Diário do Alentejo

A Formação
Opinião

A Formação

Francisco Marques, professor

01 de julho 2019 - 11:35

No artigo anterior mencionei a importância de se falar sobre educação, formação e emprego e direcionei o meu texto numa perspetiva associada apenas à educação. Hoje pretendo abordar o tema da formação e começo por referir que, em meu entender, a formação deve ocorrer a dois níveis: A) a nível do ensino secundário; B) a nível do ensino superior. Estes dois níveis da formação deverão facilitar a obtenção de um emprego. Por seu lado, esta formação deverá permitir o domínio de conhecimentos específicos para o exercício de uma profissão, quer seja de nível 4, através da frequência de um curso profissional, ou de nível superior.

 

Assim, começo por referir que o desenvolvimento do ensino profissional tem vindo a permitir, nos últimos anos, um salto de qualidade no encontro entre a escola e o mercado de trabalho. Julgo que também é evidente que a inserção desta modalidade no ensino secundário público tornou possível o seu crescimento exponencial. Mas vejamos de que forma.

 

Há dez anos, apenas 27 mil alunos frequentavam esta modalidade de ensino. Atualmente, este número ascende para valores superiores aos 91 mil. Destes, cerca de 60% frequentam cursos profissionais na escola pública, uma realidade potenciada pela reforma do ensino secundário, realizada em 2004, e que, recorde-se, possibilitou a integração desta modalidade, anteriormente remetida às escolas profissionais de carácter privado ou cooperativo, no ensino secundário público.

 

A tomada de decisão política de introduzir os cursos profissionais nas escolas públicas pela Sr.ª Ministra da Educação de então, Dr.ª Maria de Lourdes Rodrigues, veio contribuir para reduzir uma matriz que existia nas escolas secundárias, onde o ensino estava apenas direcionado para o prosseguimento de estudos de nível superior. Considerando que esta matriz potenciava o fenómeno do insucesso escolar e, consequentemente, agravava as desigualdades sociais, importa analisar como é que a diversificação de ofertas educativas no ensino secundário, concretamente a generalização dos cursos profissionais, tem contribuído para a mudança de perfil dos alunos.

 

O ensino secundário sofreu várias alterações ao longo dos anos e esses acontecimentos, essas mudanças, ajudam-nos a compreender a origem do ensino profissional. Hoje pode dizer-se que o ensino profissional é uma modalidade de educação direcionada para a integração no mercado de trabalho, sendo que a sua conclusão permite uma qualificação profissional bem como o diploma de conclusão do 12.º ano de escolaridade, e não impede o prosseguimento de estudos a nível superior. É na lei de bases do sistema educativo (Lei n.º 46/86, de 14 de outubro) que é mencionado pela primeira vez num normativo que o ensino secundário, para além de ser um nível intermédio de estudos, propedêutico do ensino superior, também representa um grau de escolaridade de preparação para o mercado de trabalho. Desde modo, a referida lei reveste-se de uma elevada importância para a definição da dupla identidade do ensino secundário. Este nível de ensino organiza-se segundo formas diferenciadas, contemplando a existência de cursos predominantemente orientados para a vida ativa ou para o prosseguimento de estudos.

 

Assim, atualmente, os cursos profissionais são uma modalidade de educação de nível secundário que se carateriza por uma forte ligação com o mundo profissional e destinam-se a indivíduos que tenham concluído o 9º ano de escolaridade ou equivalente e procurem um ensino mais prático e voltado para o mundo do trabalho. As aprendizagens têm em conta o desenvolvimento de competências para o exercício de uma profissão em articulação com o setor empresarial.

 

No que diz respeito à formação ao nível do ensino superior, a realidade, não sendo semelhante, tem pontos em que existe uma aproximação manifesta. Mas vejamos brevemente o que tem sido feito ultimamente neste nível de ensino.

 

Entre outros aspetos, é evidente que temos hoje um maior número de licenciados, mestres e doutores se tivermos por referência valores de há 25 anos atrás. Essa diferença, se obrigatoriamente tem que ser relacionada com o número de alunos que conseguiram completar os seus estudos a um nível superior, parece ser também consequência de diversas medidas que têm vindo a ser implementadas para tornar possível o acesso ao ensino superior a um maior número de jovens. Assim, é uma realidade que, dos 50 000 alunos que frequentavam o ensino superior nos finais da década de 1970, Portugal passou a registar perto de 400 000 alunos, em 2011/2012. Contudo, nos últimos anos esse valor tem vindo a decrescer e em 2013/2014 encontravam-se inscritos no ensino superior apenas 362 200 alunos.

 

A realidade traduzida por estes indicadores representa um desafio novo para um sistema que pretende melhorar os níveis de qualificação da população portuguesa. Quando comparada com a média europeia (36,8%), a percentagem da população com ensino superior fica aquém em 7,6%. Face à meta definida pela União Europeia no Programa “Educação e Formação 2020” que pretende atingir, pelo menos, 40% dos cidadãos com idades compreendidas entre os 30 a 34 anos, a distância ainda é maior.

 

Neste nível de ensino foram alvitradas grandes reformas, como a reorganização da rede, que na minha opinião era necessária como forma de ajustar as ofertas formativas à realidade que se vivia com as limitações e condicionalismos que nos eram impostos, mas, em meu entender, o caminho ainda é longo.

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