Diário do Alentejo

Animais deixados à sua sorte continuam a aumentar

19 de agosto 2023 - 16:00
No dia 19 assinalou-se o Dia Internacional do Animal Abandonado
Fotos | Ricardo ZambujoFotos | Ricardo Zambujo

O número de casos de abandono de animais de companhia, segundo dados do centro de recolha oficial da Resialentejo e de duas associações de bem-estar animal, continua a aumentar no distrito de Beja. A situação, que antes se agravava no período de verão, é cada vez mais “homogénea” durante todo o ano, o que tem causado preocupação a quem trabalha no resgate e no acolhimento.

 

Texto Ana Filipa Sousa de Sousa

 

A situação de abandono animal no distrito de Beja é, atualmente, delicada. No Canil/Gatil Intermunicipal da Resialentejo – Cagia, classificado como CRO (centro de recolha oficial), o número de animais abandonados “tem vindo a aumentar” nos últimos cinco anos – 237 em 2019; 314 em 2020; 316 em 2021; e 1022 entre 2022 e o primeiro semestre de 2023.

 

“O número de animais recolhidos, infelizmente, tem vindo a aumentar, [sendo que] aumenta ligeiramente no verão, mas já estamos a assistir a alguma homogeneidade ao longo do ano. No entanto, e decorrente do reforço da comunicação nas redes sociais e de ações realizadas em alguns eventos na nossa região, [conseguimos] aumentar a visibilidade do nosso projeto e assim, ainda que de forma insuficiente, aumentar o número de adoções”, revela ao “Diário do Alentejo” (“DA”) o presidente do conselho de administração da Resialentejo, Marcelo Guerreiro.

 

Desta forma, o Cagia tem verificado um forte crescimento das adoções, tendo sido adotados 56 animais em 2019, 124 em 2020, 179 em 2021 e 478 nos últimos 18 meses. Seguindo o mesmo caminho, o CRO, que serve os municípios de Aljustrel, Almodôvar, Alvito, Beja, Castro Verde, Moura, Mourão, Serpa, Vidigueira, Reguengos de Mon-saraz e Ourique, esterilizou, entre 2022 e o primeiro semestre de 2023, 523 animais.

 

Em retrospetiva, em 2019 ocorreram 51 esterilizações, em 2020, 82 e, em 2021, 223.

 

No último ano, face à grande dificuldade em dar resposta a todas as situações, o Cagia viu-se obrigado a ampliar as suas instalações, onde passou a conseguir acolher 200 cães e 120 gatos, quando, até então, a lotação era de 60 animais de cada espécie. Para Marcelo Guerreiro, a obra, que teve um investimento de cerca de 350 mil euros, “significou uma melhoria muito relevante da qualidade do serviço prestado aos municípios nossos associados, aumentando a capacidade de alojamento e melhorando as condições de bem-estar dos animais”.

 

E acrescenta que esta permitiu, ainda, “construir uma área de isolamento para animais recém-chegados” para garantir “um maior controlo da saúde dos mesmos e da propagação de doenças”, bem como valorizar o “enriquecimento ambiental, treinos e espaços para exercícios”.

 

 

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EXPANDCOURGE E OS RAFEIRITOS DO ALENTEJO CONTINUAM SEM INSTALAÇÕES

Ao nível das associações sem fins lucrativos e de bem-estar animal a situação também se repete. Entre o início de 2022 e junho deste ano a Expandcourage – Associação de Intervenção e Ajuda a Animais do Distrito de Beja recolheu 100 animais, entre os quais um equídeo, “sob negligência e bastante subnutrido”. No que diz respeito ao número de adoções, no mesmo período de tempo, foram 70.

 

Apesar do aumento de recolhas – mais 30 animais do que em 2021 –, a associação continua sem ver solucionada a questão das instalações.

 

André Ventura, presidente da Expandcourage, diz não compreender como é que ao fim de três anos desde a criação da associação em Ferreira do Alentejo lhes continue a ser negado um espaço no antigo mercado municipal da vila ou uma área para a construção de um abrigo.

 

“Continuamos a insistir que nos cedam um espaço para sede, mas as respostas são sempre que não há espaços disponíveis, o que sabemos que não corresponde à verdade, pois nos espaços das associações, que é no antigo mercado municipal, está um cedido a um particular. Pedimos um espaço para a construção de um abrigo que também nos foi negado”, confessa.

 

A passar pela mesma situação está a Associação Canil e Gatil Os Rafeiritos do Alentejo, de Ourique-Gare e Castro Verde, que, no último ano e meio, recolheu 105 animais, mais do dobro do que aqueles que abrigou em 2020. Assim, foram recolhidos 56 animais em 2019, 51 em 2020 e 68 em 2021. Ao nível das adoções os números mantêm-se idênticos aos do ano passado, cerca de 60.

