Diário do Alentejo

Bloco de rega Póvoa-Amareleja sem financiamento definido

17 de novembro 2025 - 08:00
Previsto incorporar projeto “Água que Une”, enquanto a obra não se efetivar “os agricultores de Moura não acreditam nas palavras dos senhores políticos”, diz presidente da CAMB

O bloco de rega Póvoa- -Amareleja, no concelho de Moura, será incluído, por falta de financiamento encontrado para a obra, no projeto “Água que Une”, de acordo com o ministro da Agricultura e Mar, em resposta a uma interpelação do deputado do PSD, Gonçalo Valente. O presidente da Cooperativa Agrícola de Moura e Barrancos revela-se cético relativamente às declarações do governante, devido aos vários constrangimentos com que os agricultores da região se têm confrontado, no âmbito das políticas agrícolas, nomeadamente, de regadio, presentes na região.

 

Texto | José SerranoFoto | Ricardo Zambujo

 

Na recente audição do ministro da Agricultura e Mar, o deputado do PSD eleito por Beja, Gonçalo Valente, referindo na abertura da sua intervenção que o assunto “não é novo” mas que dada a sua “importância social e económica” para a região não pode ser deixado “cair em esquecimento”, interpelou o governante acerca do “ponto de situação” em que se encontra o bloco de rega Moura-Póvoa--Amareleja, projeto que tem como proponente a Empresa de Desenvolvimento e Infraestruturas de Alqueva. Referindo, de antemão, que o anterior governo do Partido Socialista “desperdiçou”, para a sua construção, “o empréstimo do Banco Europeu de Investimento de 127 milhões de euros” e que o bloco de rega de Moura sofreu “uma área revista de mil e 200 hectares”, o deputado social-democrata questionou José Manuel Fernandes sobre se se equaciona a “redução de área” do bloco de rega Póvoa-Amareleja, a previsibilidade do início da sua construção e acerca da sua fonte de financiamento. “Não basta este ser um território que tem dois terços da sua área em Rede Natura 2000, com proibições à prática de uma agricultura sustentável em termos sociais e económicos, continuamos impossibilitados de potenciar e criar riqueza nas zonas fora desta área restrita”, salientou Gonçalo Valente, resumindo, no final, a sua intervenção a uma única questão – “Em que situação se encontra o processo deste bloco de rega, fundamental para o desenvolvimento da região do Baixo Alentejo e forte impulsionador de coesão territorial?”.À pergunta, de acordo com o deputado, em declarações ao “Diário do Alentejo”, o ministro respondeu que, faltando ainda encontrar financiamento para a obra, está previsto que o bloco de rega citado possa vir a ser incorporado no projeto “Água que Une”, apresentado pelo Governo, em março passado, como “um compromisso nacional para garantir uma gestão mais eficiente, resiliente e inteligente dos recursos hídricos em todo o País, conciliando as necessidades da agricultura, do ambiente e da população”.Perante estas alegadas incertezas, José Duarte, presidente da Cooperativa Agrícola de Moura e Barrancos (CAMB), adianta as suas considerações sobre o assunto. “O que sabemos é que o bloco de rega Póvoa-Amareleja ainda está em fase de projeto e que aquando da apresentação do ‘Água que Une’ este bloco não se encontrava ali contemplado. Sabemos, também, de acordo com as últimas informações que temos, que se prevê que o bloco de rega de Moura arranque no primeiro trimestre de 2026…” Contudo, acrescenta, “o ministro da Agricultura, quando esteve na nossa cidade, no aniversário da CAMB, em setembro de 2024, disse que o arranque da obra seria no início de 2025, para estar concluída na campanha de regadio de 2026. Mais uma vez, os prazos estipulados não foram cumpridos – e isto já parece uma novela mexicana, pois desde 2018, que nos é prometido a construção destas infraestruturas [bloco de rega de Moura e bloco de rega Póvoa-Amareleja]”.No âmbito do coletivo que representa, a indignação manifestada por José Duarte, face à incapacidade de se cumprirem, efetivamente, as previsibilidades temporais estipuladas, leva-o a declarar: “Neste momento, e enquanto não tivermos as construções dos blocos de Moura e Póvoa-Amareleja concluídas, essenciais para que haja uma renovação geracional de agricultores e para que haja rendimento, os agricultores de Moura não acreditam nas palavras dos senhores políticos”.No entanto, a indignação declarada vai para além dos prazos incumpridos. “Não nos podemos esquecer que quando foi apresentada a construção destes dois blocos a área inicial [a ser regada] era de 10 mil hectares. Neste momento, há uma redução de 25 por cento dessa área inicial, ou seja, passou-se para 7500 hectares, e desta existe apenas verba para avançar com a obra relativa ao bloco de Moura, que abrangerá 1200 hectares – o que corresponde a 12 por cento daquilo que era a área inicialmente prevista”.Por estes constrangimentos, o presidente da CAMB expõe o sentimento presente na região por parte do setor, pela existência, no Alentejo, “de agricultores de ‘primeira’ e de ‘segunda’, a exemplo, nestes últimos, “dos de Moura, de Póvoa [de São Miguel] e de Amareleja’”, marginalizados “que têm sido” pelas forças políticas ao longo dos anos. “É inadmissível que a água do Alqueva vá, praticamente, até ao litoral do País, que vá para o sul de Espanha, que regue todo o Alentejo e que os nossos agricultores, com propriedades coladas ao grande lago, não tenham regadio. Isto é um convite ao abandono deste nosso interior, cada vez mais desfavorecido, nesta zona raiana de Moura e de Barrancos, tendo nós todas as condições – clima, água, excelentes solos – para fixarmos jovens e gente qualificada, aptos para exercerem uma agricultura sustentável, em termos ambientais e económicos, capaz de gerar valor”.Se tudo persistir, diz o presidente da CAMB, não se cumprindo a promessa, “muito apregoada em campanhas eleitorais”, de uma verdadeira coesão territorial, capaz de reforçar “a população no interior”, através da construção de infraestruturas capazes de providenciar rendimento e emprego sustentável e qualificado, as terras – “isto só é rentável com regadio” – acabarão por ser abandonadas. “Há muita promessa, muita expectativa, mas, depois, para se cumprir e para se ver ‘obra feita’ leva-se muitos anos. Isto não pode acontecer, porque arriscamo-nos a, qualquer dia, não termos agricultores, a que este território venha a ser um deserto”, sublinha José Duarte.

Comentários