Diário do Alentejo

Nunca vais chegar ao teu destino se parares para atirar pedras a cada cão que te ladra pelo caminho
Opinião

Nunca vais chegar ao teu destino se parares para atirar pedras a cada cão que te ladra pelo caminho

Ana Paula Figueira, professora

02 de janeiro 2020 - 02:00

Ontem, numa rede social, li a frase com que intitulei este texto, atribuída a Winston Churchill. Se o homem é, naturalmente, um animal político, a política está em tudo. E o velho estadista inglês é um tratado ao nível de atuação política. Conta-se que, num determinado dia, Churchill recebeu na bancada conservadora de Westminster um jovem deputado do seu partido que havia sido eleito pela primeira vez. Na sequência da conversa, a dado momento, este novo deputado fixa a bancada oposta e comenta: “É ali que estão os nossos inimigos”. Churchill responde-lhe: “Ali sentam-se os nossos adversários; os nossos inimigos sentam-se ao nosso lado, nesta mesma bancada”.

 

Isto despertou em mim a vontade de rabiscar, hoje e neste final de ano, sobre… política? Imagine-se! Vamos ver se sai alguma coisa que justifique o vosso minuto de leitura. Numa altura em que se ouve falar tanto da existência de uma crise de liderança será que os exemplos políticos (não me reporto a opções partidárias) de antigos líderes poderão ter alguma serventia para ajudar a formar novos líderes? Quais as características que um líder deve ter? Ser visionário, ser culto, ser corajoso, ser generoso, ser escrupuloso, ser instigador de confiança, tem importância?

 

Deparei-me com um trabalho inspirador do historiador Ribeiro Meneses sobre Churchill. Optei mesmo por transcrever partes do mesmo. Segundo este estudioso, Winston Churchill, para além de ter sido “um lobo solitário, um espírito livre e indomável que resistiu à tentação da popularidade ou do que é, em cada época, politicamente correto”, foi bafejado pela sorte, também na sua vida política. “Não sorte às cartas (...), mas uma sorte constante, (…), que nos proteja das balas em inúmeros campos de batalha, que nos acuda quando o avião em que viajamos se despenha, que nos torne invulneráveis a cancros e cirroses apesar de fumar e beber constantemente”.

 

Para além disso, soube optar por manter a sua independência: financeira, não dependendo da política para ganhar a vida; partidária, mudou de partido quando assim o entendeu, permitindo-lhe manter-se no Parlamento e defender as causas que lhe eram próximas; intelectual, de natureza inquieta, gostava de perceber tudo o que estava à sua volta. Mas, Churchill foi mais longe, tipificando atributos determinantes ao exercício da liderança e da liderança política: “um político precisa [também] de um credo próprio, que se sobrepõe (…) a qualquer disciplina partidária. Tem de estar disposto a sacrificar o acessório para preservar o essencial. Como tal, deverá saber muito bem o que, para ele, é essencial, e o que é acessório. Deve igualmente “saber incutir lealdade aos seus subordinados: através do seu génio, da sua produtividade, da firmeza das suas convicções e, claro, do seu charme. Por fim, um político precisa de combatividade e sangue-frio”.

 

Hoje, não me parece que o problema se circunscreva ao número de cães a ladrar nem ao nível de decibéis do ruído que produzem. O que me preocupa é a escassez de líderes com “a sabedoria, a visão e a tenacidade de Churchill”. Votos de um feliz ano de 2020!

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