A diretora-geral da Estar garante que a associação pretende utilizar o edifício da Casa Ribeiro, em Beja, a “bem da comunidade”, quer através da instalação de um centro de alojamento de emergência social, quer de outra resposta, e lamenta que “muitas das pessoas que assinaram o abaixo-assinado” o tenham feito “de forma pressionada”.
Texto Nélia Pedrosa
A Estar não vai desistir de instalar uma resposta social no edifício do espaço comercial Casa Ribeiro, na rua da Infantaria, em Beja, garante Madalena Palma, diretora-geral da associação. “Não vamos, obviamente, desistir. Nós e a empresa privada [proprietária do edifício] estamos firmes nessa solução”, afirma ao “Diário do Alentejo” (“DA”), adiantando, no entanto, que neste momento “ainda nada está decidido”. “[O edifício] poderá acolher perfeitamente [uma resposta social] (…). O licenciamento está mais do que tratado. Não sei dizer se será um CAES [centro de alojamento de emergência social] 2.0, mas, sim, vamos utilizar aquele equipamento a bem da comunidade”.
Recorde-se que a instalação de um CAES 2.0, mediante protocolo a assinar entre a Segurança Social e a Estar, conforme noticiado pelo “Diário do Alentejo” em fevereiro, motivou, por parte dos comerciantes, o lançamento de uma petição on line e de um abaixo-assinado, que contam, em conjunto, até ao momento, com mais de 2200 subscrições. Segundo os promotores, a localização “não é adequada, pois pode impactar negativamente a segurança, o comércio local e a sua atividade económica, assim como o turismo e a qualidade de vida dos moradores e trabalhadores”, por isso solicitam às autoridades envolvidas no processo que “encontrem uma solução que equilibre a necessidade de assistência social com a preservação da qualidade de vida e da economia local”.
Em declarações ao “DA”, a diretora-geral da Estar revela que depois de terem sido contactados, no verão do ano passado, pela empresa privada que adquiriu o edifício, e que pretendia criar “uma resposta social que desse resposta a muitos dos problemas que existem em Beja, não só questões de imigração, mas também de pessoas em situação de sem-abrigo”, reuniram-se com a Segurança Social, que se “disponibilizou” a “trabalhar em conjunto” com a associação “para encontrar uma resposta social a aplicar ao edifício”. Entretanto, decidiram “envolver a câmara”, que “foi chamada a participar neste processo desde o início”. Segundo Madalena Palma, o privado apresentou várias propostas, “uma delas o arrendamento”, que seria assegurado pela Estar, pelo município e pela entidade privada “e, inclusivamente, [por] outros parceiros que pudessem surgir, e que surgem, porque existem outros a quererem trabalhar” com a associação. Mais tarde, em reunião “para fazer o ponto de situação”, “o município, na voz do presidente, disse que não era viável a câmara participar em obras de um edifício que não seria da sua propriedade”, pelo que o que poderia fazer “era adquirir o edifício”, adianta. A empresa privada “disse que poderia vender o edifício”, com a garantia de que ali só funcionaria uma resposta destinada aos problemas sociais do concelho, “e que teria de ser com a Estar”. A autarquia propôs, então, “fazer uma avaliação externa ao edifício para [ver] se iria comprar, se o valor era agradável ou não, para depois nos apresentar [esses valores] e saber se aceitaríamos a proposta”. Essa reunião, diz a diretora-geral, “só iria acontecer após a validação do orçamento em assembleia municipal”. Por isso, frisa, “a atitude do presidente da Câmara de Beja”, Paulo Arsénio, na reunião de câmara de 19 de fevereiro, em que disse que o município não tinha “qualquer envolvimento” no processo, “foi desoladora”. “Não estávamos à espera que ele se demarcasse desta situação. Apesar de sempre termos dito que avançaríamos para uma resposta social, CAES 2.0, ou outra, mas que fosse ao encontro das necessidades do concelho, mesmo que o município não se envolvesse. Nunca dissemos que era imprescindível a presença do município, mas quisemos envolvê-lo, porque faz sentido”.
