Chegar antes de todos os outros é a única maneira de ter uma praia só para mim.
Talvez durante dez ou quinze minutos eu consiga ser dono do areal ainda frio, ainda nu. Apresso a logística, espeto o chapéu, a sombra é longa porque o Sol ainda é rasteiro, estendo a toalha, armo a cadeira, defino as fronteiras da minha casa de luz, defendo um território que dali a nada será disputado palmo a palmo.
Não me irei demorar, quando o Sol fizer sombras verticais, quando for invadido por exércitos de famílias, vou-me embora, vou à procura das sombras das árvores.
Mas por enquanto fico porque não há mais nada à minha volta a não ser um barco amarelo dentro dos olhos. Deito-me na toalha e a minha pele branca de inverno começa a respirar o Sol, mas ao fim de um bocadinho a minha epiderme engasga-se de calor e eu fujo para a sombra. Sento-me na cadeira, abro um livro e bebo água. Um pardal poisa ao pé de mim, depois vem outro e mais outro.
São já sete ou oito que volteiam no ar e na areia, chilreiam, dizem-me trinados que eu não percebo. Talvez por não terem asas é que as pessoas não percebem os pássaros. Abri as asas do saco e tirei uma bolacha do pacote, os trinados exultaram, aproximaram-se mais de mim, quase que os ouvia dentro dos dedos das mãos.
Parti a bolacha e partilhei-a com os pardais. E de cada vez que apanhavam um bocadinho de bolacha voavam, iam ao céu e voltavam. Não sei voar, mas se soubesse punha uma bolacha na boca e ia com eles e quando me cansasse de azul poisava nas sombras verdes das árvores. O pacote tinha doze bolachas, eu não comi nenhuma. Quando as famílias chegaram, uma criança olhou-me demoradamente. Nunca tinha visto um encantador de pardais.