Diário do Alentejo

Às portas da NATO Helsínquia avança, Estocolmo aguarda…
Opinião

Às portas da NATO Helsínquia avança, Estocolmo aguarda…

Tiago André Lopes, professor de Relações Internacionais e Diplomacia na Universidade Portucalense

08 de abril 2023 - 13:00

No dia em que a Organização do Tratado do Atlântico Norte celebrou o seu 74.º aniversário de existência, a organização acolheu o 31.º estado-membro. Uma vitória da diplomacia de segurança euro-americana, mas também uma derrota por espelhar a falta de consenso e unidade no espaço ocidental, com a Suécia a continuar numa sala de espera permanente.

A entrada da Finlândia na NATO (curiosamente, é mais popular a versão anglófona do acrónimo do que a portuguesa OTAN) significa um aumento de 1300 quilómetros de fronteira direta entre a NATO e a Rússia. E, mais importante, significa o fim do neutralismo finlandês. Porque falar em “neutralidade”, curiosamente, é um erro. É verdade que é um erro muito mediatizado, mas não deixa de ser um erro só por ser repetido até à exaustão.

A neutralidade, condição política e jurídica da Áustria e da Suíça, implica uma abdicação permanente, quase sempre traduzida em preceitos constitucionais, do jus bellum (Direito a Fazer Guerra). Isto, entenda-se, não implica que um estado não possa ter exército, mas implica que esse exército se torna apenas num instrumento reativo-defensivo. O neutralismo, condição autoimposta da Suécia e da Finlândia, resulta das escolhas políticas dos estados que se escusam a usar o seu jus bellum, sem, contudo, abdicarem do mesmo.

A Finlândia, a Suécia e a Noruega, diga-se, pertencem a esta categoria de estados neutralizados, mas não neutrais… ou melhor, pertenciam. Ao entrar para a NATO, a Finlândia e a Suécia abdicam da sua opção histórica; resta saber se o devir histórico será generoso para com os promotores desta opção política. Mas o processo de adesão ficou marcado, e é bom que tenhamos memória disso mesmo, por um emaranhado de promessas políticas e derrotas diplomáticas que mancham a ideia da “grande unidade ocidental”.

Após a Cimeira de Madrid, em julho de 2022, Stoltenberg, secretário-geral da NATO (que terminará o seu mandato neste ano), dizia que o processo de adesão será rápido e sem problemas de maior. Para, no mesmo dia, ser corrigido pelo presidente Erdoğan, porque a Turquia tem vários desentendimentos jurídico diplomáticos com a Suécia, que levaram a um bloqueio de Ankara às aspirações de Estocolmo.

O processo negocial entre Turquia, Finlândia, Suécia, EUA e NATO fez-se e foi anunciado, com gala e pompa, que outubro seria o mês em que tudo se resolveria. Mas em novembro, com 28 retificações do processo de adesão conseguidas, a Suécia e a Finlândia continuavam no limbo. Enquanto discutíamos as razões, mais ou menos justas, mais ou menos sensatas, da Turquia bloquear o processo de adesão, fomos fingindo não ver o bloqueio da Hungria. Porque a Turquia é NATO, mas não é UE, e é NATO mas compra mísseis a Moscovo… a Hungria não. É NATO e é UE… e bloqueou tudo.

Foi preciso esperar pelo final de março para a Finlândia ter luz verde. Pelo caminho ficaram quatro promessas políticas: a de uma adesão rápida (a primeira), sem problemas (a segunda), sem oposição ou forças de bloqueio (a terceira) e com ambos os estados a entrar ao mesmo tempo (a quarta). A Finlândia lá conseguiu o aval turco e húngaro, mas a Suécia continua em espera e a espera pode ser mais longa do que a narrativa da grande unidade ocidental precisaria.

Se à mulher de César não bastava ser honesta, pois tinha também que parecer honesta, à NATO também não bastará querer ser unida, terá que parecer unida... Esse é o desafio: parecer ser!

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