Diário do Alentejo

O que nos dizem as eleições na Tailândia?
Opinião

O que nos dizem as eleições na Tailândia?

Tiago André Lopes, professor de Relações Internacionais e Diplomacia na Universidade Portucalense

27 de maio 2023 - 10:00

A Tailândia foi a votos no passado dia 14 de maio e das eleições saiu uma nova composição parlamentar que poderá levar a um processo de reformas profundas quer no exército, quer no papel e funcionamento da monarquia tailandesa, assuntos estes que eram, até muito recentemente, matéria de discussão quase proibida.

Primeiro vamos a resultados: o grande vencedor da noite foi o “Partido Avançar” (centro-esquerda) que elegeu 152 deputados, o que significa um acréscimo de 71 mandatos com relação à eleição anterior de março de 2019. O partido apoiou-se em duas ideias centrais: reformar as instituições responsáveis pela instabilidade política permanente da Tailândia e democratizar mais a Tailândia. O Partido Pheu (centro-direita) também se reforçou, mas de modo mais modesto, passando de 136 para 141 deputados.

No sentido contrário, o Partido Palang Pracharath (direita) que lidera a coligação governamental perdeu 76 deputados, passando a ter apenas 40 mandatos. O Partido Democrático (centro-direita) também foi penalizado, elegendo somente 25 deputados, menos 28 do que em 2019. Mas, curiosamente, o Partido Bhumjaithai (direita), que é também parte da coligação governamental, teve um resultado em contraciclo e somou mais 19 deputados, passando a ter um grupo parlamentar com 70 vozes.

Pausa no dilúvio de dados. Os partidos da coligação governamental tailandesa têm uma característica muito singular que os distingue: são partidos civico-militares. Isto, porque, na Tailândia, o exército desempenha uma função política ativa, ao passo que a monarquia, particularmente, o rei, desempenha um papel de “influência e persuasão” de cariz marcadamente informal.

A Tailândia nas últimas nove décadas conheceu 21 constituições, às quais se somam ainda oito constituições interinas. Ou seja, as constituições na Tailândia têm, em média, uma vigência mais curta (três anos e um mês) do que um governo no Ocidente (quatro a cinco anos). Toda essa trepidação política constante, à qual se juntam incontáveis golpes de estado, quer por forças civis, quer por forças militares, quer por aliados do palácio, aumentaram a atratividade dos partidos da oposição que defendem a necessidade de reformas.

É cedo ainda para projetarmos cenários para a Tailândia, mas o facto de os eleitores tailandeses ainda confiarem nos mecanismos de escolha política “oferecidos” pela democracia é um sinal positivo, num país que poderia ter optado pela postura desinteressada a que assistimos nas últimas eleições na Tunísia ou no Egipto. Ao invés disso, a Tailândia prepara-se agora para um embate entre o otimismo idealista e reformista dos partidos da oposição e o conservadorismo e monolitismo dos partidos civico-militares, que já blindaram a atual constituição, para garantir que o parlamento tailandês tem sempre uma fatia de mandatos alocados às forças armadas.

As eleições na Tailândia são a melhor prova de que as eleições são vitais para os sistemas democráticos, mas não são, em si, uma prova cabal de democracia instaurada. As eleições são um mecanismo, um processo, uma via, e não a consequência ou o produto acabado. As eleições na Tailândia obrigam-nos a repensar o modo como olhamos para as eleições e a perceber que as eleições, por si só, são capazes até de galvanizar, mas não são suficientes para reformar países. Isso competirá sempre aos eleitos... que, por isso mesmo, foram escolhidos pelos eleitores.

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