Diário do Alentejo

Silvestre Raposo: A Casa-Museu é “um legado que quero deixar”

03 de março 2022 - 12:30

Texto Luís Miguel Ricardo

 

Silvestre Luís Varela Raposo nasceu há 70 anos em Vila Nova de São Bento, concelho de Serpa. Estudou em Moura até à conclusão do ensino secundário, altura em que rumou para a capital do território, onde o esperava um novo grau académico e uma nova casa para prosseguir o desenvolvimento de saberes, a Faculdade de Belas Artes da Universidade de Lisboa.

 

Homem formado artista, colecionou participações no universo desportivo e cultural, um envolvimento explicado pela vontade que sempre teve de querer aprender de tudo um pouco e de partilhar o que aprendia. E foi nessa ânsia de saber, nessa ânsia de novas experiências, que se tornou membro do Conselho Pedagógico da Faculdade de Belas Artes da Universidade de Lisboa; que assumiu cargos noutras coletividades; que foi professor do Ensino Superior, no INUAF (Instituto Superior Dom Afonso III), em Loulé; que se tornou diretor das galerias municipais de Moura e Mourão; que assumiu o cargo de assessor para a Cultura, no Governo Civil de Beja; que criou e ajudou a criar vários prémios de Arte em Moura, Serpa e Salvaterra de Magos; que realizou múltiplas exposições; e que ganhou diversos prémios em concursos nacionais de escultura, pintura e fotografia.

 

Do seu amplo e longo percurso artístico, destacam-se: a autoria de quatro monumentos de arte pública em Vidigueira, Messines, Salvaterra de Magos e Mértola; a autoria de 16 peças em espaços públicos, museus e galerias; e centenas de pinturas em coleções particulares. E nesta indagação pelo universo criativo de Silvestre Raposo, há ainda a referir o facto de ter sido um dos autores convidados para a Expo “dos 25 anos do 25 de Abril”, que teve lugar em Bobygni- Paris, assim como a participação nos encontros de poetas da Galiza, onde foram editados dois, dos nove livros publicados.

 

Como se autocaracteriza o artista Silvestre Raposo?

Caracterizo-me como alguém que faz pesquisa e que é um criador, que em separado pensa o que vai produzir e partilhar, quer seja na escultura, pintura ou na escrita, pois em todas elas há sempre uma mensagem através de vários simbolismos.

 

Quando e como foi descoberta a vocação para a arte?

Desde criança, com desenhos e pinturas na escola primária. Influências, só mais tarde, com a descoberta dos grandes escultores e pintores dos vários movimentos. No entanto, tentei sempre uma procura constante, não ficando preso a um estilo único, por achar que isso mata a criatividade.

 

Que papel desempenha o Alentejo no percurso artístico de Silvestre Raposo?

O Alentejo é sempre o que temos na alma e que nos transmite a nossa forma de ser e de pensar. Ele é a nossa identidade.

 

Dos trabalhos desenvolvidos ao longo da carreira, alguns que tenham sido mais marcantes?

Os monumentos dedicados: à paz na Palestina”, em Vidigueira; e à paz entre os Povos, em Messines. São estes os mais marcantes, quer pela obra em si, quer, em especial, pelo seu significado.

 

Como são identificadas as temáticas alvo de criação artística?

Os referentes são variáveis. Se trabalhamos sobre algo que nos foi pedido, como o caso dos monumentos, ou se é livre. Se é livre, há conceitos de liberdade e de pensamento poético simbólico que estão presentes, quer num abstrato ou num figurativo e, por vezes, até numa simbiose dos dois.

 

Que opinião sobre o universo artístico em Portugal e no Alentejo?

Há novos valores e bons. Alguns somos amigos com proximidade. Todos trabalhamos num universo difícil e adverso, porque a cultura está a ser relegada para segundo plano. A chamada comunicação social ao nível das televisões, promove o que dá audiências, ou seja, dinheiro, e aí reside a imbecilidade, a miséria moral, a degradação do nível com a piada parva, onde fritar uns carapaus ou estrelar um ovo é uma obra de arte e se tornam notícia de topo. Preferem o entretenimento sem conteúdo, ou com a dor dos outros, do que falarem com artistas e procurarem saber mais dos seus trabalhos. A cultura é a história de um povo. Um povo sem história não existe.

 

Como foi vivido este período de “stand by” no mundo?

Trabalho menos, mas continuo a criar para um projeto de futuro próximo. Quanto a exposições, a última foi em Beja, no Centro Unesco, entre julho e agosto, e não haverá mais alguma.

 

Que sonhos artísticos moram em Silvestre Raposo?

Sonhos de um mundo mais culto, porque, se mais culto, menos enganado será, mais fraterno, com menos ambições e ostentações, onde os valores culturais possam ajudar a criar uma sociedade melhor. É importante passar do ver para o fazer.

 

O que está na “manga” a curto e médio prazo?

O Projeto atual é a Casa-Museu Silvestre Raposo, em Vila Nova de S. Bento, numa parceria com a Junta de Freguesia e a Câmara. O projeto abrange não só a exposição permanente de obras de mais de 40 autores, como exposições temporárias prémios, concursos e outras atividades. Um projeto que, a seu tempo, será divulgado. Será uma Casa-Museu única, porque será ativa, com programação, e que albergará não só obra do autor, como é frequente noutras casas museu, mas também obras de grandes nomes das Artes. Será um legado que quero deixar à terra onde nasci.

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