Diário do Alentejo

Todas as localidades têm o seu Templo de Diana
Opinião

Todas as localidades têm o seu Templo de Diana

Manuel Nobre, sindicalista e autarca

27 de agosto 2019 - 11:00

O património cultural é, talvez, a maior riqueza que o nosso Alentejo tem, onde o turismo pode ocupar um lugar privilegiado na promoção e valorização desse mesmo património. Ao mesmo tempo, o turismo representa também um importante papel para a economia local, com reflexos diretos nos rendimentos do trabalho e na criação de emprego. Nem todos os lugares ou povoados têm castelos, palácios reais ou templos romanos, logo, há que valorizar e divulgar as particularidades e as singularidades das nossas terras e das suas gentes, o seu passado histórico e o seu potencial cultural, étnico e ambiental.Nesta matéria os municípios têm assumido um papel preponderante na salvaguarda e na promoção do seu património cultural, elevando a identidade e a riqueza de toda a nossa região. Lamentavelmente nem todos têm esta visão. Por vezes, há infraestruturas, equipamentos ou tradições que se perdem no tempo por falta de preservação ou sensibilidade por parte das instituições.

Refere a Comissão Nacional da Unesco que: “O património cultural e natural faz parte dos bens inestimáveis e insubstituíveis de toda a humanidade. A perda, por degradação ou desaparecimento, desses bens preciosos constitui um empobrecimento do património de todos os povos do mundo”. Em Aljustrel a realidade é bem particular. Os museus municipais encontram-se há quase uma década sem investimentos, sem renovação de peças ou de coleções, com falta de pessoal, com horários irregulares que afastam os visitantes, com edifícios a necessitar de obras e a ameaçar ruir, enfim, um verdadeiro exemplo da falta de visão já referenciada, que, no limite, poderá ser considerada de desmazelo. A juntar a tudo isto, e quando nada o fazia prever, eis que o inimaginável aconteceu. Recentemente uma importante estação arqueológica foi completamente arrasada.

Um dos sítios destruídos, local onde se fazia a queima e tratamento do minério e o armazenamento do cobre, conhecido por Oficina Metalúrgica Romana de Feitais, tinha já sido parcialmente escavada por um arqueólogo francês em 1989, e foi reescavada nas campanhas mais recentes, entre os anos de 2006 e 2009, no âmbito de um protocolo entre a Câmara de Aljustrel e a Universidade de Huelva. O outro sítio destruído, identificado como Escorial do Azinhal e local de interesse arqueológico, ainda não tinha sido alvo de escavações, e, por isso, é uma perda considerável por se desconhecer o que se poderia encontrar. O atual executivo da câmara municipal não deu continuidade a este projeto, tendo interrompido os trabalhos de investigação arqueológica que incluíam escavações em diversos sítios arqueológicos, em finais de 2009. Para além de não dar seguimento a esses projetos de investigação, também não tem assegurado a manutenção destas zonas de interesse científico e patrimonial, as quais estão completamente ao abandono e cobertas de vegetação.

 

Ora, como todos sabemos, o abandono do património potencia a sua destruição. Um sítio ou monumento que não é cuidado e valorizado cai no esquecimento e desprezo, sendo facilmente afetado ou destruído pelo descuido ou pela ignorância. A Câmara Municipal de Aljustrel não pode simplesmente chutar a responsabilidade para a Direção Regional de Cultura do Alentejo, entidade do Estado que tutela esta área. Também a autarquia tem, neste processo, a sua quota parte de responsabilidade por abandono das zonas referidas e por conivência com quem destruiu tão importante e único património para Aljustrel, para a região e para o País.  É obrigação da autarquia fiscalizar, no âmbito do plano diretor municipal, todas as áreas classificadas e, simultaneamente, denunciar essas violações. A câmara municipal não pode limitar-se a esperar por uma intervenção da Direção Regional de Cultura. A Câmara Municipal de Aljustrel não pode limitar-se a ficar à espera que outros defendam o património e a identidade de Aljustrel.

 

Situações como estas em nada contribuem para a afirmação e valorização da nossa região. Tendo como princípio que o Alentejo tem uma enorme riqueza cultural, a qual vai muito para além da promoção de espetáculos e realização de eventos festivos, cada vez mais é crucial a promoção da nossa cultura nas suas várias vertentes, onde a mesma deverá assumidamente representar um investimento e não um custo.

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