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Luís Godinho, jornalista

11 de fevereiro 2020 - 11:10

"É fazer as contas", como diria António Guterres. Nos sete anos anteriores à ´sua privatização, em 2013, os CTT somaram cerca de 350 milhões de euros em lucros, a uma média de 50 milhões por ano. Só em 2013, o resultado líquido positivo foi de 61 milhões de euros. Já havia algumas queixas quanto à degradação da qualidade do serviço, na sua maior parte associadas ao encerramento de estações e de centros de distribuição postal, fruto do que se antevia ser a "preparação" da empresa para a sua posterior privatização. Largas centenas de trabalhadores foram mandados para casa. E os CTT, já com menos estações e menos pessoal, mas com lucro apreciável, lá entraram na espiral privatizadora. Um parêntesis para recordar que a venda da empresa constava do memorando de entendimento com a troika assinado por José Sócrates em 2011.

 

Dois anos depois, já com Pedro Passos Coelho no governo, dava-se a privatização, num negócio que rendeu ao Estado cerca de 900 milhões de euros. Sete anos passados sobre esse momento, os Correios distribuíram mais de 285 milhões de euros em dividendos, uma remuneração de tal forma apreciável para os acionistas que o “Jornal Económico” a classificou como “a mais generosa” do mercado nacional. Em 2014 os lucros foram de 77 milhões de euros. Daí para a frente baixaram sempre, tendo a empresa fechado as contas de 2019 com um saldo positivo abaixo dos 20 milhões de euros, sensivelmente um terço inferior ao registado no ano da privatização. Por outro lado, no primeiro semestre de 2019, segundo o relatório da Autoridade Nacional de Comunicações (Anacom), os serviços postais registaram “uma redução de 9,1 por cento do tráfego total e de 1,5 por cento das receitas”. Leu bem, caro leitor, não é erro: o volume de cartas e encomendas entregues diminuiu 9,1 por cento mas as receitas dos CTT baixaram apenas 1,5 por cento. O que quer dizer, como conclui a Anacom, que “a receita média por objeto aumentou 8,3 por cento”. Ou seja, pagamos substancialmente mais pelos serviços prestados. O habitual, portanto, num País onde muito investimento privado tem sido feito à custa das rendas pagas direta ou indiretamente pelo Estado.

 

Sucede que este aumento de preços foi acompanhado pela degradação do serviço prestado. Prova disso, por exemplo, é uma carta enviada por correio azul por uma jornalista do semanário “Expresso” ter levado cinco meses a chegar de Alenquer a Ourique. Em 2019, os Correios de Portugal foram a empresa com maior número de reclamações registadas no “portal da queixa”: 6 293. A preocupação é generalizada com um serviço que se encontra “num verdadeiro processo de liquidação e total destruição”, para citar as palavras de Marcelo Guerreiro, presidente da Câmara Municipal de Ourique, numa recente reunião com o presidente da Anacom. A boa notícia é que o contrato dos CTT para o serviço postal universal termina em dezembro deste ano. Sendo verdade que a privatização incluiu toda a infraestrutura, o que complica uma renacionalização da empresa, a depreciação dos resultados permite uma maior margem negocial.

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