Diário do Alentejo

Alves, um  guarda-redes que jamais será esquecido
Opinião

Alves, um guarda-redes que jamais será esquecido

José Saúde

16 de junho 2024 - 08:00

Foi um dos grandes exemplos do futebol de outrora que marcou gerações de extraordinários guarda-redes que proliferaram num trono em que só os temerários assumiam a tão difícil posição.

A simplicidade, aliada a uma humildade que na sua essência lhe fora peculiar, conduziu o saudoso “Nói” Alves aos píncaros de uma irrefutável fama que se expandiu na infinidade do tempo. José Honório Rodrigues Alves nasceu em Beja a 2 de março de 1940 e terá sido um dos melhores guardiões bejenses. Não obstante os cuidados de dona Custódia, sua mãe, “Nói” Alves cedo fez do futebol de rua a sua ardente paixão.

Porém, uma particularidade o distinguia dos outros companheiros: jogava à baliza, um espaço que, à época, era definida por duas pedras. Iniciou-se com os moços do seu tempo num espaço pertencente ao João Barbeiro, lá para as bandas da praça de touros na velha Pax Julia.

Ali disputavam-se dérbis que, por vezes, resvalavam para enérgicas brigas. Aliás, nesses tempos existiam à volta de Beja, tal como a nível regional, as eiras, locais apropriados onde a rapaziada competia com companheiros do quotidiano. Aconteceu que um dia uma dessas equipas precisou de um guarda-redes para um jogo que teve lugar em Aldeia Nova de São Bento e o grupo lembrou-se dele. Houve o convite, o “Nói” Alves aceitou, fez uma exibição de se lhe tirar o chapéu, o Despertar teve conhecimento do feito alcançado e de imediato o convidou para representar o emblema despertariano no escalão júnior.

Convite aceite, mas, na época seguinte, Elói, treinador do Desportivo, levou-o para o grémio da rua de Sembrano, onde permaneceu 18 temporadas. A maneira como defendia a sua baliza foi de tal ordem que na época de 1960/1961 o extinto jornal “Mundo Desportivo” considerou-o como o melhor guarda-redes do Campeonato Nacional da II Divisão, Zona Sul.

Tive o prazer de ser seu companheiro num grupo de trabalho quando cheguei ao Desportivo, com 18 anos. A empatia entre ambos foi de tal forma evidente que nos equipávamos lado a lado, quer nos treinos, quer quando o jogo tivesse lugar em Beja.

Aliás, os nossos lugares cativos eram ao fundo do balneário onde o meu “compadre” me dava dicas proveitosas.

Recordo um jogo em Alhandra (vencemos por 1-0), Taça de Portugal, em que o Rodrigues Pereira ao defender uma bola bateu com a cabeça na quina do poste à sua direita, que era quadrado, sendo transportado para o hospital de Vila Franca de Xira, entrando o “Nói” Alves para a baliza, posição onde se manteve nas jornadas seguintes.

Com a lesão do Rodrigues Pereira debelada, o treinador Suarez, ao enunciar a equipa para o duelo seguinte, colocou o “Nói” Alves como titular, mas ele de pronto se levantou do banco, então corrido, e respondeu: “Não ‘mister’, o lugar é do Rodrigues Pereira e não meu, portanto, esta camisola número 1 é dele”. Este pormenor de elegância e a sua sublime honestidade simbolizam a enorme nobreza de “Nói” Alves, um guarda-redes que jamais será esquecido.

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