O silêncio poisa nas sepulturas como não poisa em mais lado nenhum. Entremeado de pássaros, o silêncio desce dos ciprestes e deita-se com os mortos, dorme com eles, penetra o granito, o mármore, a terra. Por estarem forrados de ossos, os mortos são o silêncio absoluto, quem quiser medir a medula do silêncio tem de se deitar com os mortos. Os ciprestes são árvores sinistras mas indicam o caminho do céu, são pontes verticais para as almas atravessarem um rio de nuvens, são escadas enterradas na tristeza para chegar às alturas, para que o que já não tem vida viva para sempre. Os ciprestes são árvores tristes porque não há mais nenhuma árvore que seja regada com lágrimas. Para além do silêncio que lá vive, os cemitérios também são campos de dor, de lágrimas, de gritos e de saudade, os coveiros abrem covas fundas e tentam que caiba tudo lá dentro: a dor, as lágrimas, os gritos, a saudade, o nome, a carne. Os coveiros tapam tudo com terra, mas a terra só mata a carne, é o tempo que passa que mata a dor, as lágrimas, os gritos, a saudade, até o nome. O que foi grito é agora silêncio, o que foi dor é agora esquecimento. Há sepulturas que são casas abandonadas pela família, nunca mais trouxeram uma flor, nunca mais lavaram as paredes de mármore da eternidade, as lágrimas que ali deixaram um dia arderam no inferno. Só as mães e os pais voltam sempre, as suas lágrimas nunca acabam. O que vale é que os mortos se têm uns aos outros, vão ao céu e voltam, é para isso que servem os ciprestes, para levar os mortos ao céu, não há árvore que chegue tão depressa a esse lugar empíreo.