Conheço uma mulher que só gosta de lavar a roupa à mão porque traz a laje dos pegos na memória das mãos.
Como já não tem ribeiras perto de si, apenas lembranças de água e sabão azul e branco, espera que todos saiam de casa, ninguém percebe esta mania, uma máquina tão boa sem ela lhe dar uso nenhum, põe uma rodilha e vai para o quintal com um alguidar à cabeça. Vinte passos, dantes eram mais, da aldeia à ribeira era uma meia-légua, faz de conta que ainda cheira a rosmaninho no caminho, faz de conta que ainda é verdade.
Não gosta de ver a roupa maltratada, se calhar foi por ter tido pouca, a roupa merece mãos ternas, mãos que já lavaram as vestimentas dos avós, dos pais, do marido, dos filhos e agora dos netos. Umas mãos assim merecem que as deixem ter este gosto.
Pousa o alguidar, tira as camisas, as calças, as toalhas, lava as peças uma a uma e enquanto as lava ouve as moças a cantar, manhã cedinho, junto à ribeira que corre limpinha dentro do seu quintal.
Às vezes, os carros apitam e as moças calam-se, às vezes a vida apressa-se e as moças calam-se.
Os lençóis ficam para o fim, o melhor da saudade fica para o fim, os panos brancos, alvos, são a sua adoração. O cheiro a lavado, o cheiro a uma forma de existir que a mulher não quer perder. E depois há uma corda esticada entre aquele quintal e a ribeira, tanta légua de tempo, e nessa corda há molas de madeira que seguram roupa e seguram as recordações. Os lençóis são paredes caiadas. Com um bocadinho de vento fica tudo ainda mais bonito.