 

À semelhança também do ano passado está a indecisão quanto à construção do novo canil. No final de 2022 Os Rafeiritos do Alentejo tiveram de abandonar o local onde se encontravam e previam construir umas novas instalações em Castro Verde, contudo, volvidos cerca de sete meses, a associação continua “sem espaço físico para dar resposta aos muitos pedidos de ajuda”, assim como aos próprios animais que à data estavam sob a sua responsabilidade.

 

“O projeto do novo abrigo [que prevê albergar uma centena de cães], por não estar conforme para aprovação por parte da câmara, está agora a ser revisto. Os animais que se encontravam no abrigo no final de 2022, e que não foram adotados, foram recebidos por outras associações congéneres, que, apesar de estarem lotadas, não hesitaram em ajudar-nos, e também por FAT [famílias de acolhimento temporário]”, explica a vice-presidente, Paula Carvalho.

 

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FAMÍLIAS DE ACOLHIMENTO TEMPORÁRIO SÃO A SOLUÇÃo

A indisponibilidade de instalações das duas associações tem feito das famílias de acolhimento temporário um ponto de salvação. Segundo André Ventura e Paula Carvalho, não seria possível continuar o trabalho de recolha e acolhimento nestas áreas se não houvesse este tipo de voluntariado que, neste momento, é uma das poucas respostas possíveis de dar.

 

“As famílias de acolhimento temporário são fundamentais para o desenvolvimento do nosso trabalho. Não temos palavras para lhes agradecer a importância que têm para conseguirmos ajudar quem não tem voz para pedir ajuda, mas, com a falta de adoções e o elevado aumento do custo de vida, temos perdido algumas FAT”, confirma André Ventura.

 

Atualmente, na Expand-courage, a capacidade de resposta das FAT está a meio, contando com o mesmo número de cães acolhidos em FAT e de famílias ainda disponíveis, 20. Por sua vez, conforme explica Paula Carvalho, nos Rafeiritos do Alentejo a situação está mais complicada, com as 15 “FAT cheias” e sem qualquer outra alternativa sem ser, “em casos graves, recorrer [ao apelo] às redes sociais”.

 

 

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DESPESAS NO VETERINÁRIO SÃO MENOS,  MAS CONTINUAM A SER A “PEDRA NO SAPATO”

No ano passado, em declarações ao “Diário do Alentejo”, a presidente da Associação Canil e Gatil Os Rafeiritos do Alentejo, Ana Morgado, referia que o abrigo se deparava “com dificuldades financeiras, com várias dívidas avultadas nas várias clínicas veterinárias” parceiras, que ascendiam “a milhares de euros”.

 

Um ano volvido, embora as despesas sejam “menores”, resultado também do menor número de animais ao seu encargo, Paula Carvalho, vice-presidente, lembra ainda que as verbas que a associação recebe com regularidade são “poucas” face ao “estado em que alguns animais nos têm chegado” e, consequentemente, aos “valores gastos com cada um deles”.

 

“Também se mantêm em dívida muitos dos atos veterinários ocorridos no passado e para os quais não temos como fazer face. Concorremos aos apoios do ICNF [Instituto da Conservação das Naturezas e das Florestas] para poder atenuar parte delas, mas aguardamos os pedidos de pagamento”, esclarece.

 

Ainda assim, a intenção das duas representantes é “não desistir, até porque Os Rafeiritos fazem falta nesta região, [onde] ao longo de todos estes anos foram resgatados milhares de cães, e se não fosse o trabalho da associação teriam tido um fim triste”, recorda.

 

 

CANTINHO DOS ANIMAIS DE BEJA TEM NOVA DIREÇÃO

A Associação Cantinho dos Animais de Beja assumiu no passado dia 20 de julho uma nova direção, composta por Joana Clérigo, Hugo Barros e Hugo Cachaço.

 

A atual direção, na assembleia extraordinária, prometeu continuar a “salvaguardar e cuidar dos mais de 100 animais que se encontram entregues ao Cantinho, seja em canil ou em FAT, bem como receber novos animais que necessitam da nossa ajuda, sempre que existam condições para esse efeito”. Numa publicação deixada no Facebook no início do mês, a atual direção dá conta ainda das “várias dificuldades e resistência na passagem da pasta [da antiga direção], tais como no acesso a dados bancários, contas das redes sociais, fornecedores, sócios, e divergências na gestão da associação face às diretivas anteriores”.

 

Os novos corpos sociais são ainda compostos por Luzia Pazes, Mariana Silva, Hugo Cordeiro, Susana Mercês, Érica Cavaco e Salete Albino.

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