Refinei a palavra, assumo que a transformei ao longo dos anos, reconheço que a fui aprimorando, redefinindo, tornei-a menos abrangente, reduzi o seu âmbito, as ocasiões, o número, não me custa dizer que abandonei a ideia ligeira ligada a uma obrigação social, é preciso afirmar que deixei de sentir falta de estar bem com muita gente ao mesmo tempo.
A palavra tornou-se uma palavra diferente e soa diferente porque a sua forma e o seu conteúdo mudaram, há coisas que existiam dentro dessa palavra e morreram e há outras coisas que sobreviveram.
E apenas o que sobreviveu me interessa, apenas o que passou pelos filtros da prova dada, do respeito e da profundidade emocional, é que vale a pena. Hoje já não tenho a necessidade de me relacionar com muita gente, de dar e de receber de muita gente.
A minha amizade tornou-se mais privada, mais restrita, mais pausada, mais paciente, mais silenciosa, mais espaçada. A palavra já não suscita dúvidas, a palavra apenas é usada em circunstâncias muito especiais.
Só já a uso com algumas pessoas, não são muitas, não podem ser muitas.
A amizade festiva é fútil, a amizade ocasional é oca, a amizade oportunista é perigosa.
Apenas a amizade visceral tem significado, tem essência, mas este tipo de amizade demora muito tempo a amadurecer, requer trilhar em conjunto um longo e sinuoso caminho, exige que os olhos nunca fujam dos olhos, pede que os corações nunca se esqueçam dos corações. Alterei a palavra, quando a digo já não é uma abstração, nomes em cima uns dos outros, agora, quando digo a palavra, penso e sinto nomes concretos, penso e sinto pessoas reais e absolutamente bonitas a viverem dentro do meu conforto de as ter.