30

O quinto centenário da azulejaria em Beja foi assinalado com a inauguração de um painel de azulejos feito por alunos do curso de pintura e decoração cerâmica do Agrupamento de Escolas n.º 2.

 

Texto Rita Palma Nascimento

 

Cidade “museu” da azulejaria, Beja possui umas das mais notáveis e preservadas coleções de azulejos ‘in loco’ do país, uma tradição com 500 anos de história. Dos primeiros exemplares a chegar a Portugal, na segunda metade do século XV, destacam-se os Manises (Valência), encomendados em 1467 pela Infanta D. Brites para o já extinto Palácio dos Infantes, e os hispanos mouriscos, oriundos de Sevilha, que revestiram as paredes do Convento da Conceição.

 

No espólio azulejar da cidade encontram-se ainda painéis que testemunham a evolução e a monumentalidade desta peça de cerâmica decorativa, adaptada, ao longo dos tempos, às necessidades e estilos das diferentes épocas que, num diálogo contínuo, acrescentaram à coleção de imagens a diversidade com que o espólio de Beja se apresenta – distinto – no panorama nacional.

 

Para “honrar e assinalar” o quinto centenário da azulejaria na cidade, o Curso de Educação e Formação (CEF) de Pintura e Decoração Cerâmica do Agrupamento n.º 2 de Beja decidiu “deitar mãos à obra e criar um painel comemorativo”. Trata-se de um projeto que procura “valorizar o riquíssimo património azulejar da cidade e, ao mesmo tempo, enriquecer o espaço escolar”, oferecendo, à cidade, mais uma obra, “que testemunhe práticas pedagógicas que visam preservar a arte do azulejo”.

 

Quem o diz é Mariana Conduto, professora e coordenadora do projeto, explicando ao “DA” que os motivos geométricos da sala do capítulo do Convento da Conceição e os azulejos de Manises da coleção do Museu Regional de Beja foram o ponto de partida para o processo criativo. Contudo, revela, “foram surgindo outras referências, que testemunham os cinco séculos de história da azulejaria na cidade. Numa referência ao século XX, por exemplo, surgiu o painel com a imagem do deus Hermes que, pela sua simbologia e pela referência no logótipo do Agrupamento n.º 2 de Beja, foi também representado no projeto”.

 

A paleta de cores utilizada foi, segundo a Mariana Conduto, “cuidadosamente estudada” com o objetivo de “colorir um edifício predominante cinzento” e, ao mesmo tempo, “transmitir calor, afeto, energia, criação, destacando e valorizando o lema do projeto educativo: escola de valor que educa para os valores com afeto”.

 

TRABALHO DE “ENORME” IMPORTÂNCIA

 

“É um trabalho que assume uma enorme importância no percurso escolar destes alunos. É a pedra de fecho na construção do saber: do saber ser e do saber fazer. É preciso recuar quatro anos para se entender”, afirma Mariana Conduto, considerando que CEF de Pintura e Decoração Cerâmica, a funcionar desde 2017 na Escola Básica Mário Beirão, tem sido um “caso sério de sucesso”.

 

Desde logo, porque o público a quem se destinam estes cursos “não se revê” no currículo dito normal. “São alunos com problemas comportamentais e de baixa autoestima, a quem a escola nada diz e que, por via do estigma associado a um CEF, encaram esta saída educativa como um curso onde pouco se exige para que seja conseguido o diploma final de 9.º ano”, sublinha a professora. “Porém”, recorda, “esta linha de pensamento que, embora popular entre a comunidade, está longe de ser realista”, levou à formulação e apresentação de uma proposta à direção do agrupamento para abertura do curso. “Embora não exista, no ensino secundário deste agrupamento, o curso de artes, a direção considerou a ideia bastante interessante”.

 

“Tínhamos o público-alvo, jovens com mais de 15 anos, com pelo menos duas retenções no percurso escolar, que vinham somando insucessos”, mas também a plena convicção de que, estes alunos, “seriam capazes de, através da arte, mudar o seu comportamento e fazer aprendizagens profícuas, ainda que diferentes daquelas que um percurso académico normalizado lhes poderia proporcionar”, explica Mariana Conduto, segundo a qual, dois anos volvidos, “é possível constatar que o comportamento dos alunos se alterou e que o seu desempenho escolar melhorou”, existindo, até, entusiasmo na frequência das aulas.

 

Uma aposta ganha, garante a diretora do Agrupamento n.º 2 de Beja, Maria José Chagas, considerando que o projeto representa um importante passo para a mudança de paradigma na inclusão formativa e educativa: “[É] um CEF que prima pelo rigor, que enaltece o saber fazer e dá uma resposta honesta às necessidades dos alunos, promovendo o sucesso, diminuindo o abandono escolar, aumentando a autoestima e tornando os alunos mais felizes”.

 

Coordenado por Mariana Conduto, o projeto contou com o trabalho dos também professores do curso Jorge Simão e Simão Matos, desenvolvido no âmbito do SOS Azulejo, iniciativa que integra, anualmente, a Festa do Azulejo promovida pela Associação de Defesa do Património de Beja. A iniciativa contou com a participação dos seguintes alunos: Ana Teresa Portugal, António Pedro Guerreiro, Beatriz Rodrigues, Joana Gonçalves, Joaquim Canhoto, Margarida Horta, Miguel Charrua, Mónica Ventura, Rafael Gonçalves, Sara Peralta e Tiago Engana.

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