Diário do Alentejo

Manas
Opinião

Manas

Vítor Encarnação, professor

10 de dezembro 2022 - 15:00

A minha avó e a minha tia não estão sepultadas no cemitério. Elas moram lá. Mudaram-se para lá há alguns anos, a minha avó há trinta e a minha tia há quinze. A minha avó morreu a dormir e enquanto estava a ser velada disse à minha tia para onde ia, mana vou para tal sítio, vou para outra morada, desconfio que é a última, quando chegar a tua hora, não te apresses, vais ter comigo, vais morar para a minha rua. E assim foi, a mana morreu e agora vivem na mesma rua. A minha avó vive numa campa à esquerda, logo ali à entrada do cemitério, a minha tia vive três casas rasas depois, à direita. Era assim na aldeia, a avó morava à esquerda, na rua que abria a aldeia de par em par, e a tia morava à direita, entre elas havia três casas brancas e agora as casas são negras.

O sol entra ao mesmo tempo na rua da aldeia e na rua do cemitério, primeiro bate na janela do quarto da minha avó, dantes o quarto da minha avó era maior, depois o sol bate nas paredes do quarto da minha tia, dantes o quarto da minha tia era grande e tinha uma mesa onde ela fazia naperões de renda. As manas visitam-se muitas vezes, ora passam o serão na casa de uma, ora na casa da outra, venha provar este bolinho, venha que fiz uma açorda, no inverno fazem fogo, só é pena a lareira ser de um mármore tão frio, ai mana que não consigo aquecer os pés. Às vezes vou vê-las, passo pela minha avó, passo pela minha tia e vamos ver o meu pai e a minha mãe que vivem um pouco mais abaixo.

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