Diário do Alentejo

À descoberta dos tesouros do Baixo Alentejo

18 de agosto 2022 - 10:00
Esta semana continuamos a viagem pelo património da região
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Mértola, Moura, Ourique, Serpa e Vidigueira são os concelhos a fechar esta rota que tem por base o Guia de Museus do Baixo Alentejo, editado pela Comunidade Intermunicipal do Baixo Alentejo (Cimbal).

 

 

 

Mértola

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Em Mértola, a “Vila Museu”, todos os recantos têm algo para descobrir pelos visitantes

 

O percurso histórico de Mértola constitui um centro interpretativo da memória. Indo ao encontro das pegadas dos seus núcleos museológicos, começando o percurso no Mercado em frente à Biblioteca Municipal, sobe-se pela Rua da Igreja e logo no seu início deparamos com o núcleo museológico de Oficina de Tecelagem a reiterar a mestria dos gestos de uma arte secular. Prosseguimos e paredes meias com o Posto de Informação Turística somos tomados pela Casa de Mértola a recriar uma residência familiar do início do séc. XX. No cimo da rua apresenta-se-nos o Senhor dos Aflitos, local de devoção onde, ainda hoje, são cumpridas promessas. Logo ali está o Calvário do Senhor dos Passos, nas proximidades da Igreja Matriz, local de culto com sucessivas presenças desde a Antiguidade Tardia, passando pelo período islâmico até à atualidade. O seu exterior singelo evidencia um pórtico com ornamentos em baixo-relevo do séc. XVI. A coroar este edificado surge um conjunto de elementos arquitetónicos de tradição Mudéjar: merlões e coruchéus cónicos. No interior destaca-se o Mihrab e quatro portas de arco em ferradura, testemunhos da Antiga Mesquita do séc. XII. 

 

Seguimos até à Alcáçova do Castelo, que evidência vestígios arqueológicos desde o Período Romano até ao séc. XVIII. Neste contexto dão-se a conhecer registos de um complexo religioso com um batistério e um pórtico com um importante conjunto de mosaicos dos séculos V e VI. Posteriormente instalou-se no local um bairro islâmico, datado do séc. XII, e contemporâneo da Mesquita. Na Torre de Menagem do Castelo, mandada erigir por Dom João Fernandes, em finais do séc. XIII, encontra-se um núcleo que narra, entre muralhas, a história do Castelo e da presença da Ordem de Santiago em Mértola. De regresso ao Calvário do Senhor dos Passos e percorrendo de seguida a Rua Elias Garcia passamos pela Forja do Ferreiro, local onde o Ti Brito, último artesão deste ofício na terra, exerceu esta profissão perto do fim do séc. XX.

 

 

Descendo junto à Ribeira de Oeiras, encontramos o núcleo de Arte Islâmica que exibe uma importante coleção de objetos deste período com destaque para a cerâmica de corda seca, datada dos séculos XII e XIII, instalado num edifício que faz a ligação entre o atual casario do centro histórico e o seu passado mourisco. Por perto, sobre a porta da ribeira, está situado o núcleo da Arte Sacra. Por fim chegamos à Casa Romana, primeiro núcleo museológico do Museu de Mértola, inaugurado em 1988, após reconstrução do edifício sede do município destruído por um incêndio: estrutura arquitetónica conservada in situ, epígrafe de um tempo que compreende o séc. I a IV d.C.

 

 

Fora da Vila, podemos visitar o núcleo Casa do Mineiro na Mina de São Domingos, impor tante localidade mineira em finais do séc. XIX, 1.ª metade do séc. XX, cujo espólio exposto foi doado pelos habitantes locais. No Mosteiro, a arqueologia e a etnografia confluem como um todo expositivo. Aqui cruzam-se caminhos por onde passaram viajantes, peregrinos nossos antepassados. O Núcleo museológico de Alcaria dos Javazes, apresenta-nos uma coleção particular de carácter etnográfico, que no essencial patenteia a realidade rural deste povo.

 

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Moura

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No Bairro da Mouraria, em Moura, está patente a influência árabe na região

 

Ao falar de Moura, o sol, o azeite e a água, são motes inseparáveis que fortalecem os seus traços identitários culturais, sociais e económicos. O casario com paredes caiadas e encorpadas, distinguem as suas chaminés de uma brancura que se eleva na telha rubra. Com paladares singulares e habitats hospitaleiros a sua gente raiana conquista o coração dos seus visitantes. O concelho, com a sua exposição solar peculiar, coloca a Vila de Amareleja no mapa de Portugal, como um dos locais com temperaturas térmicas mais elevadas. Aqui foi instalada, em 2008, uma das primeiras centrais de painéis solares a nível nacional e das maiores do mundo. A Central Solar Fotovoltaica de Amareleja, edificada num terreno de 250 hectares, é agora uma importante fonte de produção de energia elétrica.

