De origens modestas – a mãe era cabeleireira, o pai vigiava as fronteiras enquanto cabo da Guarda Fiscal –, Paulo Estevão nasceu em Serpa em 1968. Aos 10 anos foi estudar para o seminário de Beja, cidade onde fez o liceu. Concluído o ensino secundário seguiu para a Universidade de Évora, licenciou-se em História com o objetivo de ser professor. As “muitas dificuldades de co- locação” nas escolas de Portugal continental levaram-no a concorrer para os Açores, onde havia falta de docentes. Foi colocado na Terceira, em 1995. Depois, a mulher, também ela professora e antiga colega de universidade, seguiu-lhe os passos. Passou pelo Pico. E no ano 2000 conseguiu, finalmente, um lugar no quadro de escola. Vive há 19 anos na ilha do Corvo.
“Não tive quaisquer dificuldades de adaptação. É uma ilha com características muito especiais porque tem poucos habitantes, todos se conhecem e ainda há um grande conjunto de atividades comunitárias, não só nas festas, como acontece no Alentejo, mas até em tarefas relacionadas com a agricultura. Por vezes chego a casa e tenho à porta um saco de bata- tas ou de laranjas e só passados alguns meses é que venho a saber quem as ofereceu. É uma sociedade muito semelhante àquela em que eu cresci nas décadas de 60 e de 70, quando havia uma interação social muito grande”, conta Paulo Estevão, entrevistado pelo “Diário do Alentejo” em Beja, depois de mais uma das habituais visitas à casa que mantém em Serpa e por onde faz questão de passar várias vezes ao longo do ano.
Não é de estranhar que seja o único alentejano residente no Corvo, ilha onde vive com a mulher e os dois filhos. Por ali todos o conhecem. E o facto de ser monárquico valeu-lhe uma alcunha, “o rei”, bastante utilizada quando pelo meio surge uma partida de cartas: “Quando sai um rei até dizem, por graça, olha um ‘Estevão’ de copas, ou de ouros, e dizem-no mesmo na minha presença”.
Não sendo rei, foi presidente nacional do Partido Popular Monárquico entre 2010 e 2017, sucedendo a Nuno da Câmara Pereira, depois de ser ter zangado com Paulo Portas e abandonado o CDS. É o único deputado monárquico entre os 57 que compõem a Assembleia Regional dos Açores. Não foi fácil lá chegar. Primeiro teve de organizar o partido na região. Depois apresentou-se a votos e somou derrotas nas eleições de 2000 e 2004. Em 2008 chega, finalmente, ao parlamento, empenhando-se desde então em fazer a “vida negra” ao governo regional de maioria socialista. Só de uma assentada foram 12 dias em greve de fome.
“Fui presidente do conselho executivo da escola do Corvo entre 2000 e 2008. A escola tem poucos alunos, menos de 60, mas eram os únicos no País que não tinham acesso a refeição escolar. Apresentei várias iniciativas para corrigir essa injustiça, sem- pre com a oposição do PS. A única solução foi mesmo fazer greve de fome e a verdade é que, neste mo- mento, os alunos do Corvo já têm refeições escolares e já foi aprovada outra iniciativa para alargar essas refeições ao pessoal docente e não docente”, conta Paulo Estevão, recordando que mesmo depois de o parlamento ter aprovado a abertura da cantina o projeto tardava em concretizar-se. Foi por essa altura que ao ver o filme “Três Cartazes à Beira da Estrada”, vencedor de dois Óscares, teve uma outra ideia arrojada: “Vá de colocar cartazes à beira da estrada a dizer que o Vasco Cordeiro [presidente do governo regional] era o responsável pelo facto de as crianças no Corvo não terem refeições na escola. A vida política nos arquipélagos é muito difícil. A Madeira é governada pelo mesmo partido desde 1976. E nos Açores só tivemos uma mudança de governo, em 1996. São partidos que dominam a administração regional e as empresas públicas e, por isso, a alternância política é muito mais difícil”.
"Preocupa-me muito o abandono do Alentejo"
Deputado regional dos Açores desde 2008, Paulo Estevão diz ter “evoluído” na sua posição relativamente à regionalização: “No referendo de 1998 votei contra mas agora votaria a favor. Não estou a ver outra forma de desenvolver uma região como o Alentejo sem a existência de regiões administrativas. É necessário que se tenha poder político para atrair investimento”. Quando vai a Serpa, e cruza as estradas do Alentejo, não deixa de se indignar com o que diz ser o “abandono” do poder central – “As estradas estão uma lástima e os centros urbanos muito degradados” – nem com a proliferação de culturas intensivas. “Fosse eu deputado e cada plantação nova teria merecido um requerimento a perguntar quem foi o responsável que autorizou e quem financiou”.