Diário do Alentejo

Associativismo popular: esperança e dificuldades

05 de junho 2020 - 12:00

Há cerca de 2.570 coletividades populares nos distritos de Beja (1150), Évora (850) e Portalegre (570), abarcando milhares de pessoas e, de um modo geral, as populações. Devido à pandemia de covid-19, as atividades estão paralisadas desde março e os prejuízos são elevados. A Confederação Portuguesa das Coletividades de Cultura, Recreio e Desporto pede mais apoio das autarquias e do Governo.

 

Texto Carlos Lopes Pereira

 

“Como em todo o País, também no distrito de Beja a pandemia de covid-19 continua a afetar o associativismo popular. Além do encerramento das sedes, foram canceladas as atividades que estavam programadas. Muitas delas davam um significativo suporte financeiro ao orçamento anual, complementar às quotas dos associados e aos apoios institucionais. E, no caso de algumas coletividades que tinham um ou outro trabalhador, não vai ser fácil continuar a manter essa situação”.

 

A síntese é feita por José Baguinho, da direção da Federação Distrital de Beja, estrutura da Confederação Portuguesa das Coletividades de Cultura, Recreio e Desporto (Cpccrd): “Não temos ainda um balanço exaustivo, mas de março a maio foram dezenas de iniciativas que não se realizaram. Por exemplo, as coletividades têm um papel ativo nas comemorações do 25 de Abril, nas feiras, nos desfiles etnográficos ou históricos e tudo foi cancelado, assim como no desporto. Foram milhares de euros de prejuízo”. 

Existem no distrito de Beja centenas de coletividades de recreio, da cultura e do desporto, abarcando milhares associados, que nas cidades, vilas e aldeias desenvolvem atividades em prol da população. “O associativismo popular tem um papel importante no aglutinar das pessoas em torno de necessidades comuns. Em muitas localidades do distrito de Beja, é o movimento associativo, parceiro importante do poder local, que organiza as festas locais, promove a cultura, dinamiza o desporto. Em alguns casos, o único espaço de que a população dispõe para conviver é a sede da associação – é o ponto de encontro. Fecharam o posto médico, a junta de freguesia, os correios, as lojas, mas as coletividades mantêm a sua presença”, lembra José Baguinho.

 

Quanto à reabertura das sedes e ao recomeço das atividades associativas, “isso dependerá das medidas de desconfinamento” em curso, mas há o receio de que nos próximos tempos “será tudo muito condicionado”: “Os santos populares, com a realização de mastros populares e marchas em junho, os bailes, as festas de verão – mais de uma centena por todo o distrito – dificilmente se realizarão, pelo menos nos moldes habituais. Desporto associativo, filarmónicas, grupos de teatro, quase tudo está parado”.

 

Presidente do Centro Social, Cultural e Recreativo do Bairro da Esperança, na cidade de Beja, José Baguinho fala da situação da coletividade: “A pandemia fez com que tivéssemos de cancelar a atividade cultural e recreativa. Porque também somos uma IPSS, mantivemos o serviço de refeições e outros apoios pontuais a utentes e associados. Fechamos a creche ‘O Espaço é teu’, que promovia atividades juvenis, e o ‘Espaço Sénior’, para os mais idosos”.

 

Os apoios não têm faltado: “Tomámos medidas para controlar os impactos financeiros, tivemos apoios da Câmara de Beja para o pagamento da água e um reforço no subsídio anual. A União das Freguesias de Beja (Salvador e Santa Maria) também nos tem apoiado e, felizmente, recebemos por completo o valor dos acordos com a Segurança Social”.

 

Quanto à retoma, existem ainda muitas incógnitas: “A creche reabriu no dia 18, com um número reduzido de crianças. Esperamos que tudo corra bem e que em junho haja condições para estarmos a funcionar em pleno. Em relação a atividades com a população, com os jovens e os idosos, ainda não sabemos o que irá acontecer. Mas temos de encontrar as melhores formas de ultrapassar a presente situação, o que não é fácil”.

 

À ESPERA DA RETOMA

“Com os dados disponíveis, neste momento, podemos calcular por baixo um prejuízo de 2103 euros em média por cada coletividade em dois meses (março e abril), faltando ainda recolher indicadores associativos com base nos resultados contabilísticos a aprovar, os quais, naturalmente, farão subir aquela média”. A estimativa é de Victor Carapinha, da direção da Cpccrd e coordenador do seu Gabinete Sul, com sede em Beja e cobrindo os distritos de Portalegre, Évora, Beja e Faro.

 

Faz notar que as atividades culturais, recreativas e desportivas foram todas suspensas ou canceladas, entre março e maio: “Em geral, ficaram todas pelo caminho, uma vez que o associativismo parou as atividades e encerrou as sedes em março. Considerando apenas uma média de três ações associativas por coletividade, estaremos em presença de cerca de 7710 iniciativas canceladas em definitivo, sendo menor o número de eventos recuperáveis”, realça.

 

Segundo Victor Carapinha, a retoma gradual das atividades vai depender da decisão do Governo e da Direção-Geral da Saúde quanto ao desconfinamento, e esse recomeço não deverá ocorrer antes de 31 de maio. Por sinal, quando se comemora o Dia Nacional das Coletividades.

CONFEDERAÇÃO PEDE MAIS APOIO

A Confederação Portuguesa das Coletividades de Cultura, Recreio e Desporto (Cpccrd) apresentou ao Governo e às autarquias um plano que ajude o movimento associativo a retomar as atividades, paralisadas devido à pandemia de Covid-19. Há 30 mil coletividades no País e a confederação estima que entre 15 de março e 30 de abril tenham sido “suspensas, adiadas ou anuladas mais de 120 mil atividades, que envolveriam cerca de três milhões de participantes”.

 

Num documento enviado ao presidente da República, ao primeiro-ministro, à Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP) e à Associação Nacional de Freguesias (Anafre), a Cpccrd avalia que o encerramento “a 100 por cento” das sedes de associações e clubes, em março, abril e maio, “tenha um impacto negativo” de cerca de 395 milhões de euros.

 

A Cpccrd, em nome do Conselho Nacional do Associativismo Popular (CNAP) reclama dos municípios um conjunto de apoios, que vão desde subsídios para despesas de funcionamento até ao reforço extraordinário de verbas, passando pela isenção de pagamento de IMI ou a cedência gratuita de máscaras e desinfetantes. Ao Governo pede uma linha de crédito para as coletividades com trabalhadores a cargo, o acesso ao lay-off dos trabalhadores das coletividades, isenção do IRS até 30 mil euros e IVA reduzido (seis por cento) nos espetáculos associativos com entradas pagas, entre outras medidas.

Comentários