 

 

O azeite é intrínseco a esta terra. O seu aroma e paladar é peculiar. Podemos asseverar que estamos perante o produto padrão da terra que é, de alguma forma, vincado no núcleo museológico do Lagar de Varas do Fojo do séc. XIX, com toda a sua maquinaria original com um sistema de funcionamento de varas e peso (um legado que vem desde o período romano).

 

 

A água é outro aspeto a salientar pois é comprovada a abundância de nascentes disseminadas pela cidade. O seu castelo, elevado em solo montanhoso, viu fundado, no ano de 1899, a afamada fábrica de água mineral gaseificada, Água Castello. A relevância do elemento água encontra-se espelhado no património de Moura, nas fontes históricas da cidade e por um conjunto de infraestruturas que, pela abundância desse recurso, foram sendo criadas.

 

 

Para além da já citada fábrica da Água Castello, destacamos a Fábrica de Sais Medicinais onde foi instalado, desde 2011, o Museu de Joalharia Contemporânea Alberto Gordillo. Aqui mesmo ao lado existia um lagar de azeite que extraía água para a sua produção. Outro fator a evidenciar a importância da água são os poços abertos nos interiores habitacionais a revelar a influência e a permanência árabe, nesta região. No coração do Bairro da Mouraria podemos visitar o pequeno núcleo museológico Casa dos Poços, que exibe três bocais de poço dos séculos XIV-XV. Ainda no que toca à água, o maior lago artificial da Europa foi inaugurado em 2002, há vinte anos, a uma distância de uns quinze quilómetros da cidade de Moura. É a Barragem do Alqueva, um manto imenso de água com oliveiras e sobreiros em redor, à espreita.

 

 

No edifício do antigo matadouro contamos com a exposição Moura Arqueológica-Tesouros por descobrir. O visitante tem a oportunidade de descobrir tesouros de um passado Histórico bem distante, cronologicamente desde o Paleolítico até ao séc. XVIII.

 

 

Na Igreja de São Pedro, em 2004, nasce o núcleo de Arte Sacra, em parceria com o, então, Departamento Histórico e Artístico da Diocese de Beja e na Torre de Menagem do Castelo de Moura apresenta-se uma pequena parte do espólio bélico do Museu Municipal, um pequeno núcleo de Armaria. Do cimo desta torre temos uma vista panorâmica em torno da povoação.

 

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Ourique

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O Castro da Cola está classificado como monumento nacional desde 1910

 

Ourique, uma terra plena de história com um todo territorial natural e patrimonial significativo. Declarando vivências passadas, descortinamos o Castro da Cola, povoado situado no topo de uma colina, sobranceiro ao rio Mira.

 

 

Classificado como monumento nacional desde 1910, teve uma ocupação prolongada que se manteve durante cerca de 2 milénios, até ao momento em que foi abando nado, no século XV. A sua implantação em terreno elevado, minas de cobre e recursos hídricos próximos, foram fatores determinantes para esta longevidade. Este sítio faz parte do itinerário do Circuito Arqueológico da Cola, formado por 15 sítios, que compõem cronologicamente tempos do Neolítico à Idade Média, distribuídos por uma área com cerca de 15Km2 e correspondem a estruturas liga das ao mundo dos vivos, atestada pelos antigos povoados do Cortadouro, de Fernão Vaz e do Porto das Lajes.

 

 

São parte integrante deste circuito locais associados ao culto dos mortos como é o caso dos monumentos megalíticos de Fernão Vaz, das necrópoles da Alcaria, Atalaia, Vaga da Cascalheira e Nora Velha, e dos monumentos funerários do Pego da Sobreira e do Casarão. O seu Centro Interpretativo, junto ao Castro da Cola, para além de prestar serviços de acolhimento e informação aos visitantes, possibilita ainda visitas guiadas.

 

 

A caminho de Garvão, uma ancestral vila de Portugal, deparamos com um dos referenciais históricos de toda a região, as feiras e romarias. O seu santuário com raízes no período longínquo da Idade do Ferro, anterior à chegada dos romanos, era já nessa época, um ponto de encontro e uma referência de carácter territorial no sudoeste peninsular.

