Diário do Alentejo

Feira das Bibliotecas em 13 municípios do Baixo Alentejo

22 de março 2019 - 23:00

Em cada 100 pessoas que vivem no distrito de Beja, 40 são utentes das bibliotecas municipais. As 13 da Rede Intermunicipal de Bibliotecas do Baixo Alentejo (Ribba) têm quase 55 mil utilizadores inscritos, estão abertas 280 dias por ano e recebem 300 mil visitantes anuais. Possuem um fundo documental destinado a empréstimo constituído por 580 570 documentos, sendo a esmagadora maioria livros. Organizam, a partir da próxima sexta-feira e até meados de dezembro deste ano, em 13 concelhos, a Feira das Bibliotecas. 

 

Texto Carlos Pereira 

 

A Feira das Bibliotecas arranca no próximo dia 29, em Beja. A iniciativa decorrerá ao longo deste ano em 13 dos 14 concelhos do distrito de Beja e visa dinamizar as bibliotecas municipais e promover a leitura na região. Trata-se de uma organização da Rede Intermunicipal de Bibliotecas do Baixo Alentejo (Ribba), constituída em 2018 pela Comunidade Intermunicipal do Baixo Alentejo (Cimbal) e a Direção-geral do Livro, dos Arquivos e das Bibliotecas (Dglab).

 

Constantino Piçarra, curador da Feira das Bibliotecas, explica que a ideia da sua realização partiu do diagnóstico de que “as bibliotecas públicas em geral e as do Baixo Alentejo em particular evidenciam uma certa perda de dinâmica”. Opina que para esta situação “têm contribuído vários factores como a crise económico-financeira que tem varrido o País e também uma certa incompreensão pela especificidade que o equipamento biblioteca pública representa no contexto de um município, que é completamente diferente do setor de obras ou de contabilidade, sem desprimor para qualquer destes”.

 

Lembra que a biblioteca pública tem uma missão que está definida no Manifesto da Unesco de 1994, onde se destacam como suas tarefas “criar e fortalecer os hábitos de leitura desde a primeira infância; apoiar a educação individual, a autoformação e a educação formal a todos os níveis; promover o conhecimento sobre a herança cultural da Humanidade; criar serviços adequados às empresas locais, nomeadamente as microempresas, e associações diversas; facilitar o desenvolvimento da capacidade de utilizar a informação e a informática; e fomentar o diálogo intercultural e a diversidade cultural”.

 

O grande objetivo da Feira das Bibliotecas é, assim, para o seu curador, “realinhar as bibliotecas públicas na senda de um funcionamento de acordo com esta missão, ou seja, contribuir para o aprofundamento da ação da biblioteca pública como a grande casa da democracia em cada município”.

Outros objetivos, em torno dos quais toda a feira se organiza, são chamar a atenção para a especificidade do equipamento “biblioteca” em termos de funcionamento e objetivos; sublinhar a missão da biblioteca pública e sua importância no desenvolvimento pessoal e cultural da comunidade que serve; dar a conhecer a Ribba; discutir o presente e o futuro da biblioteca pública; sensibilizar a comunidade para a missão e importância da biblioteca pública.

 

E, também, muito importante, “mostrar o papel desempenhado pelas bibliotecas públicas do Baixo Alentejo”. Para Constantino Piçarra, “este papel e esta ação fazem destes equipamentos, no nosso território, a realidade cultural mais importante do pós-25 de Abril de 1974, pelo que apoiá-los na sua missão é uma exigência da democracia e um desafio que se coloca à coletividade”. Sobre os resultados das bibliotecas públicas sul-alentejanas, há números que, segundo o curador da Feira das Bibliotecas, confirmam esse desempenho revelante.

 

Neste março de 2019, as 13 bibliotecas da Ribba possuem um fundo documental destinado a empréstimo constituído por 580 570 documentos, sendo a esmagadora maioria livros, o que dá um rácio superior a quatro documentos por cada habitante dos 13 municípios. Por outro lado, o conjunto destas bibliotecas tem inscritos 54 822 utilizadores, “o que significa que, em cada 100 pessoas que moram no distrito de Beja (com exceção de Odemira), 40 são utilizadores das bibliotecas, que emprestam mensalmente 11 559 documentos, o que significa um rácio de um documento emprestado por cada oito habitantes”.

