Diário do Alentejo

Mulheres invisíveis
Opinião

Mulheres invisíveis

Vítor Encarnação, professor

26 de maio 2023 - 13:00

Há mulheres que se distinguiam perfeitamente. Assumiram o corpo, a alma, a sensualidade, a vontade, a independência. Fugiram às gerações das avós e das mães, trilharam outros caminhos, tomaram outras decisões, renegaram tradições e costumes que perpetuavam uma circunstância. A mulher subalterna, diminuída, encurtada, ergueu-se. Há mulheres que se viam claramente. Deixaram de limpar casas e limparam a opacidade do seu tempo, vieram para as ruas, para os cafés, para a igualdade, para a emancipação, para a vida plena.

Há mulheres que durante anos foram visíveis, faróis de brilho e sedução e depois esmoreceram, foram lentamente sucumbido ao peso dos maridos, dos filhos, das pessoas, dos hábitos, da sua rua, dos costumes, da comunidade. Sem se aperceberem que retrocediam, recolheram às casas, às boas maneiras, deixaram de se achar bonitas, já não precisavam de achar bonitas, deixaram de cuidar de si, despentearam-se, voltaram a vestir roupas largas de algodão, confortáveis, mas frias aos olhos do desejo, voltaram atrás no tempo, devolveram tudo de mão beijada. E de vez em quando, apenas em ocasiões especiais, formais, socialmente aceites, um casamento, um batizado, voltam a brilhar.

E sentem-se tão bem, outra vez tão belas, outra vez tão inteiras.  Quando a festa acaba, às vezes ainda nem é meia-noite, regressam à sua condição feminina. Há mulheres que se foram tornando invisíveis. Por entre tanta coisa que têm para fazer, nem elas deram por isso. 

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