 

 

O Depósito Votivo de Garvão é um testemunho evidente das práticas de rituais comunitários, com o seu carácter pan-regional. As cerimónias celebrativas em torno da vida rural e dos ciclos da lavoura envolviam práticas culturais coletivas de aproximação às divindades, que incluíam a deposição de oferendas de agradecimento e de pedido de amparo.

 

 

 É justamente pelo facto de se ter considerado o espólio existente por demais revelador que em 2009 foi criado em Ourique, o Centro de Arqueologia Caetano de Mello Beirão (CACMB), local de depósito e reserva destes materiais arqueológicos descobertos em 1983.

 

 

O CACMB funciona, desde a sua génese, como centro de conhecimento, estudo e formação arqueológica e, enquanto pólo de investigação no ativo, recebe também visitas por marcação.No seu piso principal podemos conhecer o “Depósito Votivo de Garvão - II Idade do Ferro”, exposição permanente que dá a conhecer o espólio e o trabalho desenvolvido presencialmente e com conteúdos de multimédia produzidos. Descendo ao piso inferior deste centro, podemos observar in loco a atividade das modernas técnicas de análise dos artefactos que fazem parte da Reserva. Este é um Laboratório que compreende as valências de estudo e de conservação e restauro qualificado, usando tecnologias de vanguarda, como a Digitalização 3D e a Fotogrametria Digital, que permite reconstruir virtualmente peças e o posicionamento que assumiam no seu sitio de achado, criando plataformas interativas que veiculam uma exploração virtual.

 

Por ruas, ruelas e praças de Ourique identificamos sinais que se expressam num todo edificado, nas suas tradições, histórias que se cruzam com a sua gente até aos dias de hoje.

 

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Serpa

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O Museu do Cante, em Serpa, um espaço de homenagem a este Património Imaterial da Humanidade

 

Serpa é uma unidade territorial e social com um todo envolvente a testemunhar vida em harmonia: uma localização geográfica contígua a Beja, Vidigueira, Moura e Mértola, com Espanha transfronteiriça. Tudo em redor, dentro e fora de portas, avizinha a presença do mundo do trabalho.

 

 

A base económica da região agrícola evidencia a paisagem da videira, do olival e da pastorícia. Os serviços, no geral e em especial o dos municípios, têm uma grande importância empreendedora.

 

No que toca ao património material e imaterial, podemos dizer que, no Concelho, vão-se delineando dinâmicas sociais, económicas e culturais fundamentadas na criação de novos núcleos museológicos, polos atrativos onde se apreende a memória recente e/ou mais distante. Com os seus monumentos e casario vinca um tempo que atesta a sua origem identitária, como um museu aberto a pulsar história enraizada na sua gente.

 

 

Depois de Beja e Évora, Serpa é o terceiro concelho do país com mais sítios arqueológicos a descoberto, mais de oito centenas desde a pré-história à época medieval e moderna, o que revela, neste contexto, a sua importância e riqueza.

 

 

Em Serpa cidade podemos visitar o Museu do Cante e, no interior do mercado municipal novo, temos o Centro Interpretativo do Queijo, um pequeno apontamento sobre um património de excelência. Paladares únicos, herdeiro dos mais antigos queijos produzidos em Portugal, certificado com denominação de origem protegida. À mesa, com um copo de vinho a saborear a gastronomia desta terra, ecoa o cante e a palavra amiga.

 

 

Nesta terra de encantar, as histórias e os paladares embalam o pulsar do bem-querer, no saber dar e receber. O Museu de Etnografia, no antigo mercado municipal, tem como objeto as várias artes e ofícios, onde se distingue a importância dos seus artefactos.

 

 

O Museu de Arqueologia no Castelo, na antiga casa do governador, é um polo dinâmico no centro histórico. O espaço, as muralhas e todo o edificado envolvem o núcleo museográfico. Este museu apresenta um espólio de grande diversidade e riqueza com origem em todo o concelho. O prosseguimento do trabalho arqueológico, com novas descobertas, permite introduzir uma novidade constante à sua narrativa, do Paleolítico até à época Islâmica.

 

 

Com os trabalhos do Alqueva, alguns períodos que eram menos evidentes no território, como os achados da Idade do Bronze e do Cobre, foram aqui incorporados em evidência. No Centro Musibéria, Antiga Fábrica da Nova Companhia Nacional de Moagem, de 1907 a 1970, podemos ver os equipamentos que faziam parte do processo de transformação de cereais.

 

 

Na Igreja Velha de São Jorge, encontra-se o núcleo, de Vila Verde de Ficalho, rodeado de vestígios arqueológicos escavados visíveis que, de algum modo, funcionam como um polo de arqueologia umbilical a um todo territorial. A Vila Romana da Cidade das Rosas é outro sítio arqueológico que começou a ser escavado a partir dos anos 70, mas que requer ser valorizado, também ele a três quilómetros de Serpa.

