Diário do Alentejo

Idealização
Opinião

Idealização

Vítor Encarnação

13 de julho 2024 - 08:00

A idealização é como o horizonte, não existe. Está lá ao fundo da ideia e dos olhos, mas qualquer tentativa de lá chegar é empurrar uma e outro para mais longe. Cada desejo que se tem e cada passo que se dá na sua busca são intentos frustrados. Quando queremos alguma coisa criamos em nós a antecipação da chegada. Já a imaginámos tantas vezes, já a sonhámos tantas vezes, temos tanta certeza do que vamos encontrar que nada pode falhar nesse nosso encontro com a coisa querida, mas diz a vida que à nossa espera estará apenas uma projeção dos nossos apressados anseios. Quando chegamos a esse lugar que afinal não é o lugar que queríamos, arrefece o ânimo, desmaia qualquer coisa dentro de nós, morre a idealização, fecha-se o horizonte. Quando chegamos ao lugar que não existe tal como o concebemos, quando abrimos a porta da casa da imaginação, concluímos que o que lá está é feito de uma espessa realidade, de um preceito. Nem sempre o sonho comanda a vida, a vida também nos ensina a disciplinar o devaneio. Domesticar a utopia não é necessariamente algo de conservador ou mesquinho, amansar o hedonismo é uma condição essencial para percebermos que o mundo é feito de projetos que implicam lucidez, empenho e sacrifício. Devemos aceitar que só a dificuldade do caminho nos torna dignos do destino. Sim, a idealização é boa, eleva-nos a uma dimensão mentalmente perfeita, dá-nos prestígio psicológico, mas a idealização não pode matar o que as coisas são. Há uma base social e mundana que nos retrata. A idealização não é tão perigosa quando é suportada por uma base sólida. 

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