A Polícia Judiciária (PJ) divulgou na terça-feira de manhã, em comunicado, que deteve 28 pessoas suspeitas de pertencer a uma estrutura criminosa que se dedicava à exploração de trabalhadores imigrantes no Baixo Alentejo.
Texto | “Lusa”
A “Operação Espelho” foi desencadeada pela Unidade Nacional de Contraterrorismo da PJ e envolveu cerca de 480 operacionais desta polícia, que deram cumprimento a 78 mandados de busca domiciliária e não domiciliária. Já nessa tarde, na sede da PJ, em Lisboa, a diretora da Unidade Nacional de Contraterrorismo, Manuela Santos, adiantou que, pelo menos, uma centena de imigrantes estava a ser vítima de exploração laboral, em especial, nas localidades de Cuba e Ferreira do Alentejo, no distrito de Beja. “Voltámos a detetar problemas de sobrelotação. Pessoas a viver em condições com muita falta de higiene. Uma casa de banho para 20 pessoas. Portanto, começámos a perceber bem como é que as pessoas conseguem viver nestas condições”, descreveu.
A responsável indicou que a denúncia destes crimes de exploração partiu de pessoas que viviam perto daquelas propriedades e não das próprias vítimas, “uma vez que se encontram numa situação de grande fragilidade”. “As pessoas eram aliciadas por anúncios. Estamos a falar de uma zona [Alentejo] envelhecida e carenciada de recursos humanos”, justificou. A inspetora disse ainda que os trabalhadores ganhavam entre 100 e 250 euros por mês, quando lhes prometiam “800, 900, mil ou mais”. Segundo a responsável, o que lhes explicavam é que a diferença “ficava retida” para pagamento do alojamento, alimentação e transporte.
Questionada sobre a forma de erradicar estes fenómenos criminais, Manuela Santos admitiu que tal “será muito difícil nos próximos anos, uma vez que é uma atividade que gera muitos lucros”. “Estas operações são uma pedrada no charco, mas não temos a pretensão de acabar com este fenómeno. Este fenómeno dificilmente será erradicado, principalmente, nos próximos anos”, ressalvou.
Os cidadãos imigrantes, na sua maioria, eram “aliciados nos seus países de origem, como Roménia, Moldávia, Ucrânia, Índia, Senegal, Paquistão, entre outros, para virem trabalhar em explorações agrícolas naquela região do nosso país”, indicou a PJ, em comunicado.
De acordo com a força policial, os suspeitos, de nacionalidade portuguesa e estrangeira, estão indiciados pela prática de crimes de associação criminosa, tráfico de pessoas, auxílio à imigração ilegal, angariação de mão de obra ilegal, extorsão, branqueamento de capitais, fraude fiscal, ofensas à integridade física, posse de arma de fogo e falsificação de documentos.
Os detidos foram presentes a primeiro interrogatório judicial, na quarta-feira, para aplicação de eventuais medidas de coação. Segundo perspetivou Manuela Santos, os suspeitos deverão ficar sujeitos à medida de coação de prisão preventiva, a mais gravosa, à semelhança daquilo que aconteceu numa operação semelhante ocorrida no ano passado.
FALTAM MEIOS PARA ACOMPANHAR IMIGRANTES
Sobre a operação desencadeada, o presidente da Câmara Municipal de Ferreira do Alentejo, Luís Pita Ameixa, insistiu, no próprio dia, nas críticas à falta de meios do Estado para acompanhar e fiscalizar os imigrantes que chegam à região para trabalhar na agricultura. “Os serviços do Estado não estão capacitados para lidar com esta emergência de grande escala de pessoas que vêm trabalhar, nomeadamente, a Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT) e o [extinto] Serviço de Estrangeiro e Fronteiras (SEF)”, afirmou o autarca.
Pita Ameixa já tinha criticado a “incapacidade do Estado em acompanhar e gerir a demanda de imigrantes” no território, em declarações à agência “Lusa”, aquando de uma operação policial idêntica realizada em novembro de 2022.
Assinalando que o que sabe da operação foi através das notícias, o autarca salientou que, um ano depois, a ACT e o SEF, entretanto extinto e que deu lugar à Agência para a Integração, Migrações e Asilo, “continuam a ter quatro ou cinco funcionários”, cada um. “É impossível. Os funcionários não conseguem desempenhar a sua função de fiscalização, acompanhamento e controlo destas situações”, considerou, assinalando que estes funcionários têm todo o distrito de Beja e uma parte do litoral.
O presidente do município vincou que a situação das entidades fiscalizadoras “era assim no passado e continua a ser igual”, considerando que “da parte do Estado não houve uma reação capaz” depois da operação policial realizada há um ano. “Não alteraram a situação que existia e era preciso criar estratégias de atuação e reforçar, sobretudo, os serviços do SEF e da ACT, que têm que estar dotados com quadros suficientes para lidar com uma situação excecional”, sublinhou.
Para Pita Ameixa, apenas a Câmara de Ferreira do Alentejo “fez alguma coisa”, pois criou “um programa de apoio à integração dos imigrantes” e apertou as ações de fiscalização. “Temos ações de fiscalização com os fiscais municipais para impedir a ocupação incorreta ou indevida de casas. Aqui não há nem deixamos que haja gente alojada em palheiros, nem em garagem. As casas têm que ter licença de habitação”, acrescentou.
A “Lusa” também contactou o presidente da Câmara de Cuba, João Português, que se escusou a prestar declarações sobre a operação.