Diário do Alentejo

“A vida vegetal ‘faz’ o mundo”

21 de janeiro 2024 - 08:00
Livro da cátedra em Etnobotânica, do IPBeja, da autoria de Ana Paula Figueira
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Ana Paula Figueira, natural de Beja

Doutorada em Gestão de Empresas, concluiu, em 2011, o pós-doutoramento no Centro de Estudos Geográficos (Universidade de Lisboa). Professora coordenadora no Instituto Politécnico de Beja (IPBeja), foi sua pró-presidente para o Planeamento, Marketing e Comunicação (2017-2021). Escreve artigos de opinião em dois jornais regionais. Já editou mais de duas dezenas de livros, técnicos e de ficção. É vice-titular da cátedra em Etnobotânica e Salvaguarda do Património de Origem Vegetal, instituída pela Unesco, do IPBeja.

Texto José Serrano

 

Foi recentemente publicado o livro Mágicos da Viola Campaniça – Pedro Mestre, a primeira obra sob os auspícios da cátedra em Etnobotânica e Salvaguarda do Património de Origem Vegetal, instituída pela Unesco, no Instituto Politécnico de Beja (IPBeja), em janeiro de 2023.

Como nos apresenta este livro?Este opúsculo insere-se no projeto “Cante de Improviso com Viola Campaniça”, que coordeno, cujo objetivo é contribuir para o estudo da cultura material, relacionada com as plantas, subjacente a esta tradição regional. Foram realizadas reuniões com o Centro de Artes e da Viola Campaniça, em Castro Verde, e com o Centro de Valorização da Viola Campaniça e do Cante de Improviso, em São Martinho das Amoreiras (Odemira), tendo sido identificada esta necessidade: a coleção de opúsculos, apontamentos/registos para a história da viola campaniça, centrados em pessoas vivas, cujo saber é um contributo inestimável para a herança cultural relacionada com este instrumento musical.

Estudando a etnobotânica a relação entre o Homem e as plantas, qual a influência da flora autóctone nas práticas culturais do território?A vida vegetal existe em comunhão global, fundindo-se com o mundo que a acolhe. Debaixo do sol ou da chuva, misturada com a água ou com o vento, coincide com a sua substância e, nesta ótica, a vida vegetal “faz” o mundo. Espontaneamente, os humanos integram as plantas nas suas culturas e tradições. É factual o Baixo Alentejo surgir associado ao trigo, à azinheira, ao sobreiro. Mas, também, à esteva-do-lá-dano, ao cardo-do-coalho e à oliveira, amplamente representados em muitas das suas práticas culturais.

Considera que a eventual perda de biodiversidade poderá levar à extinção de determinadas práticas ou objetos culturais da região? As transformações globais exigem um processo de reformulação/reestruturação/adaptação de modos de produção e de consumo, por conseguinte, de representações simbólicas. Se o mundo continuar a escolher o caminho da perda da biodiversidade, para além das gravíssimas consequências que essa opção aporta – ao nível da saúde pública, da conservação, da agricultura, da epidemiologia e do desenvolvimento –, as mudanças serão vertidas nas representações sociais e simbólicas dos povos, afirmando uma nova “modernidade”. Não considero, em qualquer caso, que a “modernização” reclame a abolição das tradições, tal como não me parece que exista um destino fatal atribuído aos grupos tradicionais que os leve à sua exclusão da modernidade.

Pretende que esta obra bilingue, em português e inglês, se constitua como um instrumento de divulgação cultural do Baixo Alentejo além-fronteiras? Essa é a ousadia. Trata-se de um livro com cerca de 5000 palavras, dirigido ao público em geral. Esteticamente, é muito cuidado, porque os livros devem, também, estimular a imaginação e a criatividade. Não menos importante, este projeto obteve o apoio da Direção Regional de Cultura do Alentejo, extinta em dezembro de 2023.

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