A minha mãe é que comprava a roupa para o meu pai, era ela que decidia as cores, o que estava na moda, o tamanho das bainhas, a camisa e a respetiva camisola de malha, os sapatos e as peúgas a condizer.
Era também ela que de manhã dispunha a indumentária para o meu pai vestir.
A minha mãe fazia um boneco de roupa em cima da cama. Trusses, camisola interior, camisa, camisola, calças, peúgas e no chão, na direção das peúgas, os sapatos.
Ao lado, pendurado numa cadeira, o casaco. O meu pai levantava-se e vestia aquela combinação de cremes, castanhos e verdes. O meu pai gostava de vermelho, a minha mãe não.
Uma vez, no Natal, oferecemos-lhe uma blusa vermelha, mas a blusa nunca surgia no traje do boneco de roupa. A minha mãe é que fazia as compras.
Era ela que decidia cada almoço e cada jantar, o meu pai, se fosse, ia só para carregar os sacos mais pesados, de resto só atrapalhava. A minha mão adorava sopa de feijão verde, o meu pai não, mas comia-a porque a médica tinha dito que era a melhor sopa para pessoas reformadas. Nunca houve provas disso.
A minha mãe é que punha a mesa, a minha mãe é que fazia a cama, lavava a loiça e lavava a roupa e estendia a roupa e passava a roupa.
Era ela que varria a casa e limpava o pó e sacudia os tapetes e dava comida ao cão e era a última a deitar-se. A minha mãe é que fazia os bolos que o meu pai gostava, os bolos compensavam o feijão verde.
O meu pai é que conduzia, a minha mãe nunca tirou a carta. A minha mãe não era uma mulher moderna. A minha mãe foi uma mulher do seu tempo.