Diário do Alentejo

Azinho
Opinião

Azinho

Vítor Encarnação, professor

10 de março 2023 - 14:00

O fogo adora o azinho. Para o fogo, o sobro e o pinho são fracos amantes. Se fosse o fogo a decidir, nas lareiras, no chão das casas, nas camas de cinza, apenas se deitariam troncos e pernadas e rachas de azinheira madura. Tudo o resto arde demasiado depressa, toda a outra lenha extingue-se num instante, o fogo apaga-se ainda a noite vai a meio, esmorece, desvanece, ainda com tanta noite para aquecer e tanto frio para matar. O lume dá-se melhor com corpos de azinho, o amor entre o lume e o azinho não se explica, sente-se, esse amor é um fogo que arde e nós conseguimos ver.

O fogo detesta combustões rápidas, labaredas precipitadas, chamas ansiosas, calores precoces, fumo fugidio, o fogo gosta de ter tempo para começar de mansinho, gosta de incendiar a rama, gosta de beijar a casca, de dançar sobre a pele do azinho, de ignificar a carne da madeira, de ir ardendo suave e lentamente até já não haver frio.

O azinho adora o fogo, depois das bolotas e dos pássaros e do vento, o que o azinho mais gosta é do fogo. Depois de morrer, o azinho não quer outro destino que não seja ser amado pelo fogo. Entrega-se-lhe aos bocados, deita-se para que ele o incandesça, suave e lentamente, a rama incendiada, a casca beijada, a carne em combustão, até o pôr em brasa. Entre o fogo e o azinho há um amor verdadeiro, de corpo com corpo, amam-se perdidamente e só quando um morrer é que morre o outro. Devia haver mais poesia sobre esta paixão ardente.

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