Diário do Alentejo

Odemira: Identificados mais de 100 alojamentos sem condições

20 de maio 2021 - 10:40

As autoridades já identificaram mais de 100 alojamentos para trabalhadores agrícolas no concelho de Odemira, onde vivem mais de 300 pessoas, em situação de sobrelotação ou insalubridade.

 

“Estamos perante uma situação já identificada de mais de uma centena de lugares”, pelo que a resolução do problema “é um trabalho que levará algum tempo”, afirmou o presidente da Câmara de Odemira, José Alberto Guerreiro, acrescentando que à medida que as vistorias se vão realizando “muitas pessoas têm ajustado a sua condição e muitos arrendatários têm inclusivamente reorganizado os espaços”.

 

José Alberto Guerreiro disse acreditar que, na sequência das vistorias e da visibilidade que tem sido dada aos problemas sociais, “alguns espaços” de alojamento vão voltar a “ter a condição natural de que já dispunham”, isto é, vão deixar de estar sobrelotados. Admitindo que “não será possível realojar todas as pessoas nesta fase”, o autarca considerou que a criação de melhores condições de habitabilidade para os trabalhadores terá que ter “uma articulação especial” entre empregadores e entidades.

 

Segundo José Alberto Guerreiro, “a realidade” da habitação em Odemira alterou-se nas últimas semanas, o que justificou com “o abandono do território” por parte de “alguns dos grupos que operavam na situação da legalização de cidadãos que tinham o objetivo de chegar ao espaço Schengen”. “Isso é perfeitamente claro e julgo que foi um processo que libertou imensos espaços de habitação”, admitiu, vincando que este “negócio” rendia “tanto a tanta gente” que era difícil que os espaços ficassem disponíveis para arrendamento.

 

Para o presidente da Cáritas Diocesana de Beja, Isaurindo Oliveira, “há uma certa passividade” quanto à situação dos migrantes, existindo “muitos casos de violação dos direitos humanos”, com tráfico de pessoas e exploração laboral no setor agrícola.

 

“Principalmente no Alentejo, na zona de Beja, nos últimos cinco a seis anos, houve um ‘boom’ muito grande de chegada de mão de obra, com o desenvolvimento do Alqueva, com o desenvolvimento das culturas permanentes”, lembrou o presidente da Cáritas de Beja, referindo que os problemas com o acolhimento dos trabalhadores migrantes na agricultura são “de toda a ordem” e “de difícil solução”, em particular os relativos à habitação pois a oferta é escassa no distrito de Beja, pelo que os migrantes ficam sujeitos a soluções “manobradas pelos angariadores de mão de obra”.

 

“Há depois as pessoas menos escrupulosas que têm um casebre qualquer e que alugam e, muitas vezes, isso é alugado à cabeça, […] alugam uma casa qualquer sem condições que está desabitada, mas como tem um teto, isto é utilizado, é uma maneira de negócio”, explicou o presidente Isaurindo Oliveira, referindo que o problema existe há anos, mas continua por resolver, até porque “o próprio Serviço de Estrangeiros e Fronteiras não pode entrar nessas casas”.

 

Sobre a falta de condições de habitação e de sobrelotação, o dirigente da organização humanitária considerou que em Beja “há uma certa passividade” quanto à situação dos migrantes, porque “toda a gente sabe que as condições de salubridade são escassas, que as condições de segurança muitas das vezes são escassas, mas depois as pessoas têm de viver”.

 

Responsável pelo Centro Local de Apoio à Integração dos Migrantes (Claim) de Beja, a Cáritas assume um trabalho que abrange os municípios de Aljustrel, Ferreira do Alentejo, Cuba, Alvito e Vidigueira, isto porque os restantes territórios têm outros Claim, inclusive Odemira com a participação da Taipa - Organização Cooperativa para o Desenvolvimento Integrado. “Os problemas são tantos, tão complicados muitas das vezes, que é evidente que tudo isto que a gente faz, como costumo dizer, ‘não é mais do que uma pequena cócega num pelo dobrado'”, declarou o presidente da Cáritas, contabilizando cerca de 1.500 migrantes atendidos no Claim de Beja ao longo dos dois anos de funcionamento.

 

“Esperamos que os migrantes venham ter connosco, não temos nem autoridade, nem permissão, nem nada, por exemplo para poder ir junto dos agricultores, junto das explorações agrícolas, onde poderíamos ter mais algum contacto. Aquilo que fazemos na maior parte dos casos é dar um ‘analgésico’, é resolver um problema pontual, porque depois o problema de fundo continua na mesma”, concluiu.

 

FIM DA CERCA SANITÁRIA

 

A cerca sanitária nas freguesias de São Teotónio e Longueira-Almograve, no concelho de Odemira foi levantada às 00:00 horas da passada quarta-feira, dia 12, na sequência de uma diminuição “muito significativa” das cadeias de transmissão de covid-19. “O levantamento da cerca não resolve o problema de Odemira, nem das freguesias, mas esperemos que comece uma nova etapa, que seja feita uma retrospetiva do que aqui se passou”, disse a presidente da Junta de Freguesia de Longueira-Almograve, Glória Pacheco. “É necessário que os prejuízos sejam compensados”, acrescentou o presidente da Câmara.

 

CONSEQUÊNCIAS POLÍTICAS

 

O primeiro-ministro considerou que se, no início do próximo ano, regressar a Odemira e já observar trabalho feito para “habitação condigna” de trabalhadores agrícolas, isso significará que o Governo retirou “as devidas consequências políticas” da atual situação. António Costa afirmou que o Governo terá “bons motivos” para poder dizer “com orgulho” que tirou “as devidas consequências políticas” da situação de Odemira, se, no início de 2022, voltar à vila para “ver já concluído este trabalho da habitação para trabalhadores sazonais” e a “avançar a execução dos trabalhos necessários para habitação condigna” para todos os residentes. “Tirar as devidas consequências políticas de um problema é simplesmente uma coisa: é resolver o problema. Essas são as consequências políticas de quando há um problema”, sublinhou o chefe do Governo que discursava no Cineteatro Camacho Costa, em Odemira, depois de terem sido assinados acordos entre associações representativas de empresas agrícolas, Câmara e Governo para a criação de condições habitacionais para trabalhadores agrícolas.

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