Diário do Alentejo

O “tio” Xaxinha
Opinião

O “tio” Xaxinha

José Saúde

06 de outubro 2025 - 09:30

Diz o povo que “as conversas são como as cerejas”, sendo que este provérbio popular cai que nem uma luva no texto a que me propus elaborar, dedicando-o a um homem que foi um dos expoentes máximos de outrora no futebol bejense. Vamos procurar desbravar a longevidade dos tempos e trazer à ribalta uma personagem cuja durabilidade dos anos jamais esquecerão. Timoneiro de um mítico balneário, Firmino Lopes, vulgo “tio” Xaxinha, foi um jogador de eleição ao serviço do Luso Sporting Clube, todavia, o seu nome ficará também lembrado como o dedicado roupeiro do Clube Desportivo de Beja.

 

Existem histórias que nos remetem para a sensibilidade desportiva do antigamente, em que pequeníssimas descrições traduzem o que foram os meandros do futebol regional. A época de 1932/1933 estava prestes a iniciar-se e a 12 de dezembro a Associação de Futebol de Beja, segundo Melo Garrido, organizou um torneio de preparação no qual participaram o Luso, o Sport Lisboa e Beja, o Despertar e o Esperança.

 

O primeiro desafio opôs o Luso ao SL Beja, sendo que o jogo foi interrompido aos 28 minutos da segunda parte e quando o resultado registava um empate (1-1). Amândio Pacheco, árbitro da partida, decidiu expulsar o jogador do Luso Firmino Lopes, resultando da sua sentença um enorme conflito. O fim antecipado do prélio não foi pacífico e o público ter-se-á sentido defraudado por um espetáculo que não chegou ao fim. Conheci o “tio” Xaxinha em finais da década de 1950 e princípios da de 1960 como roupeiro no Desportivo. A forma sábia em lidar com os atletas que chegavam a Beja era divinal.

 

Constava-se que o popular “tio” Xaxinha, com a idade avançada e com as pernas já arcadas, era um mestre em mimosear os jogadores que chegavam ao balneário do clube entregando-lhes meias rotas, botas de travessas com pregos, calções e camisolas já com buracos e no fim do treino ditava a sua sentença: “Este não presta”. Revejo-o a estender equipamentos em arames, defronte aos balneários, segurados com espias ao longo das manhãs soalheiras que eram propícias para melhor secar a indumentária que seria, nos treinos, crucial para os jogadores envergarem.

 

O “tio” Xaxinha não se ficava pelas folias do balneário, ou de um outro trabalho no qual se sentia útil, desenhando, particularmente, a sua ação na formação de equipas de apanha bolas, cujas táticas eram dadas ao pormenor a uma miudagem que em nada falhava com as recomendações do mestre ou no alugar de bolas remendadas em catechu à rapaziada.

 

Dez tostões por uma hora de jogatana era a tabela e se os moços se descuidassem lá estava o “tio” Xaxinha a lançar o estridente grito indicando que o tempo se havia esgotado. Estas memórias que, de quando em vez, ouso trazer a público, são verídicas histórias de pessoas e de clubes do outrora, sendo a sua dimensão no tempo um facto irreversível. Bem-haja, pois, a liberdade social que proporcionou outros encantos, outros direitos para a evolução do universo desportivo, assim como o progredir de modalidades, as quais estão agora abertas a todos aqueles que nelas queiram participar. O “tio” Xaxinha deixou-nos saudades! 

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