Diário do Alentejo

Crónica de Florival Baiôa: "Os jovens rebeldes e 'sus manitas de plata'"

28 de maio 2023 - 14:00
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Lembram-se da Maria Santos, a bejense que soube tão bem reintroduzir a criação da cerâmica e que, com ela, trouxe algumas dezenas de outras a experienciar a frescura e a moldagem do barro?

 

Faleceu cedo demais. A sua última mensagem deixou ecos e saudades, coisas que ficaram na memória e em peças artísticas espalhadas pelas discípulas e pela cidade. Hoje, assim como no seu tempo, existem mãos perfeitas de qualidade ceramista na cidade e, se calhar, são mais do que aquelas que pensamos ter.

 

Basta olhar para o Heitor Figueiredo, ceramista contemporâneo de reconhecido valor internacional e que tem exposto pelo País e pelo estrangeiro, e que, felizmente, é bem recebido por todos nós pela criatividade e qualidade das suas obras. Mas este parece que não estará só na preciosidade desta arte popular e contemporânea. Seguem--lhe os passos as experiências de um curso iniciado há seis anos na Escola Mário Beirão, de Beja, na área da pintura e decoração cerâmica.

 

O curso de Educação e Formação, coordenado pela professora Mariana Conduto, conseguiu emergir nos alunos as suas qualidades artísticas, em jovens que, sem sucesso na escola, viram no barro novos caminhos de vida. Têm todas as formas e feitios, estes moços e moças, que assim conseguiram concluir o seu 9.º ano. Quem os viu e quem os vê entusiasmados; muitas vezes nem no intervalo se deslocam ao pátio para darem continuidade à sua obra e o silêncio é o reino da concentração.

 

Parecem ter uma vida bipolar, uma na rua e outra na sala de aula, onde pegam no barro e nas tintas, massajam o barro em forma final, deixam secar, levam-na ao forno, pintam e vidram para ir de novo ao forno, uma autêntica oficina de bem-fazer peças que podem perdurar no tempo e nas nossas casas.

 

Desta desenvoltura mental e qualidade manual saem e saíram, de dois em dois anos, peças que poderão competir com as outras que todos os dias vemos nas galerias e exposição nacionais e estrangeiras. Acabado o curso e a despedida é sempre de grande frustração e desgosto. Voltarão às ruas e a sua vida continuará como antes, sem rei nem rumo, pois não temos sabido oferecer-lhes um futuro na cidade para que por cá permaneçam e enriqueçam a arte e levem o nome da cidade para o todo nacional.

 

Teremos de ser nós, adultos, a criar uma política de fixação de jovens na região e dotá-la de projetos criativos e sustentáveis, com instalações e devidas condições de trabalho para que Beja seja, efetivamente, uma cidade criativa, ao lado de muitos outros que se espalham pelas ruas quase despovoadas de gente.

 

A AdpBeja, Associação para a Defesa do Património de Beja, já propôs e espera atingir o objetivo de, conjuntamente com outros parceiros institucionais, criar um centro de produção cerâmico cujo nome poderia ser Centro Ceramista de Beja | Maria Santos.

 

Isto, sim… seria de valor.

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