Texto Rita Ranhola (Lusa)
Sem poder fazer rega há dois anos a partir da Barragem do Monte da Rocha, no concelho de Ourique, devido à seca, o agricultor Joaquim Sobral não plantou arroz e já pensa em desistir do regadio. Na área em que costuma fazer 200 hectares de arroz, perto da localidade de Alvalade, no concelho de Santiago do Cacém, o agricultor dá um pontapé nos torrões de terra seca, com a bota, e levanta uma nuvem de pó castanho, que ilustra o seu desânimo.
A “cultura” que tem para apresentar este ano “é terra”, conta Joaquim Sobral, de 72 anos: “É o que há, terra descascada. Não há mais nada. Fazia-se arroz, não se faz nada, não há água para fazer nada. Há dois anos que a Barragem do Monte da Rocha nem abre” para realizar a campanha de regadio e “esta parte aqui não tem acesso ao Alqueva”. A campanha de rega deste ano a partir da albufeira do Monte da Rocha foi cancelada devido à seca, afetando três mil hectares, segundo a Associação de Regantes e Beneficiários de Campilhas e Alto Sado (ARBCAS).
A associação, com um perímetro de rega de seis mil hectares (os outros três mil são regados porque beneficiam de uma ligação ao Alqueva), gere cinco barragens, mas a principal é a do Monte da Rocha, onde é notório o reduzido nível da água. “A barragem, nesta altura, está com 9% da capacidade. Já há dois anos praticamente que ela não tem qualquer reserva para rega”, porque a água existente é para o abastecimento público, diz o diretor adjunto da ARBCAS, Ilídio Martins.
Esta segunda-feira, o ministro do Ambiente e da Ação Climática, João Pedro Matos Fernandes, considerou preocupante o baixo nível das albufeiras, sublinhando que a seca é um problema estrutural a sul do rio Tejo, e pediu por isso poupança de água. O último índice meteorológico de seca do Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA) indica que Portugal continental manteve-se no final de agosto em situação de seca moderada, sendo pontualmente severa no Baixo Alentejo e Algarve, em relação ao mês de julho.
“As alterações climáticas estão severamente a atacar esta zona”, onde “praticamente não chove há quatro anos”, pois, “a média de precipitação é de 350 milímetros, quando a média dos [últimos] 30 anos é 600 milímetros”, indica o responsável da ARBCAS, depois de mostrar à Lusa uma zona em que o Rio Sado “está seco”, na passagem hidráulica de Torre Vã, de onde se avista água a alguma distância.
A água “é um bem realmente escasso” nesta área do Alentejo e “isso tem-se refletido no armazenamento das albufeiras, nas linhas de água, nos solos”, frisa, referindo que “não há água” e já são “quatro anos consecutivos de seca, dos quais os últimos dois gravíssimos”. Nos três mil hectares em que a campanha de rega foi suspensa, “é uma tristeza, porque há mais de 200 famílias que estão seriamente prejudicadas, não têm rendimentos já há dois anos”.
O agricultor e também produtor de gado Joaquim Sobral, que possui 200 vacas de raça Limousine, lembra que os agricultores “resistem muito”. Ele não é exceção, mas afirma que já não tem “idade para estar a teimar. Se isto continuar assim tenho que desistir. Acho que é o último ano. Vou entregar as terras aos donos e vou para a minha casa, que é para não ficar envergonhado com tanta gente”.