 

Além das 13 bibliotecas municipais – umas funcionando em edifícios novos, outras ocupando instalações antigas mas requalificadas –, a rede conta com 13 polos em freguesias rurais, havendo ainda cinco bibliotecas itinerantes. A Ribba calcula que as suas bibliotecas, um serviço público gratuito para todos, estejam abertas 280 dias por ano e recebam 300 mil visitantes anuais.

A par desta exposição, haverá ainda um documentário, intitulado “Pessoas com bibliotecas dentro”, de cerca de 15 minutos, sobre o conjunto das 13 bibliotecas da Ribba.

As bibliotecas públicas da rede disponibilizam aos seus utilizadores um total de 140 computadores ligados à Internet e têm serviços de leitura de jornais e revistas e de apoio à pesquisa, além de levarem a cabo regularmente diversos projetos de promoção da leitura e das literacias, destinados tanto ao público em geral como a crianças.

 

Exposições, poesia, teatro…

Esta iniciativa cultural desenvolve-se em 13 bibliotecas públicas do distrito de Beja – uma por concelho, sendo exceção Odemira, cujo município integra a Comunidade Intermunicipal do Alentejo Litoral (Cimal). A partir de 29 de março, na Biblioteca Municipal José Saramago, de Beja, até 14 de dezembro, em Vidigueira, decorrendo a feira em cada biblioteca durante oito dias. O programa prevê atividades de dois tipos – as comuns a todas as bibliotecas e as organizadas localmente por cada uma delas.

 

As primeiras incluem uma exposição interativa organizada em linha com os objetivos estabelecidos e que reflete a missão e o peso cultural destes equipamentos no território. Para além dos expositores, o visitante poderá fazer uma viagem pelo interior de cada biblioteca colocando uns óculos de realidade aumentada. Poderá ainda ver e ouvir vários depoimentos dos utilizadores que passam em banda contínua em ecrã de televisão.

A Feira das Bibliotecas contará, ainda, no quadro do programa comum, com uma performance poética, tendo por base poetas portugueses contemporâneos, sob a direção da Gisela Cañamero; teatro, com “A pastora leitora”, peça escrita propositadamente para o evento por Gisela Cañamero, interpretada pela atriz Luzia Paramés e com produção das Produções Acidentais e do Arte Pública; um espetáculo para os mais pequenos, “Afinal o caracol”, produzido e interpretado pela companhia Andante; e um outro espetáculo, para o público em geral, produzido e interpretado também pela Andante Associação Artística, intitulado “Biblioteca andante”.

 

A estas realizações, durante os oito dias em cada concelho, somam-se outras produzidas localmente por cada biblioteca. O que está previsto é que estas iniciativas sejam no mínimo três: encontro com escritores; debate ou colóquio sobre o presente e o futuro das bibliotecas públicas; e Feira do Empréstimo (de livros e outros documentos). O programa em Beja começa na próxima sexta-feira, 29, às 18:00, com a inauguração da Feira das Bibliotecas. Anuncia-se a presença na cerimónia dos presidentes da Câmara Municipal de Beja, Paulo Arsénio, e da Cimbal, Jorge Rosa, da secretária de Estado da Cultura, Ângela Ferreira, e do físico e professor universitário Carlos Fiolhais, convidado especial.

 

Até ao dia 6, no auditório, cafetaria, setor infantil e cave da Biblioteca José Saramago, em Beja, os destaques vão – além dos já referidos – para a sessão “Brincar de ler”, em torno da exposição de Danuta Wojciechowska, para pais e filhos a partir dos três anos (no sábado, 30, às 15:00, e na terça-feira, 2, às 10 e às 14:00); para os espetáculos por Pedro Lamares “A poesia é uma arma carregada de futuro”, para o público em geral (na terça-feira, 2, às 21:30) e “Entre nós e as palavras”, para alunos do 12.º ano de escolaridade (na quarta-feira, 3, às 10:00); para o espetáculo “Cavalo marinho”, de dança e música para a pequena infância, com Ana Raquel Ferreira Martins (na sexta-feira, 5, às 10, 11 e 14:00, e, no sábado, 6, às 15:30 e 16:30); e para o encontro “Entre a poesia e a prosa”, com João Tordo e Rita Taborda Duarte, com moderação de Sandra Dias (na sexta-feira, 5, às 21:30).    