Madalena Palma sublinha ainda que foram realizadas “imensas reuniões em que, inclusivamente, esteve o vice-presidente, o chefe da divisão financeira, o chefe da divisão social”, e, “para que não houvesse qualquer tipo de aproveitamento político em ano de eleições”, a Estar “sempre informou os vereadores da oposição, tanto da CDU, como do Beja Consegue, sobre tudo, para que toda a gente se visse envolvida no projeto (…) [e] foi desolador ver que ninguém se pronunciou com a verdade ali”. “O presidente voltou atrás (…) sentiu-se pressionado, não sei, pelos comerciantes (…) mas ainda estamos à espera que nos diga qual foi o valor da avaliação do edifício e se vai ou não fazer-nos a proposta para aquisição”.
A diretora-geral lamenta, ainda, que “muitas das pessoas que assinaram o abaixo-assinado” o tenham feito “de forma pressionada e com falta de verdade” e assegura que, a ser criado um CAES 2.0 na Estar, “irá funcionar como funcionam todos os outros projetos da Estar, de forma transparente e clara”. “Não se vê à porta da Estar pessoas a mendigar, filas à espera de um cabaz de comida, a terem comportamentos inadequados, carros da polícia, porque nós não trabalhamos assim”, realça, adiantando que a associação “já trabalha 24 horas por dia, há muito tempo”, faltando, unicamente, “alojamento”. “É um equipamento necessário para o distrito, que dá resposta nacional a pessoas que estão em situação de sem-abrigo, a vítimas de violência doméstica que continuam a não conseguir abandonar as suas habitações porque não querem deixar filhos e animais para trás. Os centros de alojamento de emergência são, apenas, para pessoas que estão em situação de vulnerabilidade e de sem-abrigo. Nem todas são elegíveis. Imigrantes ilegais é uma situação que nada tem a ver connosco. Não podemos dar resposta a estas situações. Dizem que vamos acolher pessoas que cometem crimes. O habitual é serem as prisões... Portanto, não ajudamos toda a gente. Para além disso, 70 por cento da população que ajudamos é nacional e 30 por cento é imigrante”.
Vereador da CDU acusa câmara de faltar à verdade
O assunto voltou a ser abordado na reunião de câmara desta quarta-feira, com o vereador da CDU, Vítor Picado, a acusar o executivo PS liderado por Paulo Arsénio de, na última reunião, ter faltado “deliberada e ostensivamente à verdade”, ao afirmar que a autarquia “não teria nada a ver com a situação ou desconhecia em absoluto a situação”, quando “é público que houve uma série de reuniões na qual a câmara participou no sentido de dar uma resposta à situação que era colocada (…)”, assim como também é, “mais ou menos público, que a câmara terá solicitado uma avaliação ao edifício no sentido de proceder à sua aquisição”.
Em resposta, o vice-presidente, Rui Marreiros, em substituição de Paulo Arsénio, admitiu que “houve reuniões”, que participou “em muito poucas” e que “o município mandou fazer uma avaliação na sequência de uma proposta de venda do edifício, uma prática que o município tem, não em todas (…) mas sendo um edifício com a dimensão que é, na localização que está… Essa avaliação foi feita e já chegou ao município. Essas são as intenções que são assumidas e que são conhecidas, que é o município de Beja estar disponível para adquirir imóveis que, por alguma razão, possam fazer sentido, independentemente, do uso futuro, da sua tipologia, eventualmente, até da sua localização”.
A vereadora Maria João Ganhão, por sua vez, deixou claro que o projeto para a Casa Ribeiro “não é uma proposta, nem uma resposta social, do município”.
Os promotores da petição on line e do abaixo-assinado aproveitaram a reunião para fazerem a entrega dos documentos ao executivo e para reforçarem as suas preocupações em relação à criação de um CAES 2.0. Para esta sexta-feira estará agendada a entrega dos referidos documentos no Centro Distrital de Beja da Segurança Social.