Diário do Alentejo

Crónica de Vanessa Schnitzer: Harmonizar

04 de agosto 2021 - 17:10

Vinho é simultaneamente tradição, cultura, emoção e prazer. Mas poucos conseguirão imaginar o vinho sem a alavanca formal e informal da gastronomia. Por outro lado, o vinho é um alimento demasiado sério para ser consumido de qualquer maneira. A seleção do néctar e a temperatura com que é servido depende o sucesso ou o insucesso de uma refeição, o deleite ou a frustração de uma ocasião especial.

 

Em geral, o vinho está cada vez mais na moda e tornou-se quase um produto ‘very trendy’, de múltiplos e variados usos, sendo que o seu consumo não se limita apenas a celebrar determinados momentos e encontros. Para além do prazer de o beber isoladamente, o vinho é também interessante como aperitivo, estimula o apetite antes da principal refeição e também eleva os sabores do bom repasto.

 

Falar de sabores nacionais é falar também de harmonização dos vinhos com a gastronomia. Portugal tem inúmeros sabores e paladares endógenos, logo, diversas formas de emparelhar o vinho com a culinária. A excelência/diversidade da nossa gastronomia tem uma "dívida de glorificação" para com a nossa história que depende dessa inquebrantável aliança com a bebida eterna de Dionísio.

 

As nossas gentes, a nossa cultura, os nossos costumes têm de ser forçosamente honrados e celebrados nos nossos pratos. Este casamento enogastronómico poderá ser difícil de gerir, já que nem sempre é fácil saber se o par que escolhemos é o ideal. Um mau vinho pode estragar a melhor refeição. O contrário já não é tão válido, embora uma má refeição nos possa impedir de entender o vinho e de apreciá-lo em toda a sua plenitude. O importante é conseguir que o vinho e o alimento ganhem com a associação e que ambos proporcionem mais prazer juntos do que se forem consumidos separadamente.

 

É importante perceber que os pontos fortes de determinado vinho irão ser potenciados com um prato imponente, em que esta dupla joga no palco dos nossos sentidos para fazer conjugações e ‘pairings’ cromáticos. A restauração tem aqui uma grande responsabilidade como veículo transmissor de uma cultura e de um saber, para nos levar a reconhecer o nosso passado e a descobrir pontes com o futuro. Os restaurantes não servem só para comer e beber mas também para aprender.

 

Escrevo que "gostos discutem-se" e gostava que isto fosse entendido como uma ‘boutade’ que, significasse algo mais que o seu sentido literal: que os cânones estéticos, além dos gostos de cada um, não são definitivos, que variam, que se educam, se discutem. Em arte, nada é absoluto. Felizmente!

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