Diário do Alentejo

Covid-19: Hospital de Beja espera "dias difíceis"

16 de janeiro 2021 - 18:15

Ao contrário do que se verificou nos primeiros meses de pandemia, em que o Alentejo era a zona do país com o menor risco de transmissibilidade para a covid-19, neste momento, a região enfrenta um grave problema: Os números de infeção pelo novo coronavírus não param de aumentar. No hospital de Beja esperam-se dias ainda mais difíceis.

 

Texto Marta Louro

 

O “milagre” alentejano de resistência à covid-19 terminou. Em dezembro e nos primeiros dias de janeiro, os números da pandemia agravaram-se de forma substancial na área da Administração Regional de Saúde do Alentejo (ARSA). Neste período, o número de vítimas mortais (217) é praticamente o dobro do registado nos oito meses anteriores. Há agora uma média diária de 330 novos casos, muitos deles em lares de idosos. O que faz antecipar “dias difíceis” nas unidades de saúde.

 

Recordando que se trata de uma doença “altamente contagiosa”, a presidente do conselho de administração da Unidade Local de Saúde do Baixo Alentejo (Ulsba), Conceição Margalha, refere que o aumento exponencial de casos “está relacionado com a deslocação e movimentação de pessoas entre vários locais e regiões”, durante o período de Natal. “Os próximos dias vão ser muito difíceis, porque tem havido muitos casos diários e isso leva ao aumento do número de internamentos e de necessidades de cuidados médicos”. Como consequência, o sistema de saúde está “completamente subcarregado”.

 

Segundo Conceição Margalha, o hospital de Beja já aumentou a capacidade de resposta a doentes covid-19. “Passámos de 24 camas na zona de internamento covid-19 para 30, e na unidade de cuidados intensivos passámos a dispor de oito, em vez das anteriores quatro”.

 

Pedro Vasconcelos, presidente do conselho sub-regional de Beja da Ordem dos Médicos, defende que estes valores de infeção e de mortalidade relacionados com a covid-19 “poderão estar relacionados com algum relaxar, por parte das pessoas, que ao fim de muitos meses de pandemia terão sentido uma necessidade de esquecer um bocadinho as medidas de prevenção de contágios”.

 

“Com a abertura que houve no Natal, as pessoas não tomaram as devidas precauções, e isso possivelmente justifica este aumento de casos”, acrescenta Pedro Vasconcelos, antecipando um “agravamento” da pressão sobre os serviços de saúde até que se façam sentir os efeitos do confinamento geral decretado esta semana pelo Governo.

 

“Neste momento, muitos surtos, grande parte deles, são em lares, e o que acontece é que, de repente, ficamos com 50 ou 60 pessoas infetadas. Se contabilizássemos todos os casos relacionados com lares, provavelmente encontraríamos aí a resposta para grande parte deste aumento do número de novos casos”, sublinha o presidente da ARSA, José Robalo. “Associados a esses utentes, existem também os colaboradores das instituições de apoio social, que acabam por refletir esse seu contágio não só internamente, nos próprios lares, como muitas vezes fazem também a ligação com o exterior. Por esse motivo, os lares tem sido uma preocupação enorme”, acrescenta.

 

Reconhecendo igualmente a existência de um aumento do número de casos na comunidade, até porque, desde o início do ano, o risco de transmissibilidade (Rt) tem estado sempre acima de 1,2 no Alentejo, José Robalo sublinha que são os lares que constituem a “grande preocupação” das autoridades de saúde. “O mais importante é alertar as pessoas que, independentemente da vacinação, que numa fase inicial está a realizar-se essencialmente nos lares e nas unidades de cuidados continuados, devem seguir os cuidados recomendados pela Direção-Geral de Saúde. As pessoas às vezes facilitam e, quando o fazem, há habitualmente novas infeções. Se não tivermos esses cuidados continuamos a aumentar a probabilidade de transmissão da doença”, lamenta.

 

O presidente da ARSA não tem dúvidas de que a situação se irá agravar nas próximas semanas. “Não vemos nenhuma tendência de diminuição do número de novos casos, pelo menos para os próximos dias. Vamos continuar a ter um aumento significativo de infeções”.

 

Trata-se de uma perspetiva partilhada por Francisco George, presidente da Cruz Vermelha Portuguesa e antigo diretor-geral de Saúde. “O aumento significativo de casos no Baixo Alentejo representa uma grande preocupação, sobretudo pelo facto de se tratar de uma região onde, em termos percentuais, o envelhecimento populacional é grande. Muitas destas pessoas necessitam de cuidados de proximidade, nomeadamente, apoio domiciliário e cuidados de saúde regulares e a doença provocada pelo novo coronavírus veio intensificar estas necessidades. Por estas razões, há que desenvolver um plano especial que tenha em atenção as características da população local”, refere.

 

Segundo Francisco George, “inicialmente, a reduzida atividade viral acompanhou a reduzida densidade populacional” da região, protegendo-a durante a primeira vaga da pandemia. “Uma das explicações para este aumento do número de infeções poderá estar relacionada com o hábito dos alentejanos se juntarem em serões de convívio nas adegas típicas, onde constantemente se ouvem as modas do Cante. Esta tradição, quase sempre, não respeita as normas de segurança, nem em termos de distância física nem no uso de máscara”.

 

ESTRUTURA DE APOIO OPERACIONAL NA BASE DE BEJA

 

Dezanove estruturas de apoio de retaguarda (EAR), criadas no âmbito do combate à pandemia de covid-19, já estão operacionais em todo o território nacional, com uma capacidade máxima instalada para 1.950 utentes. Uma destas estruturas funciona na Base Aérea n.º 11, em Beja.

 

De acordo com o Ministério da Administração Interna (MAI), a criação destas estruturas visa garantir o apoio a pessoas infetadas com o novo coronavírus sem necessidade de internamento hospitalar e, também, a utentes de lares para pessoas idosas que careçam de apoio específico fora das respetivas instalações.

 

Em novembro do ano passado, a secretária de Estado da Administração Interna, Patrícia Gaspar, disse que “o grande objetivo é aliviar de alguma forma as camas nos hospitais” através da retirada das unidades hospitalares de “pessoas que efetivamente não precisam de lá estar, mas que por algum motivo estando infetadas não podem ficar em casa”.

 

Segundo o MAI, cabe a cada Administração Regional de Saúde, em articulação com o hospital da área de referência, disponibilizarem médicos e enfermeiros para acompanharem as pessoas instaladas.

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