 

As armas do conhecimento

Sendo propósito da Feira das Bibliotecas promover uma maior dinâmica destes equipamentos municipais e estimular o aparecimento de novos públicos para a leitura, a questão justifica-se: hoje, com os e-books e os dispositivos de leitura digital, os telemóveis inteligentes, os computadores portáteis, etc., qual o espaço que resta aos livros em papel? E, neste contexto, em territórios como o do Baixo Alentejo, qual o papel das bibliotecas públicas no futuro?

 

Constantino Piçarra pensa que “os livros em papel continuarão a ter espaço”, até porque “a relação que se estabelece entre o leitor e o livro é um ato cultural que não desaparece facilmente”, estando aí o mercado editorial “para mostrar que o livro não segue o caminho da extinção”. Reconhece, contudo, que as novas tecnologias de informação tiveram um desenvolvimento exponencial e estão sempre a transformar-se em cada dia que passa. Assim, entende que as bibliotecas públicas, no futuro, incluindo as do distrito de Beja, devem seguir dois caminhos.

 

Por um lado, não podem perder uma relação estreita com o desenvolvimento das tecnologias de informação, “o que significa que a biblioteca pública, em cada concelho, deve ser o grande nó de acesso à informação disponível, independentemente do meio e da forma em que circula, o que passa também, nomeadamente no caso do Baixo Alentejo, pela concretização de programas de literacia de informação destinados a todos os tipos de público”. Por outro lado – e esta, a seu ver, é a questão decisiva das bibliotecas do futuro –, têm de se afirmar “como espaços onde se acede não só à informação mas também, e sobretudo, ao conhecimento”.

 

Reforça a ideia: “Hoje, o mundo está cada vez mais informado, mas cada vez menos conhecedor. Estar informado é saber o que aconteceu. Ser conhecedor é saber por que aconteceu. As novas tecnologias bombardeiam o mundo de informação, ao mesmo tempo que reduzem os espaços onde se processa a informação em conhecimento. Locais onde a informação se transforma em conhecimento, o que implica espaços de mediação e de discussão, é um caminho que as bibliotecas do futuro têm de trilhar”.

 

E insiste: “É da génese das bibliotecas serem locais de resistência cultural, espaços onde a partir dos quais se analisa o mundo e se adquirem armas, as armas do conhecimento, que nos habilitam a transformá-lo. O grande desafio das bibliotecas do futuro é serem capazes de manter sempre acesa a chama do conhecimento, não a deixando apagar pelas ondas vigorosas da informação, que cada vez mais são ondas de desinformação”.

 

FEIRA DAS BIBLIOTECAS  AO LONGO DE TODO O ANO

A Feira das Bibliotecas vai decorrer ao longo de 2019, em momentos diferentes, em cada uma das bibliotecas públicas dos 13 municípios do distrito de Beja que integram a Cimbal. Em Beja, de 29 de março a 6 de abril; em Moura, de 12 a 20 de abril; em Mértola, de 26 de abril a 4 de maio; em Aljustrel, de 10 a 18 de maio; em Almodôvar, de 24 de maio a 1 de junho; em Barrancos, de 5 a 14 de junho; em Castro Verde, de 13 a 21 de setembro; em Ourique, de 27 de setembro a 5 de outubro; em Serpa, de 11 a 19 de outubro; em Ferreira do Alentejo, de 25 de outubro a 2 de novembro; em Cuba, de 8 a 16 de novembro; em Alvito, de 22 a 30 de novembro; e em Vidigueira, de 6 a 14 de dezembro.  

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