 

 

Um núcleo de Arte Contemporânea iniciado, nos anos 90, com gravura, pintura, escultura, entre outras expressões, junta numa coleção um conjunto de artistas plásticos relevantes no panorama da Arte Nacional.

 

 

O Museu do Relógio, em Serpa, criado em 1972, é único na Península Ibérica e um dos cinco, a nível mundial, que se dedica a esta temática. A sua impressionante coleção conta com mais de 2.300 relógios, cujas datas de produção começam em 1630 e se estendem até aos dias de hoje, incluindo relógios de bolso, de pulso e sala.

 

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Vidigueira

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Vinho da Talha: um património único do concelho da Vidigueira

 

Em Terras, outrora dos Gamas, e de silarcas os paladares são preenchidos, como uma “talha cheia”, memória do tempo, aqui protegida de forma exemplar. Podemos afirmar que, de algum modo, para se honrar a entidade desta terra têm que se conhecer, por inerência, os seus espaços museológicos: o Museu Municipal de Vidigueira, o Núcleo de Marmelar, a Casa do Vinho e do Cante e o Centro Interpretativo do Vinho de Talha de Vila de Frades.

 

 

Mesmo no centro da vila encontra-se a Casa do Vinho e do Cante: um polo difusor de experiências de participação, da comunidade e de todos os seus visitantes; uma extensão valorativa patrimonial, material e imaterial que configura este concelho. Com uma autenticidade este lugar transpõe-nos para ambientes ancestrais com representações que assinalam cada freguesia que compõe este concelho – Vidigueira, Vila de Frades, Selmes e Pedrogão do Alentejo.

 

 

No Museu Municipal de Vidigueira, instalado na antiga escola primária Vasco da Gama espreitamos em cada sala, bem definidos, encantos ancestrais.

 

Este espaço, simplesmente delicioso estrutura-se em dois grandes núcleos de leitura independente: o primeiro reporta-nos para todo um legado enquanto escola primária edificada entre 1880-1883, no séc. XIX; o segundo circunda as vivências de um quadro económico, social e cultural do séc. XX, nas décadas de 30 e seguintes, com os seus ofícios, comércio, agricultura e pequena indústria aqui apresentados em pequenos ambientes temáticos.

 

A sua coleção reconstrói um legado que se interliga para nos narrar também histórias de vida, a desta gente.

 

 

A cerca de 15 quilómetros da Vila de Vidigueira encontra-se o Núcleo Museológico de Marmelar onde podemos testemunhar a ocupação do território desta povoação que, em épocas distintas, reconstitui períodos reveladores da sua história. Do conjunto exposto ressaltam elementos arquitetónicos e decorativos, de culto e de relações sociais específicas, da época Romana e da Antiguidade Tardia.

 

 

Em Vila de Frades, a dois quilómetros de Vidigueira, temos o Centro Interpretativo a asseverar que o Vinho de Talha é, por aqui, apresentado de forma significante. É um museu contemporâneo que evidencia todo um património ligado ao vinho tradicional de talha. Toda a sua narrativa encaminha-nos para conhecer e apreender esta arte do fazer o elixir dos Deuses e percebemos toda a envolvência de um povo à terra semeada. Neste museu paira no ar o explanar de uma estória, fala-nos, é palavra, é Cante e é substancialmente poesia.

 

O desenho museológico e museográfico definido aclara-nos todo um passado patrimonial, vinca o presente e na sua modernidade pensa futuro. A instalação espacial, com som e imagem diligente, em multimédia e efeitos tecnológicos, agarra-nos a este povo uno, orgulhoso da sua história.

 

Ainda em Vila de Frades a comprovar a sua planície vinícola ergue-se imponente a Villa Romana de São Cucufate, única na Península Ibérica que conserva casa de primeiro andar e nas imediações surge a Quinta do Quetzal, um edificado moderno, com adega e restaurante onde se pode degustar o vinho e a gastronomia da região. Paralelamente, temos o Centro de Arte Contemporânea a atentar um espólio artístico de relevo.

 

A Quinta do Carmo, a 10 quilómetros de Vidigueira, é outro ponto a reter. Herdeira da história do Convento de N. Srª das Relíquias tem como sua custódia um legado patrimonial inequívoco e uma forte ligação ao navegador Vasco da Gama. De referir que a Serra do Mendro e a sua vila conferem a este local características inatas, de uma riqueza patrimonial histórico e cultural, paisagística e edificada, singulares.

 

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