Há uma hora que nenhum relógio consegue medir e que confunde as ampulhetas. Há um tempo, ao fim da tarde, naquele bocadinho de luz onde começa o sol-posto, que se mede em serenidade. Há uma altura, no declínio da claridade, na sonoite, que se mede em andorinhas. Há dias em que vêm tantas que as ruas, as casas e as pessoas ficam cobertas de quietude e o tempo deixa de voar, o tempo poisa e descansa. As asas das andorinhas são ponteiros alados fazendo rodar o mecanismo da felicidade. As andorinhas são pássaros felizes, que apareça o primeiro homem ou a primeira mulher que o negue. Eu nunca vi uma andorinha triste porque a única coisa que as prende é o infinito. A essa hora há uma mulher que sai de casa e vai ter com as andorinhas. Conhecem-se há muitos anos, a mulher senta-se num banco de jardim e as andorinhas poisam-lhe nos olhos, na boca, no pensamento, dentro do peito, e uma, que a mulher conhece há muito tempo, vem e poisa-lhe no coração quando chega a primavera. É no coração da mulher que ela faz o ninho todos os anos. E as andorinhas que vivem no coração das pessoas são ainda mais felizes. E as pessoas com andorinhas a viverem no seu coração nunca estão tristes porque a única coisa que as prende é a eternidade. A mulher fecha os olhos e as andorinhas pegam nela e levam-na ao céu, sobrevoam telhados, quintais, emoções e memórias. A mulher tem umas asas que não se cansam de ternura, a mulher é uma andorinha a viver no suave coração do crepúsculo. Depois de brincarem muito, as andorinhas vão deitar o Sol e ao fim de um bocadinho elas e a mulher deitam-se também.